‘Biblioteca Nacional não será megafone de direita’, diz presidente
rio de janeiro Recém-empossado presidente da Biblioteca Nacional, Rafael Nogueira diz não ter qualquer intenção de provocar mudanças drásticas na instituição.
“Eu não chego como se soubesse o que está acontecendo e querendo implantar minha visão imediatamente”, afirma.
No futuro, caso não concorde com linhas e projetos, mexerá “sem dúvida”, afirmou à Folha nesta segunda (9), seu quarto dia de mandato. “Essa é a prerrogativa do presidente.”
“Mas a ideia não é chegar aqui e transformar a Biblioteca num megafone de direita. Eu não recebi essa instrução e não é o meu estilo. A ideia é manter o que ela está fazendo bem e implantar um pouco da minha visão docente, que é de aproximar as pessoas e de democratização da leitura.”
Formado em filosofia e direito em Santos, Nogueira lecionou nos ensinos fundamental, médio e técnico. Em universidades, foi professor de ensino à distância. Nunca foi filiado a partidos, embora na última eleição tenha feito campanha para Bolsonaro. “Mas fiz como cidadão privado”, afirma.
“Isso não é um mero discurso de autodefesa. Eu realmente não quero criar uma situação partidária em uma instituição de Estado que é bicentenária. Essa instituição transcende situações partidárias.”
Questionado sobre a possibilidade de exonerações de pessoas ligadas à esquerda, Nogueira afirma que a Biblioteca não se caracteriza pelo petismo instalado. “Não é o que eu encontrei aqui, não vejo a ideologia no comando. O que vi são pessoas muito capazes fazendo seus trabalhos e quero colaborar com isso.”
Sua principal meta no cargo faz parte de sua personalidade de professor, conta. Ele pretende dar maior acesso à leitura, fortalecendo as digitalizações e ampliando as atribuições da casa de leitura, que fomenta a atividade entre os jovens.
“Quero promover cursos de aproximação agrandes livros, para adultos, inclusive. Esse é o objetivo.” Prioridades não serão deixadas de lado, segundo ele. “As óbvias, como preservar o patrimônio bibliográfico do país, e as situações emergenciais, como, por exemplo, [o fato de haver] um grande número de servidores que vai se aposentar [mais de cem entre uma equipe de quase 400 funcionários], e eles precisam transmitir sua memória institucional, seus conhecimentos.”
Rafael Nogueira conheceu Olavo de Carvalho há cerca de 15 anos, quando o ideólogo foi dar um curso em Santos. “Achei muito interessante e passei a frequentar o curso dele em São Paulo e, mais tarde, também fiz o curso dele online. É um homem muito acessível e cordial; não é aquele que aparece nas redes sociais. Eu já tinha formação filosófica e encontrei nele uma perspectiva diferente e original.”
Nogueira falou ainda das polêmicas sobre ele que têm tomado a internet. A principal diz respeito a um post de dois anos atrás, quando escreveu que “livros didáticos estão cheios de músicas de Caetano Veloso, Gabriel O Pensador, Legião Urbana. Depois não sabem por que está todo mundo analfabeto”.
“Tomei um susto mesmo. Na TV, no rádio e no jornal escrito eu me tornei ‘aquele que se dedica a ofender personalidades da cultura’. Foi um tuíte para 20 ou 30 pessoas que me seguiam na época. Isso não me caracteriza. O que aconteceu é que eu estava analisando livros didáticos e reparei que o modelo colocado, aquele no qual as pessoas têm que se esforçar para chegar, muitas vezes era só o de música popular. Que, evidentemente, é um instrumento adequado para educação, mas não só.”
“Nós temos que usar ‘Os Lusíadas’, a alta literatura portuguesa, e percebi que alguns professores e livros exaltavam demais músicos brasileiros. Não exigiam tanto de seus alunos em capacidade de expressão, de compreensão de texto, análise gramatical, e eu fiz essa brincadeira”, afirma. “É óbvio que não é Caetano Veloso que gera o analfabetismo. E é óbvio que é possível usar música popular para favorecer a alfabetização. Isso é muito claro. Uma brincadeira retirada de contexto”, completa.
Outra controvérsia diz respeito à defesa da monarquia. “Acho que podemos aprender as lições da monarquia. E tenho respeito pela família imperial”, afirma.
Segundo Nogueira, dois adiamentos recentes de eventos da Biblioteca não têm ligação com sua chegada e foram decididos antes. É o lançamento do site Brasilianas de literatura infantojuvenil, com acervo histórico da casa, e a cerimônia de entrega do prêmio literário da instituição. “Ambos estão sendo retomados.”