Tese de manipulação cambial não para em pé, dizem analistas
No Brasil, além de o dólar ter livre flutuação, BC tem agido para atenuar alta da moeda, e não valorizá-la mais
são paulo A declaração do presidente dos EUA, Donald Trump, de que os governos de Brasil e Argentina desvalorizam suas moedas não faz sentido do ponto de vista técnico, segundo economistas ouvidos pela reportagem.
Para eles, o que ocorre, ao menos no caso brasileiro, é o contrário, já que o Banco Central tem intervindo no mercado com a venda de dólares, medida que busca atenuar a desvalorização do real.
“A afirmação não tem fundamento técnico, o que faz crer que ela tenha outros motivos”, diz Mauro Rochlin, economista e professor da FGV.
No câmbio flutuante, política adotada por Brasil e Argentina, a autoridade monetária não define uma taxa cambial e, como regra, não interfere no mercado.
“Aqui a taxa flutua diariamente de acordo com oferta e demanda [de dólares]. O governo não teve participação na recente desvalorização das moedas. Na verdade, até a atenuou vendendo dólar.”
“O câmbio mais desvalorizado é bom para o exportador, que ganha competitividade, mas, quando a variação é aguda, há incerteza. Não há previsibilidade, o exportador não sabe qual será o câmbio.”
Segundo o economista Fernando Leite Neto, professor do Insper, o preço internacional do alumínio, por exemplo, depende de cotação em Bolsa, o que neutralizaria o impacto de uma desvalorização do real.
“O efeito da desvalorização é mais doméstico, para a empresa brasileira. Não muda o valor pago pelo americano pelo metal.”
Ele diz que o modelo de câmbio flexível do Brasil é o das principais economias do mundo, à exceção da chinesa —que adota o câmbio fixo e mantém a moeda desvalorizada para beneficiar exportações.
A flutuação plena, em que a taxa depende exclusivamente dos agentes privados, não é praticada por nenhum país, diz. “No câmbio flutuante, o governo atua eventualmente para segurar a volatilidade ou movimentos exacerbados da cotação”, afirma Leite Neto.
Para ele, não faz sentido dizer que o Brasil atua para desvalorizar o real. “Quando o ministro da Economia [Paulo
Guedes] diz que devemos nos acostumar a um real desvalorizado, indica que o governo está confortável com o câmbio. No dia seguinte o dólar subiu, mas o BC interveio.”
Na contramão global, Bolsa de SP sobe; siderúrgicas avançam Júlia Moura
são paulo A Bolsa brasileira operou na contramão dos principais mercados globais nesta segunda-feira (2), com alta de 0,6%. Investidores se dizem otimistas com as vendas superiores ao esperado na Black Friday e com a divulgação do PIB brasileiro do terceiro trimestre de 2019 nesta terça (3). Também beneficiou o mercado brasileiro a melhora da indústria chinesa.
A expansão na atividade industrial da China em novembro também chegou a animar mercados europeus pela manhã, mas com a divulgação, por volta das 12h, da queda na atividade de manufatura dos
EUA, os índices tombaram.
Frankfurt fechou em queda de 2%. Em Nova York, o Dow Jones caiu 0,96%, a S&P 500,
0,86%, e a Nasdaq, 1,12%.
No Brasil, o dólar caiu 0,54%, para R$ 4,218. Pela manhã, a moeda subiu aos R$ 4,26 com as possíveis tarifas dos EUA às importações de aço e alumínio. A cotação inverteu o sinal com a venda do Banco Central de US$ 480 milhões à vista.
Em um primeiro momento, o mercado interpretou a declaração de Trump como negativa, por gerar um conflito comercial com o Brasil. Em seguida, a leitura é que há chances de Trump não seguir adiante com as tarifas e, caso siga, o impacto nas grandes siderúrgicas seria pequeno.
As ações de siderúrgicas tiveram fortes altas no pregão. Os papéis preferenciais (preferência na distribuição de dividendos) da Gerdau subiram
2,65%, a R$ 17,45, maior valor desde setembro de 2018. As ações preferenciais da Usiminas subiram 2%, e as ordinárias, 1,8%. CSN avançou 5,7%.
Segundo Daniel Sasson, analista de siderurgia do Itaú BBA, a alta é explicada pela melhora no PMI chinês, que indica maior demanda pelas matérias-primas brasileiras.
Ele também aponta que a exportação de aço aos EUA foi só 7% do total exportado pela Gerdau em 2018. No caso da Usiminas, nos primeiros nove meses deste ano, 8,5% do total exportado foi para os EUA. Para a CSN, as exportações de aço aos americanos são menos de 1,5% total exportado.
Carolina Chimenti, vice-presidente-assistente da Moody’s, diz que a Gerdau, que tem operação nos EUA, poderia se beneficiar com as taxas, se houvesse um aumento de preços no mercado americano.