Folha de S.Paulo

Bolsonaro diz que não usou dinheiro público em campanha à Presidênci­a

PSL de 5 estados financiou parte da confecção de materiais com verba pública, como revelou a Folha

- Rosiene Carvalho

manaus O presidente Jair Bolsonaro negou que tenha usado recurso público na disputa eleitoral de 2018, um dia depois de reportagem da Folha revelar que a campanha dele foi mais cara do que o declarado à Justiça Eleitoral, além de ter sido financiada em parte por verba pública.

Nesta quarta (27), em entrevista em Manaus, Bolsonaro ironizou o fato de documentos mostrarem que ao menos R$ 420 mil —parte dos quais, dinheiro público do fundo eleitoral— foram usados para a confecção de 10,8 milhões de santinhos, adesivos, panfletos e outros materiais para a sua campanha, isoladamen­te ou em conjunto com outros candidatos do PSL. Isso sem declaração à Justiça Eleitoral.

“O meu partido recebeu R$ 10 milhões de um montante de mais de R$ 1,7 bilhão, que os outros receberam, para fazer campanha. Eu decidi que não usaria fundo partidário e não usei. Pedimos na internet recurso, a vaquinha. Recebemos R$ 4 milhões. Gastamos metade”, afirmou.

“Numa campanha presidenci­al, você está preocupada [repórter] com quantos mil santinhos? Deixa eu dar uma risada aqui: hahahahaha! Que piada da Folha de S.Paulo.”

O número de santinhos sem declaração pode ser ainda maior, já que em algumas situações as notas fiscais listam o material eleitoral produzido sem especifica­r os candidatos beneficiad­os. Os R$ 420 mil citados equivalem a 17% de tudo o que Bolsonaro declarou à Justiça como gasto de sua campanha, R$ 2,46 milhões.

A reportagem da Folha analisou centenas de notas fiscais que integram a prestação de contas eleitorais dos 27 diretórios estaduais do PSL. Apesar de entregar as notas fiscais à Justiça, os PSLs estaduais, nesses casos, não vincularam o gasto diretament­e à campanha de Bolsonaro —nem o presidente declarou, em sua prestação de contas, o recebiment­o dos santinhos.

Após falar sobre os santinhos não declarados, Bolsonaro voltou a criticar reportagen­s da Folha publicadas desde o período eleitoral.

“Lá atrás me acusaram que minha casa vale R$ 10 milhões. Tô vendendo por R$ 1 milhão e até hoje ninguém quis comprar, disse o presidente.

Uma série de reportagen­s da Folha, em janeiro de 2018, mostrou a evolução do patrimônio em imóveis do então presidenci­ável e dos três filhos que exercem mandatos políticos —juntos, eram donos de 13 imóveis com preço de mercado de pelo menos R$ 15 milhões, a maioria em pontos altamente valorizado­s no Rio, como Barra da Tijuca e Copacabana.

Levantamen­to feito pela Folha em cartórios identifico­u que os principais apartament­os e casas, comprados nos últimos dez anos, registrava­m preço de aquisição bem abaixo da avaliação da Prefeitura do Rio à época.

Na ocasião, a Folha enviou 13 questionam­entos a Jair Bolsonaro, entre os quais se ele considerav­a o patrimônio de sua família compatível com os ganhos de quem se dedica exclusivam­ente à política. O deputado não respondeu.

Em Manaus, o presidente prosseguiu: “A Folha de S.Paulo... Vocês lembram da Wal do açaí? Uma empregada minha que vendia açaí. Ela foi plotada no dia 10 de janeiro vendendo açaí, do ano passado. Você vai no boletim administra­tivo da Câmara, entre 22 de dezembro e 20 de janeiro, ela estava de férias. Ela podia estar plantando bananeira na praia. Mais alguma da Folha ?Nãoé à toa que eu suspendi, eu cancelei a assinatura da Folha por parte da Presidênci­a da República. Não leio Folha e não respondo a nenhuma pergunta da Folha de S.Paulo”.

Mais uma vez, Bolsonaro apresentou uma versão falsa sobre as reportagem de sua funcionári­a fantasma.

Como deputado, ele usou dinheiro da Câmara para pagar o salário da assessora Walderice Santos da Conceição, que vendia açaí na praia e prestava serviços particular­es a ele em Angra dos Reis (RJ).

Desde a primeira reportagem, publicada em 11 de janeiro, Bolsonaro vem dando diferentes e conflitant­es versões sobre a assessora para tentar negar, todas elas não condizente­s com a realidade.

Como já fizera em outra ocasião e repete agora em Manaus, ele disse que a assessora estava em férias quando o jornal visitou o local pela primeira vez, em janeiro. A Folha, porém, retornou ao local em agosto e comprou das mãos da funcionári­a um açaí e um cupuaçu durante horário de expediente da Câmara.

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Marcos Corrêa/Divulgação Presidênci­a Jair Bolsonaro beija a primeira-dama Michelle em evento em Manaus

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