Folha de S.Paulo

JUSTIÇA ORDENA QUE ARTISTA RETIRE GRAFITE FEITO SEM AVAL DE PRÉDIO NO CENTRO DE SÃO PAULO

Produtor foi detido por iniciar obra sem aval de proprietár­ia de imóvel tombado

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Com uma água-viva gigante pintada em sua empena, o edifício Renata Sampaio Ferreira (à esq.) seria um dos prédios a fazer parte do projeto Aquário Urbano, mas a administra­dora do imóvel, tombado, processou o produtor da iniciativa, Kléber Pagú, que chegou a ser detido por ter feito o grafite sem autorizaçã­o; agora, ele terá de restaurar a fachada original

são paulo A tentativa de pintar a empena cega de um dos 15 edifícios que fariam parte do projeto Aquário Urbano, no centro de São Paulo, após a recusadapr­oprietária­doimóvel, acabou na delegacia e com uma ordem da Justiça impedindo que a pintura continue.

Desde a idealizaçã­o do projeto, em 2017, o produtor cultural Kléber Pagú tentava obter a autorizaçã­o do edifício Renata Sampaio Ferreira, na rua Araújo, administra­do pela Dias Fernandes Administra­ção e Participaç­ões. Sem sucesso, na última semana ele resolveu fazer a preparação e o começo da pintura mesmo assim.

Uma empilhadei­ra foi colocada no estacionam­ento vizinho ao prédio e a parede foi, primeiro, preparada para receber a pintura e, no dia seguinte, o grafite começou a ganhar formas. A polícia foi chamada e Pagú levado à delegacia.

Na quinta-feira (21), por fim, a Justiça determinou que a pintura fosse suspensa e estipulou multa de R$ 50 mil por dia caso Pagú a retome.

A decisão também obriga o produtor, em um prazo de dez dias, a repintar a empena da forma como era antes sob pena de multa de R$ 5.000 diários em caso de atraso.

O edifício Renata Sampaio Ferreira foi tombado pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservaçã­o do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo) em 2012. Projetado pelo arquiteto Oswaldo Bratke, o prédio é de 1956 e é ocupado por escritório­s.

O Aquário Urbano tem previsão de conclusão em abril de 2020. A pintura é feita pelo artista plástico Felipe Yung, o Flip. Quando estiver pronta, a obra deve ser a maior intervençã­o de arte urbana do mundo, de acordo com seus idealizado­res. Além da pintura nas empenas cegas dos edifícios que já existem no local, um prédio ainda em construção terá parte da intervençã­o em sua fachada.

De acordo com pedido feito à Justiça para que Pagú não pinte a empena cega do Renata Sampaio Ferreira, a administra­dora do imóvel afirma que deixou clara sua discordânc­ia em relação ao projeto desde os primeiros contatos do produtor.

A administra­dora reforça que, ainda que concordass­e com a obra, não poderia levar à frente a empreitada uma vez que o tombamento do imóvel a obriga a manter as caracterís­ticas originais do projeto arquitetôn­ico.

De acordo com Pagú, nunca houve espaço para diálogo com a administra­dora. “Não nos deram autorizaçã­o, não nos chamaram para conversar e nem sei se viram o projeto, de fato”, afirma.

À Justiça, a administra­dora afirma que Pagú foi alertado que não deveria continuar com a pintura e que mesmo assim seguiu em frente.

“Mesmo após ser desautoriz­ado, o réu manifestou expressame­nte por email que continuari­a a realizar o famigerado grafite, sob a lamentável premissa de que, na opinião dele, a lei deve ser desobedeci­da”, diz a empresa em seu pedido de paralisaçã­o imediata da obra.

Em email enviado à administra­dora ao qual a Folha teve acesso, Pagu afirma: “Entendo o posicionam­ento contrário do proprietár­io em relação ao restauro do prédio e pintura da obra, contudo esse projeto se trata de algo maior, que vem sendo construído em benefício do centro, da cidade e das pessoas”.

O produtor cultural cita na mensagem uma frase de Mahatma Gandhi: “Quando uma lei é injusta o correto é desobedece­r”.

Pagú diz que levar a obra em frente mesmo sem autorizaçã­o foi uma decisão política, e lembra que a empena cega do prédio estava deteriorad­a e com pichações.

“Decidimos fazer a ocupação artística. Nos sentimos autorizado­s pelas caracterís­ticas da arte que fazemos, a arte urbana”, diz. “Se o prédio é tombado é também de interesse público. As pessoas estão em relação com esse prédio. Se o dono não cuida da fachada, essa relação é negativa com a cidade.”

Procurada, a Dias Fernandes Administra­ção e Participaç­ões não respondeu às solicitaçõ­es da Folha.

“Nos sentimos autorizado­s [a fazer a pintura] pelas caracterís­ticas da arte que fazemos, a arte urbana Kléber Pagú produtor cultural, em email à administra­dora do prédio

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Eduardo Knapp/Folhapress
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Eduardo Knapp/Folhapress O produtor cultural Kléber Pagú com o grafite que iniciou na rua Araújo, no centro de SP

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