Italo projeta disputa acirrada com Medina pelo ouro em Tóquio-2020
Campeão e vice mundiais representarão o Brasil na primeira Olimpíada que contará com o surfe
são paulo Nem bem chegou do Havaí, onde conquistou há quatro dias o título mundial de surfe, Italo Ferreira, 25, já está pensando na Olimpíada de Tóquio-2020, a primeira que contará com a modalidade na história.
O potiguar representará o Brasil ao lado do paulista Gabriel Medina, 25, seu principal adversário na última temporada. Até a disputa nas águas havaianas, ambos haviam vencido duas etapas do circuito. A dupla ainda fez a final em Pipeline, na qual o surfista de Baía Formosa (RN) superou o bicampeão mundial.
Para Italo, a concorrência com o colega brasileiro em 2019 marcará também a tônica da corrida pela medalha de ouro em Tóquio, uma disputa em que, na sua opinião, os compatriotas entram como grandes favoritos.
“Gostaria que o Filipe [Toledo] estivesse [na Olimpíada]. Seria um ouro, uma prata e um bronze. Mas vai ser só uma prata e um bronze. Quer dizer, um ouro e uma prata, me confundi. Eu levo o ouro e o Gabriel leva a prata”, afirmou Italo, em entrevista coletiva concedida neste domingo (22), em São Paulo.
“Acho que dependendo da chave, a gente pode cair junto em alguma bateria antes da final. Espero que não, que seja na final”, projetou.
Nos Jogos Olímpicos, cada país será representado por dois surfistas em cada gênero.
A dupla de brasileiros já experimentou neste ano uma prévia do que vão encontrar em 2020 na disputa olímpica.
Em setembro, eles competiram nos Jogos Mundiais de Surfe, evento organizado pela ISA (Associação Internacional de Surfe) e que era prérequisito para a participação de ambos na Olimpíada.
Nas águas japonesas, Italo Ferreira ficou com o ouro, e Medina com o bronze. As circunstâncias enfrentadas pelo potiguar, que teve o passaporte roubado e chegou à praia de Miyazaki faltando oito minutos para o início de sua primeira bateria, entrando para competir com uma prancha emprestada por Filipe Toledo, tornaram a conquista épica.
Antes dos Jogos Mundiais e da disputa no Havaí, ele e Medina já haviam se enfrentado na decisão da etapa de Jeffreys Bay, na África do Sul, em julho. O paulista foi o vencedor.
Para chegar à final em Pipeline, Gabriel Medina recorreu a uma prática pouco usual no circuito. Nas oitavas de final, ele cometeu deliberadamente uma interferência na onda do também brasileiro Caio Ibelli, tirando do rival as chances de virar o jogo no fim da bateria. Apesar de perder sua melhor nota como punição, conseguiu somatória suficiente para superar Ibelli e seguir na competição.
Para Italo, a artimanha do colega para se classificar não condiz com sua forma de enxergar o surfe competitivo.
“É um esporte individual, né. Tentamos fazer a melhor performance e acabamos deixando a amizade fora disso. O Gabriel é muito competitivo, até no futebol de mesa ele briga para ganhar”, disse Italo.
“Eu prefiro não jogar esse tipo de jogo e não me preocupar com meu adversário. Acho que você tira o foco de você mesmo. As pessoas me perguntavam com quem era a minha bateria e eu respondia ‘não sei, estou preocupado comigo, com minha mente’. Eu prefiro jogar o meu jogo”, completou o potiguar.
Italo retornará nos próximos dias ao Rio Grande do Norte para um curto período de férias. A partir da segunda semana de janeiro, já iniciará o período de treinos, antecipando a preparação para um ano que terá calendário cheio.
Segundo ele, que começou a surfar aos oito anos de idade com uma tampa de isopor em Baía Formosa, a experiência nas águas da cidade natal poderá ser útil na Olimpíada.
“O Japão é bem parecido com onde eu moro. É uma onda nem tão grande, nem tão forte e com um pouco de vento, então nisso acredito que eu tenha um pouco de vantagem por surfar essa onda desde criança”, analisou.
Com interferência, Medina colocou em risco vaga olímpica
são paulo A interferência intencional provocada por Gabriel Medina sobre Caio Ibelli poderia ter lhe custado a vaga nos Jogos de Tóquio-2020.
O artigo 171.11 do regulamento da WSL estabelece que interferências “intencionais, antidesportivas e graves” podem ser punidas com a perda do melhor resultado do ano ou até mesmo de todos os pontos da temporada. Nos dois casos, Medina seria ultrapassado por Filipe Toledo no ranking e, consequentemente, na corrida pela vaga olímpica.
O Escritório de Competição e o Diretor Disciplinar da WSL, ao analisar a interferência, entenderam que a ação de Medina, apesar de intencional, não foi “antidesportiva” e “grave”.
“A manobra foi considerada um artifício legal e não representou um risco à segurança de nenhum competidor”, afirmou à Folha Pat O’Connell, comissário da WSL.
A interpretação, porém, não é unânime e dividiu o mundo do surfe. Enquanto alguns trataram a interferência como golpe de mestre, muitos ainda a consideram antidesportiva.
“Eu apenas joguei o jogo, sabia que não era minha prioridade. Sabia que se eu cometesse a interferência só valeria minha melhor onda. Faltavam apenas 20 segundos. Ele [Caio Ibelli] precisava de algo na casa dos 5, mas eu não sei, estava muito difícil lá. Às vezes se tem algo em jogo, você precisa jogar. Eu sabia na minha cabeça o que eu estava fazendo”, disse Gabriel Medina.
A explicação não convenceu a todos, especialmente Ibelli, que falou em “jogo sujo” e relatou indignação ao ver, de dentro do mar, o pai e técnico de Medina, Charles, orientando o filho: “Pode rabear, pode rabear”. A imagem foi flagrada e Medina respondeu dando sinal de positivo, com o polegar da mão esquerda. Rabear é, na gíria do surfe, entrar na frente de outro surfista em uma onda, configurando interferência.
“Na minha onda seguinte, que seria a minha melhor, ele me rabeou. Isso mostra o tipo de competidor que ele é. Ele joga duro, ele joga sujo se precisar e faz de tudo para vencer. É assim que deve ser a mente de um campeão”, comentou Ibelli, que ouviu pedido de desculpas de Medina.
Segundo o empresário de Caio Ibelli, Luiz Pinga, o atleta não pretende entrar com representação na WSL contra o compatriota.
O maior beneficiado com a punição de Medina na corrida pela vaga olímpica seria Filipe Toledo. A assessoria de imprensa do surfista disse que ele não se pronunciaria sobre o caso por ser parte interessada no resultado.
Onze vezes campeão mundial, o americano Kelly Slater, que em 2017 sofreu uma interferência de Medina em situação similar à de Ibelli, fez um post em seu Instagram sugerindo que o brasileiro entrasse com representação na WSL.
Nos bastidores da liga já se fala na possibilidade de um ajuste na regra para evitar a repetição de casos desse tipo, em que um surfista acaba sendo premiado por impedir que outro surfe.
Fernando Poffo