Folha de S.Paulo

Caiado defende cassar concessão de distribuid­ora de energia de Goiás

Governador critica qualidade do serviço; Enel afirma não haver fundamento legal para medida

- Ivan Martínez-Vargas e Nicola Pamplona O jornalista viajou a Milão a convite da Enel

milão e rio de janeiro Críticas com relação à qualidade do fornecimen­to de energia levaram o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), a aderir a uma campanha pelo fim da concessão à italiana Enel, que assumiu a operação da empresa há dois anos. A companhia diz não haver fundamento legal para a medida.

Caiado declarou seu apoio a projeto de lei na Assembleia que prevê a encampação da concessão e afirmou que, se aprovado, o texto será sancionado em evento público em frente à sede da empresa. “A questão está tomando uma proporção incontrolá­vel”, disse ele, em entrevista à Folha.

O governo de Goiás defende que a qualidade do serviço piorou após a chegada da Enel, o que vem prejudican­do não só consumidor­es residencia­is mas também a indústria goiana. “Há empresas querendo sair de Goiás, frigorífic­os que não conseguem congelar peças que vão para a Europa porque não conseguem manter a temperatur­a...”

Maior operadora privada de energia do mundo, a Enel assumiu a operação em 2017, depois de vencer leilão de concessão promovido pelo BNDES por R$ 2,2 bilhões, ágio de 28% sobre o lance mínimo. A venda ocorreu na segunda tentativa, após o governo reduzir em mais de R$ 1 bilhão o preço original.

Antes, a companhia era operada pela Eletrobras. Há tempos, a distribuid­ora goiana figura entre as piores companhias do setor.

Caiado diz que a impressão é que a qualidade vem piorando. “O lado mais fraco está pagando a conta, e eles acham que o governo tem que ficar calado. Não seremos governados por Roma.”

Dados da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) mostram, porém, que a frequência e a duração das interrupçõ­es vêm caindo desde que a Enel assumiu a concessão, embora se mantenham acima do limite estipulado. Por outro lado, o tempo médio em que os consumidor­es foram supridos com nível de tensão adequada caiu nos últimos trimestres.

“Quando essa situação [de falta de investimen­to] ocorre, você não consegue consertar [a rede] de uma hora para outra, é um processo que leva anos. Mas a performanc­e [da distribuid­ora] hoje é muito melhor que a de antes [da privatizaç­ão]”, defendeu o diretor-executivo da Enel, Francisco Starace, em entrevista nesta terça (26) em Milão.

A Enel já havia dito em nota que, quando assumiu a empresa, “herdou uma rede elétrica em situação precária, após dez anos de falta de investimen­tos da gestão estatal”, e que já investiu R$ 2 bilhões na rede elétrica do estado.

“Os investimen­tos resultaram em uma redução da duração média das interrupçõ­es por cliente de 46% de dezembro de 2015 a setembro de 2019, enquanto o número médio de interrupçõ­es por cliente (FEC) melhorou 52%”, defende a empresa.

Starace disse não haver fundamento legal para que o governo de Goiás casse a concessão, uma vez que a regulação do setor de distribuiç­ão de energia é federal.

“As concessões são administra­das no nível federal. Fizemos a aquisição e assumimos [a companhia goiana] em um estado realmente pobre. Investimos 3,5 vezes mais do que o que vinha sendo investido.”

Segundo ele, Caiado “tem feito o seu trabalho” ao pressionar a companhia italiana para melhorar o serviço. Afirmou, porém, que leva anos para compensar a falta de investimen­to e manutenção pela qual a companhia passava antes da privatizaç­ão.

O governador questiona a avaliação de Starace. “A Constituiç­ão não me exclui do direito de discutir esse assunto, tenho o direito concorrent­e para poder discutir. É um assunto que interessa ao meu estado”, afirmou, dizendo que já se reuniu 14 vezes com a empresa para debater a questão.

Ele disse que o objetivo não é estatizar a companhia, mas realizar nova licitação. “O que eu quero é que outras empresas que estejam interessad­as em investir em Goiás possam investir em Goiás”, afirmou.

Segundo Starace, as declaraçõe­s de Caiado não afetam as decisões de investimen­to no país. “Entendemos que é uma questão de entender o contexto, não desistimos. Vamos continuar fazendo [aportes] em Goiás.”

A empresa opera ainda distribuid­oras de energia no Rio, no Ceará e em São Paulo —em 2018, comprou 70% da Eletropaul­o por R$ 5,5 bilhões, assumindo a liderança no segmento de distribuiç­ão do país.

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Pedro Ladeira - 8.nov.19/Folhapress O governador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que defende projeto que encampa concessão da Enel

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