Folha de S.Paulo

Golfo Pérsico usa esporte para se promover

Qatar, Arábia Saudita e Emirados Árabes gastam bilhões de dólares em eventos como forma de melhorar reputação

- Andrew England e Murad Ahmed

londres e diriyah (arábia saudita) | financial times Flanqueado pelos boxeadores Anthony Joshua (ex-campeão dos pesos pesados) e Andy Ruiz Jr. (mexicano que chocou o planeta ao vencer a luta entre os dois), o empresário britânico Eddie Hearn projetava a nova disputa do título, dessa vez na histórica Diriyah, no coração conservado­r da Arábia Saudita.

O país gastou cerca de US$ 50 milhões (R$ 210 milhões) para poder sediar a luta, em 7 de dezembro. O esporte está se tornando a mais nova plataforma para o príncipe herdeiro, Mohammad bin Salman, mudar a imagem do país e sacudir sua sociedade conservado­ra —como parte de seu programa de reforma econômica, o Visão 2030.

A capital saudita segue os vizinhos Qatar e Emirados Árabes Unidos, que investiram bilhões de dólares para deixar sua marca no esporte.

O maior impacto foi no futebol, com a escolha do Qatar como sede do Mundial de 2022, e os milhões de dólares gastos por Abu Dhabi e Doha no Manchester City e no PSG.

Ativistas acusam os regimes autocrátic­os do Golfo Pérsico de usar marcas esportivas para desviar a atenção de seus históricos desfavoráv­eis quanto aos direitos humanos.

A luta entre Joshua e Ruiz surge em um momento no qual a Arábia Saudita está desesperad­a por reparar sua imagem, maculada no ano passado pelo assassinat­o do jornalista Jamal Khashoggi.

Com a maior economia do Oriente Médio e a maior população do Golfo, a entrada do país no esporte pode causar grande impacto na área.

“[A iniciativa dispõe que] promovamos a Arábia Saudita em termos de turismo, e que usemos o esporte como recurso para isso”, diz o príncipe Abdulaziz bin Turki alFaisal, presidente da Autoridade Geral do Esporte saudita.

A luta entre Joshua e Ruiz será em estádio aberto para 20 mil lugares, com os ingressos de primeira fila à venda por US$ 13 mil (R$ 55 mil). Depois, Diriyah sediará um torneio de tênis que pagará US$ 3 milhões (R$ 13 mi) em prêmios e promete “oito dos melhores tenistas do ranking”.

Em janeiro, o país receberá pela primeira vez o Rali Dakar. Mais tarde, Barcelona e Real Madrid disputarão a Supercopa da Espanha, em Jeddah. Há ainda rumores de que o príncipe Mohammed quer comprar o Manchester United.

O reino também vai sediar a Supercopa da Itália e uma etapa do circuito de ciclismo. Em fevereiro, a primeira Saudi Cup de turfe terá premiação recorde de US$ 20 milhões (R$ 85 milhões).

Autoridade­s do Golfo Pérsico dizem que os investimen­tos são parte de um esforço mais amplo para diversific­ar suas economias dependente­s do petróleo, fomentar o turismo e melhorar sua reputação.

O Qatar vai gastar mais de US$ 200 bilhões (R$ 850 milhões) em infraestru­tura para a Copa do Mundo. A pista de Fórmula 1 de Abu Dhabi é a peça central de um grande projeto imobiliári­o de US$ 40 bilhões (R$ 170 bi) na ilha Yas.

Mas o país vem sendo acusado de ter recorrido à corrupção para sediar a Copa. Também atraiu críticas pelo tratamento a trabalhado­res estrangeir­os e por sua posição quanto aos direitos da comunidade LGBT. O governo nega.

O Manchester City e o PSG são investigad­os pela Uefa, por supostas violações das regras financeira­s do futebol.

O projeto do City se expandiu, com o City Football Group comprando clubes em Nova York e Melbourne e participaç­ões em times no Japão, Espanha, Uruguai e China.

Na quarta (27), o grupo de investimen­to Silver Lake Partners anunciou a aquisição de 10% do City Football Group, fazendo da empresa a mais bem avaliada do futebol: US$ 4,8 bilhões (R$ 20 bilhões).

Nasser al-Khelaifi, presidente do PSG e do conselho da Qatar Sports Investment (dona dos parisiense­s), foi colocado sob investigaç­ão na França por suposto suborno na candidatur­a de Doha como sede do Mundial de Atletismo. Ele nega as acusações.

Para o ativista pelos direitos humanos, Nicholas McGeehan, a estratégia de poder vem obtendo sucesso. “Para cada liberal indignado no Ocidente que desaprova o envolvimen­to [do emirado no futebol], existem mil garotos com camisas de futebol que trazem o nome do Qatar.”

Alguns analistas sugerem que a contrataçã­o de Neymar em 2017, pelo recorde de 222 milhões de euros (R$ 824 mi à época), tinha por objetivo, em parte, enviar a mensagem de que o Qatar não estava abalado pelo embargo econômico imposto por Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Bahrein. Os qatarianos acusam os rivais de fomentarem publicamen­te denúncias de corrupção contra o país.

O canal esportivo qatariano beIN (do mesmo grupo do PSG), que teria gastado mais de US$ 15 bilhões (R$ 63,7 bi) em direitos de transmissã­o de eventos esportivos, acusa a Arábia Saudita de prejudicar seu produto por meio de uma rede pirata chamada beoutQ.

O reino era o maior mercado da emissora no Oriente Médio. Riad nega envolvimen­to com a rede pirata. A beIN pede US$ 1 bi em indenizaçã­o (R$ 14,25 bi) dos sauditas em uma corte internacio­nal.

Simon Chadwick, professor na Escola Salford de Administra­ção, entende que quanto maior se tornar a rivalidade, mais dinheiro será gasto. “Se o Qatar investir 1 bilhão, a Arábia Saudita terá de investir 2”.

Perguntado se Riad disputaria a organizaçã­o de uma Olimpíada ou Copa do Mundo, o príncipe Abdulaziz respondeu: “Por que não?”.

“Sempre haverá a percepção sobre a Arábia Saudita, não importa o que façamos, de que estão sentados em uma pilha de dinheiro. Mas sabemos o que queremos e é isso que vamos fazer”, completa. Tradução de Paulo Migliacci

 ?? Divulgação/IHF ?? SELEÇÃO FEMININA PERDE NA ESTREIA DO MUNDIAL DE HANDEBOL
Na madruga deste sábado (30), no Japão, a seleção brasileira de handebol feminina foi derrotada pela Alemanha por 30 a 24, na primeira partida do Mundial. Agora, para conseguir uma vaga na próxima fase do torneio, a seleção precisa vencer pelo menos dois de seus próximos confrontos. No Grupo B, o Brasil tem como adversária­s, além das alemãs, as campeãs mundiais Dinamarca e Coreia do Sul, a menos tradiciona­l Austrália, e a bicampeã do mundo, a França. Apenas as três melhores seleções avançam para a segunda fase do torneio, quando dois novos grupos serão montados. Após o título mundial em 2013, o Brasil tenta se recuperar da eliminação precoce nas oitavas de final para a Croácia, em 2015
Divulgação/IHF SELEÇÃO FEMININA PERDE NA ESTREIA DO MUNDIAL DE HANDEBOL Na madruga deste sábado (30), no Japão, a seleção brasileira de handebol feminina foi derrotada pela Alemanha por 30 a 24, na primeira partida do Mundial. Agora, para conseguir uma vaga na próxima fase do torneio, a seleção precisa vencer pelo menos dois de seus próximos confrontos. No Grupo B, o Brasil tem como adversária­s, além das alemãs, as campeãs mundiais Dinamarca e Coreia do Sul, a menos tradiciona­l Austrália, e a bicampeã do mundo, a França. Apenas as três melhores seleções avançam para a segunda fase do torneio, quando dois novos grupos serão montados. Após o título mundial em 2013, o Brasil tenta se recuperar da eliminação precoce nas oitavas de final para a Croácia, em 2015
 ?? Karim Jaafar - 26.nov.2019/AFP ?? Cerimônia antes de partida da Copa do Golfo no estádio Khalifa (Qatar)
Karim Jaafar - 26.nov.2019/AFP Cerimônia antes de partida da Copa do Golfo no estádio Khalifa (Qatar)

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil