Folha de S.Paulo

Deltan é advertido após ataques a ministros do STF

Conselho do Ministério Público condena menção a ‘panelinha’ de juízes

- Felipe Amorim

Conselho Nacional do Ministério Público decidiu advertir o procurador após críticas a juízes do Supremo durante entrevista.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região julga hoje recurso de Lula contra condenação pelo sítio em Atibaia.

brasília | uol O CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), órgão responsáve­l por fiscalizar a atuação de promotores e procurador­es, decidiu nesta terça-feira (26) aplicar pena de advertênci­a ao procurador Deltan Dallagnol, coordenado­r da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.

Na prática, a pena de advertênci­a equivale a uma crítica pública à conduta do procurador. A advertênci­a é a mais branda entre as punições previstas na lei. Ele continua à frente da Lava Jato paranaense.

A decisão foi tomada em julgamento definido por 8 votos a 3 a favor da punição. O conselho julgou um PAD (Processo Administra­tivo Disciplina­r) contra o procurador por críticas a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) durante entrevista à rádio CBN, em agosto do ano passado.

Nela, ao comentar decisão que retirou do então juiz Sergio Moro —que cuidava da operação Lava Jato em Curitiba— trechos de delações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o exministro Guido Mantega, Deltan afirmou que ministros do STF estavam mandando uma “mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção”.

O procurador se referia, sem nomear, aos ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowsk­i, que votaram a favor da decisão na Segunda Turma do STF.

Na entrevista à CBN, Deltan afirmou: “Os três mesmos de sempre do Supremo Tribunal Federal que tiram tudo de Curitiba e que mandam tudo para a Justiça Eleitoral e que dão sempre os habeas corpus, que estão sempre formando uma panelinha assim que manda uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção”, disse o procurador.

“Objetivame­nte, Milton [Young, jornalista da CBN] , não estou dizendo que estão mal-intenciona­dos nem nada, estou dizendo que objetivame­nte a mensagem que as decisões mandam é de leniência. E esses três de novo olham e querem mandar para a Justiça Eleitoral como se não tivesse indicativo de crime? Isso para mim é descabido”, prosseguiu Deltan.

O processo foi aberto em abril, após pedido do presidente do STF, Dias Toffoli.

O CNMP entendeu que, com as declaraçõe­s sobre o tribunal, o procurador deixou de cumprir dois deveres do cargo: “tratar com urbanidade as pessoas com as quais se relacione em razão do serviço” e “guardar decoro pessoal”.

A defesa de Deltan afirmou ao CNMP que as críticas foram feitas dentro dos limites do direito à liberdade de expressão. “Não se vê aí mais que um excesso de zelo compatível com a juventude do procurador”, disse o advogado Francisco Rezek, que é ex-ministro do STF. “Vai se oferecer a cabeça do jovem procurador em holocausto, mas em holocausto a quem?”, perguntou Rezek.

Em seu voto, o relator do caso, conselheir­o Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho, elogiou a atuação de Deltan no MPF, mas disse que o procurador cometeu “excessos” em sua fala.

“Não quero deixar de registrar os méritos da atuação profission­al do doutor Dallagnol, e é verdade que o trabalho que ele fez revolucion­ou a sociedade, revolucion­ou o Judiciário”, disse Bandeira.

“No entanto, não podemos deixar que esse trabalho seja um salvo-conduto para pronunciar-se da forma que desejar, como vinha fazendo, e de certa forma continua fazendo, de forma excessiva”, afirmou o conselheir­o.

Em nota assinada pelos 14 demais integrante­s da força-tarefa em Curitiba, os procurador­es manifestar­am “solidaried­ade e amplo e irrestrito apoio” a Dallagnol.

O procurador também é alvo ,no CNMP, de diversas representa­ções com base nos diálogos publicados pelo site jornalísti­co The Intercept Brasil, que mostraram conversas entre procurador­es de Curitiba e também com o exjuiz Sergio Moro, levantando questionam­entos sobre a atuação da Lava Jato.

Nesses representa­ções contra Deltan ainda não houve a análise do conselho sobre a instauraçã­o de processos disciplina­res.

As representa­ções contra qualquer procurador que chegam ao CNMP primeiro são recebidas pela Corregedor­ia

e, se aceitas, passam a tramitar como uma reclamação disciplina­r.

Nessa fase do processo, cabe ao corregedor decidir se há fundamento­s na representa­ção. Se houver, ele pede que seja apresentad­a a defesa prévia do acusado e é feita uma apuração preliminar dos fatos para analisar se há elementos que justifique­m a abertura de um processo disciplina­r que pode resultar em punições.

Após essa etapa, o corregedor submete ao plenário do CNMP a decisão de instaurar ou não um PAD (Processo Administra­tivo Disciplina­r) para que eventuais responsabi­lidades e punições sejam determinad­as.

É na tramitação do PAD que o acusado vai apresentar formalment­e sua defesa e os conselheir­os vão analisar as provas. Eventuais punições são definidas por decisão do conselho.

O CNMP conta com 14 conselheir­os. Oito deles são membros dos diversos ramos do Ministério Público, dois são juízes indicados pelo STF e pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), dois são indicados pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e mais dois indicados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.

Apenas 11 conselheir­os participar­am do julgamento de hoje. Três indicados ao CNMP ainda aguardam a aprovação pelo Senado para poderem ser nomeados aos cargos.

“Os três mesmos de sempre do Supremo Tribunal Federal que tiram tudo de Curitiba e que mandam tudo para a Justiça Eleitoral e que dão sempre os habeas corpus, que estão sempre formando uma panelinha que manda uma mensagem muito forte de leniência a favor da corrupção Deltan Dallagnol procurador, em ago.2018, à rádio CBN, sobre Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowsk­i

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