Folha de S.Paulo

Vargas foi hábil para voltar à Presidênci­a, mas não resistiu às fortes crises do poder

- Naief Haddad

SÃO PAULO No dia 29 de outubro de 1945, depois de ser deposto da Presidênci­a, Getúlio Vargas deixou o Rio de Janeiro em um voo rumo à sua cidade natal, São Borja (RS).

Aos 63 anos, ele se despedia do Palácio do Catete depois de uma década e meia no poder.

Ao seu lado durante a viagem ao interior gaúcho, o sobrinho Serafim Dornelles perguntou ao tio o que ele planejava fazer dali pra frente.

“Sou uma peça que foi movida da posição que ocupava, e eles pensam que vou permanecer onde me colocaram”, disse. “É o grande erro deles; não sabem que vamos começar novo jogo e com todas as pedras de volta ao tabuleiro.”

O político gaúcho estava certo na sua metáfora de enxadrista. Cinco anos depois, após articulaçõ­es bem-sucedidas, Vargas voltou à Presidênci­a, desta vez eleito —em 1930, havia alcançado o poder por meio de uma revolução.

Em outubro de 1950, Vargas (PTB) recebeu 3,8 milhões de votos, derrotando os candidatos da UDN e do PSD.

Quando retornou ao Rio para tomar posse, em janeiro de 1951, o ex-ditador ganhou até uma marchinha como homenagem. “Bota o retrato do velho outra vez / bota no mesmo lugar”, cantavam os cariocas.

Vargas (1930-1945 e 19511954) e Eurico Dutra (19461951) são temas do 12º volume da Coleção Folha - A República Brasileira, que chega às bancas neste domingo, dia 1º. O autor do livro é o jornalista Lira Neto.

Ao reassumir a Presidênci­a, Getúlio logo percebeu que seu mandato seria bem mais difícil que a campanha. Enfrentou indicadore­s econômicos negativos, greves e uma insatisfaç­ão crescente nos quartéis. Tentou mais de uma vez fazer alianças com a oposição, mas não obteve êxito.

Iniciativa­s de impacto, como a criação da Petrobras e a duplicação do salário mínimo, não lhe assegurara­m a estabilida­de no comando do país.

A crise se acentuou com o atentado contra Carlos Lacerda, dono da Tribuna de Imprensa, o principal jornal da oposição, em 5 de agosto de 1954. Lacerda teve um ferimento no pé, mas o major que o acompanhav­a foi atingido por dois tiros e morreu.

As investigaç­ões apontaram envolvimen­to de Gregório Fortunato, chefe da guarda do Catete, e de Benjamim Vargas, irmão do presidente.

As reações foram enfáticas, a começar pela cúpula das Forças Armadas, que passou a exigir a renúncia do presidente. Nem mesmo os ministros militares o apoiaram.

Na manhã de 24 de agosto, como escreve Lira Neto, “Vargas, aos 72 anos, atirara contra o próprio peito, com um revólver Colt calibre 32 e cabo de madrepérol­a”.

O suicídio mudou os rumos da história política do país.

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