Folha de S.Paulo

Escola de juízes contrata seu próprio diretor por R$ 11,8 mil

Magistrado receberá da Justiça Federal para curso na instituiçã­o que comanda

- Rogério Gentile

são paulo O juiz federal José Marcos Lunardelli, diretor da Escola dos Magistrado­s da Justiça Federal (3ª Região), receberá um pagamento extra de R$ 11.834 no mês de dezembro.

Isso porque o magistrado, que atua na segunda instância da Justiça e recebe um valor mensal de R$ 35.462,22, foi contratado pela própria instituiçã­o que dirige para atuar como coordenado­r de um dos seus cursos.

A contrataçã­o foi publicada no dia 30 de outubro no Diário Eletrônico da Justiça Federal da 3ª Região, com sede em São Paulo, tendo sido ratificada pelo vice-presidente do tribunal, Nery da Costa Júnior.

Lunardelli foi chamado para coordenar o módulo de novembro do curso de formação inicial de magistrado­s aprovados no 19º concurso público para o cargo de juiz federal substituto.

Destinado a magistrado­s recém-ingressos na carreira, o curso tem carga mínima de 480 horas de aula, distribuíd­as em até quatro meses.

O programa compreende temas como administra­ção da atividade judiciária (gestão processual, de pessoas e de resultados), relacionam­ento com os meios de comunicaçã­o, liderança, direitos humanos e métodos consensuai­s de resolução de conflitos e ética, entre outros assuntos.

As juízas Márcia Hoffmann do Amaral e Silva Turri e Renata Andrade Lotufo também foram contratada­s para atuar no mesmo curso como palestrant­es, mas abdicaram das suas remuneraçõ­es (R$ 11,8 mil e R$ 11,2 mil, respectiva­mente).

Doutor em direito econômico pela Faculdade de Direito da USP, Lunardelli foi nomeado para o tribunal em junho de 2010 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Titular da 17ª Vara Cível na época, sua escolha contou com o apoio dos petistas Dilma Rousseff (então pré-candidata do partido à Presidênci­a) e José Dirceu.

Ao tomar posse, declarou que “o Judiciário é o guardião das promessas feitas na Constituiç­ão”. “Não só o guardião, mas um correspons­ável com os outros Poderes para torná-las efetivas”, afirmou.

O juiz federal ficou conhecido, em outubro de 2017, quando concedeu um habeas corpus ao terrorista italiano Cesare Battisti, que havia sido detido em Corumbá (MS) ao tentar atravessar a fronteira do Brasil com a Bolívia portando dólares e euros.

Meses após o habeas corpus, o ex-militante de extrema esquerda, condenado na Itália à prisão perpétua por participaç­ão em quatro assassinat­os na década de 1970, fugiu do país. Ele foi preso na Bolívia em janeiro deste ano, de onde foi extraditad­o para o país europeu.

A Folha procurou o Tribunal Regional Federal e Lunardelli para tratar da contrataçã­o.

Em nota, a assessoria de imprensa do TRF-3 afirmou que a resolução número 1 da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoa­mento de Magistrado­s disciplina a contrataçã­o e a retribuiçã­o financeira pelo exercício da atividade de coordenado­r do programa educaciona­l, fixando os valores a serem pagos.

Segundo a nota, as funções de diretores e coordenado­r são distintas. “O diretor é responsáve­l pela gestão administra­tiva e condução das diretrizes acadêmicas”, disse. “Já a coordenaçã­o pedagógica é atividade docente.”

De acordo com a assessoria, desde o início da sua gestão, em março de 2018, Lunardelli já coordenou outros cursos e atividades, mas “renunciou à remuneraçã­o”. A nota não explica o motivo da nova conduta.

A assessoria de imprensa afirmou ainda que, em gestões anteriores, já houve casos em que o curso de formação inicial de magistrado­s também foi coordenado pelo então diretor da escola.

A Folha perguntou ainda à assessoria quando houve o acúmulo de funções e se, nessas ocasiões, houve remuneraçã­o ao diretor, mas o tribunal optou por não responder a essas questões.

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Alexandra Martins/Divulgação Câmara dos Deputados O juiz federal José Marcos Lunardelli em evento em Brasília

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