‘Guichê da boa vontade’ trava diante de interesses de Trump
washington A aparente sinergia entre Jair Bolsonaro e Donald Trump é exemplo constante dos que defendem que a relação entre Brasil e EUA alcançou níveis históricos.
Parte do governo brasileiro insiste em que a empatia é suficiente para conceder benefícios ao país, mas o que ficou claro nos últimos meses em Washington é que o guichê da boa vontade formado para atender ao Brasil não vai se sobrepor ao interesse americano.
A decisão dos EUA de retomar as tarifas sobre o aço e o alumínio é a mais nova —e simbólica— alegoria desse cenário.
O anúncio de Trump desta segunda-feira (2) surpreendeu o governo brasileiro, que amanheceu tentando entender a razão e as consequências da medida protecionista do querido aliado.
A boa vontade é uma facilitadora poderosa no cotidiano da diplomacia e tem seu ápice consolidado durante as visitas presidenciais. O que diz respeito à agenda permanente, porém, demanda bem mais que isso.
Apesar do discurso de que a relação avança e de reuniões entre o primeiro escalão dos governos serem feitas com periodicidade quase mensal —foram pelo menos nove em dez meses—, o Brasil não ganhou muita coisa em troca da devoção aos americanos.
Para ficar nos exemplos mais recentes, além das novas tarifas desta semana, o país não conseguiu derrubar o veto à importação de carne “in natura” nos EUA e viu postergado o pleito de entrada na OCDE com apoio do governo Trump.
O fechamento do acordo de salvaguardas tecnológicas da base de Alcântara (MA) foi anunciado em março, quando Bolsonaro foi a Washington, mas, quando a delegação brasileira flertou com a ideia de que o amor de Trump resolveria pleito de quase 30 anos e abriria de vez o mercado para o açúcar, ouviu não.
Acabar com as cotas tarifárias faria com que o republicano perdesse votos em estados produtores importantes, como Flórida e Louisiana, às vésperas da eleição de 2020.
Agora, a guerra comercial com a China fala mais alto que qualquer relação de empatia com Bolsonaro.
A boa relação entre os presidentes não é um ativo desprezível, mas ainda precisa se refletir em uma agenda intensificada e de investimentos para o Brasil que vá além das visitas de Estado.