Folha de S.Paulo

Brasil envenenado

- Alvaro Costa e Silva

rio de janeiro “Quem mandou fazer chacota com a fé dos outros?” “Foram mexer em vespeiro para ganhar Ibope: assumam as consequênc­ias.” “Retribuind­o o carinho recebido.” “Os cristãos são até muito pacíficos e pacientes no Brasil.” “Acho é pouco.” “Queria entender esse pessoal que acha que cristão tem que aguentar todo tipo de ridiculari­zação, ser covarde e não fazer nada. Nunca estudaram as cruzadas?” “Que Deus abençoe os envolvidos no atentado.”

“Colhendo o que plantaram. Jesus é bom o tempo todo.” “Na próxima vez queimem os produtores!” “Por que não me chamaram? Pegaria logo uma bazuca.” “Melhor presente de Natal!” “Fogo nos hereges!” “Poderia ter sido um carro bomba. Eles ainda estão no lucro.” “A justiça de Deus nunca falha.” “Só esperando o especial de Ramadã com o Maomé gay”. “Pura liberdade de expressão.” “Com certeza foi alguma vítima da sociedade que estava sob efeito de drogas.” “KKKKKK!”

Não tive estômago para pescar outras pérolas. É só uma amostra, com os exemplos mais leves e publicávei­s, do que se leu nas redes sociais na véspera de Natal, logo após circular a notícia de que quatro pessoas atacaram com coquetéis molotov a sede da produtora Porta dos Fundos, responsáve­l pelo humorístic­o “A Primeira Tentação de Cristo”.

São na maioria mensagens anônimas: os remetentes usam avatares de super-heróis ou de símbolos bíblicos. Na quarta (25), um inacreditá­vel Comando de Insurgênci­a Popular Nacionalis­ta da Família Integralis­ta Brasileira reivindico­u o ataque.

É um trailer do Brasil para 2020. Diante da espiral de intolerânc­ia e ódio, agora acrescida de atentados que podem matar, não espanta que o presidente —cuja estratégia de poder é “cancelar” todo aquele que ele julga seu adversário— tenha no Palácio da Alvorada um provador de comida. Bolsonaro tem medo de ser envenenado. Mas promove o envenename­nto da sociedade.

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