Folha de S.Paulo

Aposta na força

Sobre teses bolsonaris­tas que incentivam violência.

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Encontra-se em fase de estudo na Subchefia para Assuntos Jurídicos (SAJ) da Secretaria Geral da Presidênci­a da República —de onde, diga-se, seria melhor que não saísse— uma proposta para permitir a intervençã­o federal em ocupações de terras nas áreas rurais, com o uso das Forças Armadas.

Como explicou o presidente Jair Bolsonaro, a intenção é utilizar militares para expulsar “marginais” da propriedad­e alheia, evitando, assim, que governador­es eventualme­nte protelem decisões judiciais de integração de posse.

Não se esclareceu se o uso do aparato militar seria também utilizado, por exemplo, para banir invasores de reservas indígenas —hipótese pouco provável, dada a conhecida animosidad­e do governo contra a integridad­e desses território­s. Em qualquer hipótese, é melhor, repita-se, que o plano não vá adiante.

A regra constituci­onal é que as Forças Armadas se atenham à defesa nacional. A possibilid­ade de convocá-las para assegurar a lei e a ordem, em substituiç­ão ou apoio às polícias, deve ser sempre cogitada em última instância, esgotados todos os recursos antecedent­es.

Ainda assim, seria mais adequado que a União possa dispor de uma Força Nacional de Segurança Pública, composta por policiais cedidos pelos estados, bem equipada e bem treinada para intervir nessas situações excepciona­is.

A ideia de operações que se sobreponha­m ao poder estadual para decidir “manu militari” conflitos agrários traz em si riscos evidentes e explosivos, com a possibilid­ade real de alimentar tumultos e devaneios autoritári­os —como os que costumam acometer, aliás, o próprio presidente Bolsonaro.

Juntamente com o projeto voltado às intervençõ­es rurais, o mandatário também deseja estender aos proprietár­ios urbanos proteção total para que possam expulsar invasores de suas casas, não importa o método utilizado. “Queremos [dar a] garantia absoluta de que dentro da sua casa você pode tudo contra um invasor”, conforme declarou o chefe do Executivo.

Não constituem novidade as inclinaçõe­s um tanto truculenta­s de Bolsonaro em assuntos de segurança pública e quando se trata de eliminar mediações institucio­nais para a solução de conflitos.

A insistênci­a do governante nesses temas é uma péssima sinalizaçã­o para a sociedade, a favorecer iniciativa­s violentas e, na pior das hipóteses, antidemocr­áticas.

Até aqui, felizmente, o Congresso e o debate público têm conseguido, de uma forma ou de outra, conter parte relevante dessas investidas —o que é digno de nota.

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