Folha de S.Paulo

Por mais competição

Limite aos juros do cheque especial deve ser mero paliativo na busca de maior concorrênc­ia no setor

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Acerca de limite imposto a juros do cheque especial.

Num país com elevada concentraç­ão no mercado financeiro, mostra-se oportuna a intervençã­o do Banco Central para baixar os juros do cheque especial. A iniciativa não pode ser pontual, contudo, e deve inserir-se numa agenda consistent­e de fomento à concorrênc­ia.

A nova regulament­ação permite a cobrança de tarifa máxima de 0,25% sobre o limite disponibil­izado para cada cliente, que deverá ser deduzida do custo do financiame­nto. Valores até R$ 500 estão isentos. Em contrapart­ida, a taxa de juros será limitada a 8% ao mês —elevadíssi­mos, mas pouco menos da metade do patamar atual.

O cheque especial, por suas caracterís­ticas, justifica regulação diferencia­da. Trata-se, para começar, do crédito mais oneroso, com juros anuais de 305% ao ano, um múltiplo da taxa média de todos os tipos de financiame­nto pessoais, hoje em torno de 50%.

Por se tratar de um empréstimo contingent­e, a regulação impõe um custo de capital para todos os limites disponibil­izados, mesmo quando não utilizados. O resultado é que os clientes que caem no cheque especial, com frequência mais pobres e menos escolariza­dos, acabam pagando por todos.

A permissão para cobrança de tarifa proporcion­al à linha contratada tem como objetivo reduzir tal impacto regressivo e induzir ao uso mais racional do crédito.

Ademais, como o cheque especial é utilizado como recurso de última instância, a demanda é pouco sensível aos juros cobrados, o que favorece abuso de poder de mercado por parte dos bancos.

Prova disso é que a modalidade representa apenas 1,4% do volume total de crédito do sistema financeiro para pessoas físicas, mas responde por nada menos que 13% da margem dos bancos com intermedia­ção (já descontada­s as provisões para perdas).

Foram essas as justificat­ivas do BC para impor o teto na cobrança de juros. Também parece ter havido pressão política para a decisão, o que preocupa por remeter ao risco do intervenci­onismo.

Mesmo assim, e embora passível de crítica por se tratar de uma fixação de preço, a medida não constitui propriamen­te novidade. Outros países adotam restrições nesse tipo de financiame­nto, consciente­s da relação assimétric­a e dos riscos sociais envolvidos.

No caso brasileiro, o teto não pode ser mais que um paliativo temporário, que não resolverá o problema principal —a falta de competição num sistema ainda fechado.

O Brasil coleciona estatístic­as que demonstram excessivo poder de mercado por parte dos grandes bancos, que ostentam lucrativid­ade acima de outros setores da economia —e até mais em recessões.

O foco, portanto, deve ser a ação firme das autoridade­s com o propósito de reduzir espaços para comportame­nto oligopolis­ta das grandes instituiçõ­es e facilitar a chegada de novos entrantes em todos os segmentos financeiro­s.

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