Hemorragia cultural
rio de janeiro Quando Jair Bolsonaro reduziu o Ministério da Cultura a uma subpasta e a subordinou ao Ministério do Turismo —este, hoje só um salvo-conduto para proteger um político sob suspeita—, pensouse que fazia isso por sua ignorância do que seja cultura. É claro que tal hipótese não pode ser afastada. Tudo indica que, para Bolsonaro, que nunca abriu um livro em sua miserável vida, a cultura realmente se resuma a shows de sertanejos ou novelas da TV Record.
Mas talvez haja algo mais por trás de tanta boçalidade. Talvez ele o faça de propósito. Bolsonaro e seus asseclas não passam um dia sem achincalhar os produtores de cultura, degradar suas instituições e humilhar a enorme massa da população para quem a arte e o pensamento são essenciais para sua realização humana. É uma agressão permanente a uma categoria desarmada, uma demonstração contínua de que são capazes de se impor sobre a inteligência e que estão dispostos a reescrever a história —tanto a passada, com seus revisionismos equinos, como a que se irá escrever.
Neste momento, homens e mulheres de ciência e experiência comprovadas, com décadas de dedicação a instituições sérias e apolíticas, estão sendo alijados de seus cargos e substituídos pelas mais chapadas nulidades. Essa ocupação pela mediocridade está se dando na Biblioteca Nacional, na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), na Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura, na Funarte, na Ancine (Agência Nacional de Cinema), na Secretaria de Audiovisual, na Fundação Palmares e contaminando até as instituições estaduais.
É uma hemorragia que, por chamar tanto a atenção, pode ser uma manobra para encobrir ocupações em outros órgãos igualmente vitais para o destino do país —na administração pública.
Talvez elas estejam se dando, sem que percebamos, sob nossos narizes.