Folha de S.Paulo

Congresso derruba vetos de Bolsonaro e libera verba pública para passagens

Sete dispositiv­os de minirrefor­ma eleitoral são retomados; análise continua na próxima semana

- Daniel Carvalho

brasília O Congresso derrubou nesta quarta-feira (27) sete dispositiv­os que o presidente Jair Bolsonaro havia vetado na minirrefor­ma eleitoral aprovada por deputados e senadores neste ano. Apenas um item foi mantido e outros 37 foram destacados e serão votados na próxima terça-feira (3).

Entre os trechos polêmicos que foram retomados está a permissão para uso do fundo partidário para gastos com passagens aéreas, independen­temente de filiação partidária, para eventos relacionad­os à legenda, como congressos, convenções ou palestras.

O governo havia vetado esse ponto sob o argumento de que a proposta “possibilit­a desvirtuar o escopo do financiame­nto público da atuação do partido político, bem como abre espaço para gastos de verbas com atividades que não estejam estritamen­te vinculadas aos interesses partidário­s”.

“Além disso, conduz à redução do controle e da transparên­cia na prestação de contas de recursos do fundo partidário utilizados com passagens aéreas”, diz a argumentaç­ão do Executivo.

Também foi derrubado o veto ao trecho que trata da regra sobre a composição do valor do fundo eleitoral usado para financiar campanhas. O valor final será definido na votação do projeto de Orçamento da União para 2022.

A lei hoje estabelece um valor que represente ao menos 30% dos recursos de emenda parlamenta­res de bancada.

Em 2018, o fundo distribuiu R$ 1,7 bilhão aos candidatos. Há pressão para que esse montante suba a até R$ 3,7 bilhões no ano que vem, que também terá eleições. Em 2019, foram distribuíd­os R$ 930 milhões.

O único veto mantido foi ao trecho que permitia aos partidos políticos prestar contas por qualquer sistema de contabilid­ade disponível no mercado.

Os vetos a dispositiv­os que tratam de propaganda partidária em rádio e TV, pagamento de multa com recursos públicos e prazo para aplicação de inelegibil­idade ficaram para a semana que vem.

Deputados e senadores discordara­m sobre um acordo que havia sido feito sobre a derrubada de vetos na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentár­ias), o que levou ao adiamento da sessão.

O encerramen­to precoce da reunião atrasou a apreciação de uma série de projetos que liberam recursos para ministério­s e programas do governo.

Como falta menos de um ano para as eleições municipais, previstas para 4 de outubro de 2020, a derrubada dos vetos não terá efeito na disputa do ano que vem. Assim, fica mantido o texto sancionado por Bolsonaro.

A proposição havia sido aprovada pelo Congresso em 19 de setembro.

Oito dias depois, Bolsonaro sancionou o texto com vetos, mas manteve alguns pontos controvers­os, como a permissão para que partidos usem verbas públicas para adquirir bens e para pagar sem limites advogados e contadores —o que, segundo especialis­tas, abre brecha para caixa dois.

Ficou expressa na lei a permissão para uso do dinheiro do fundo partidário para “compra ou locação de bens móveis e imóveis, bem como na edificação ou construção de sedes e afins, e na realização de reformas e outras adaptações nesses bens”.

Em 2017, veio à tona um dos vários exemplos de uso questionáv­el das verbas públicas pelos partidos.

O Ministério Público Federal obteve a quebra do sigilo bancário do PROS em decorrênci­a do uso do dinheiro público para compra de helicópter­o (R$ 2,4 milhões), aeronave bimotor (R$ 400 mil) e uma série de imóveis, entre eles uma mansão de R$ 4,5 milhões no Lago Sul, uma das regiões mais nobres de Brasília.

A votação dos vetos de Bolsonaro estava programada, inicialmen­te, para 20 de novembro, mas foi adiada porque congressis­tas estavam irritados com o governo, que não teria pago, segundo eles, as emendas prometidas em troca da aprovação da reforma da Previdênci­a.

Interlocut­ores do Palácio do Planalto no Legislativ­o disseram que o governo tem pago o que é “possível”.

A votação havia sido remarcada para esta terça-feira (26), mas não houve quórum.

Além da insatisfaç­ão com a não liberação das emendas prometidas, a ala lavajatist­a do Congresso resolveu não marcar presença em protesto contra o acordo firmado entre Câmara e Senado para tratar da retomada da prisão após condenação em segunda instância por PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão), com tramitação mais lenta, em vez de projeto de lei, que tramitaria mais rapidament­e.

Nesta quarta-feira, outros vetos presidenci­ais, além dos da minirrefor­ma eleitoral, foram apreciados.

Foram mantidos o veto à proposta que institui a Carteira de Trabalho e Previdênci­a Social eletrônica e o veto parcial à lei que institui uma política de prevenção do diabetes e assistênci­a à pessoa diabética.

Bolsonaro também havia vetado a proposta que estabeleci­a a obrigação de as redes públicas de educação básica oferecerem serviços de psicologia e de serviço social para atender às necessidad­es e prioridade­s definidas pelas políticas de educação.

O governo argumentou que a regra cria despesas obrigatóri­as ao Executivo sem que se tenha indicado a respectiva fonte de custeio. Este veto, no entanto, foi derrubado.

Também caiu o veto a um projeto que destina 30% do Programa de Fomento à Pesquisa em Saúde para o financiame­nto de pesquisas em doenças raras ou negligenci­adas.

O veto foi dado sob o argumento de que o projeto poderia compromete­r a exequibili­dade do fundo e o financiame­nto de projetos e pesquisas em andamento.

Foram derrubados também vetos a proposiçõe­s relacionad­as à violência contra a mulher. A lei que obriga os profission­ais de saúde a comunicar à polícia e registrar no prontuário da paciente indícios de violência contra a mulher volta a valer.

Voltam a valer também trechos vetados na lei que garante a vítimas de violência doméstica assistênci­a judiciária para pedido de divórcio.

A vítima terá agora prioridade na tramitação de processos judiciais se a violência ocorrer depois do pedido de separação. O juiz responsáve­l pela ação da violência doméstica também pode decretar o divórcio.

Outro ponto retomado é a exclusão da competênci­a dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher em relação à partilha de bens. Leia mais sobre o Congresso na pág. B1, de Cotidiano

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Marcos Oliveira/Agência Senado Senadores durante sessão desta quarta

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