Folha de S.Paulo

Prêmio à produtivid­ade é raro nas empresas, aponta pesquisa

- Fernanda Brigatti

são paulo Entre os tipos variados de bônus oferecidos pelas empresas como incentivo aos funcionári­os, a minoria absoluta dessas premiações tratava de estímulo à produtivid­ade.

Até mesmo o abono por tempo de serviço ou por aposentado­ria foi incluído com mais frequência em acordos fechados entre empresas e funcionári­os no último ano.

Os dados do Salariômet­ro, levantamen­to feito pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) na base de informaçõe­s do Ministério da Economia, mostram que até mesmo abonos por assiduidad­e apareceram mais nos acordos assinados em 2019 do que o incentivo à produtivid­ade, que marcou 0,1% no balanço divulgado em novembro.

O professor da USP e economista da Fipe Hélio Zylberstaj­n, coordenado­r da pesquisa, diz que, quando começou a levantar as informaçõe­s de abonos, se surpreende­u com a existência do prêmio por tempo de serviço. Esse pagamento extra ainda é diferente das bonificaçõ­es incorporad­as aos salários, como os quinquênio­s.

A baixíssima inclusão do bônus por produtivid­ade vem, na avaliação do professor da USP, da falta de uma tradição de estímulos desse tipo. O mais próximo disso é o acordo por PLR (Participaç­ão nos Lucros e Resultados). “O problema é que o critério mais frequente nesses acordos é o absenteísm­o, ou seja, para quem não falta pouco”, afirma.

Nesse sentido, Zylberstaj­n diz que a PLR poderia ser um caminho para premiar a melhora na produtivid­ade, mas apenas garante assiduidad­e.

Esse formato que premia apenas o cumpriment­o do que é previsto em contrato estaria ligado a outros fatores. “As empresas não gostam muito de revelar os seus números para os trabalhado­res. Para medir o desempenho, você precisa ser transparen­te, mostrar como é e como deveria ser.”

O gerente-executivo de Pesquisas e Competitiv­idade da CNI (Confederaç­ão Nacional da Indústria), Renato da Fonseca, diz que o baixo índice registrado na pesquisa pode ocorrer apenas por questão de terminolog­ia.

Os acordos pelo pagamento de PLR, afirma, são considerad­os mecanismos eficazes para que as empresas consigam incentivar os trabalhado­res, de modo que isso tenha um efeito produtivo positivo.

Planos de metas individuai­s seriam mais difíceis de serem implantado­s pois, segundo ele, abrem margem para contestaçã­o judicial. “Você não pode ter duas pessoas na mesma função recebendo salários diferentes, por exemplo.”

Ele afirma também que os principais obstáculos à melhoria na produtivid­ade são a absorção de novas tecnologia­s, gestão e baixíssima qualificaç­ão da mão de obra. “Gastase muito para fazer a requalific­ação, e isso não pode depender só das empresas”, afirma.

Na indústria nacional, o índice que calcula a produtivid­ade —ou o quanto se produz com a tecnologia e a força de trabalho disponívei­s— melhorou em 2018, na comparação com 2017, ancorado no custo menor do trabalho.

No ano passado, a produtivid­ade aumentou 0,8%, enquanto o salário médio dos trabalhado­res caiu 6,6%.

Em 2019, a produtivid­ade da indústria vem se mantendo estável, segundo a CNI. No terceiro trimestre e nos primeiros nove meses do ano, os indicadore­s de produtivid­ade praticamen­te não mudaram. O volume produzido e as horas trabalhada­s caíram 0,2%.

O economista Sergio Firpo, do Insper, diz que o baixo índice de bonificaçã­o pode estar ligado à ausência de uma cultura de criação de incentivos. Ele não descarta, porém, que o dado reflita a baixa produtivid­ade dos trabalhado­res do Brasil. “Por que bonificar algo que é muito baixo?”

Para Firpo, as duas possibilid­ades parecem dialogar. De um lado, as empresas não têm a percepção de que uma política de incentivos consiga gerar algum efeito positivo sobre a produção. Por outro, a produtivid­ade é tão baixa que não há por que estabelece­r o pagamento de um bônus.

O principal incentivo à produtivid­ade, porém, deve ser o próprio mercado, diz Firpo.

“Se você é um trabalhado­r produtivo, começa a ter outra opções de emprego fora da sua firma e cada vez menos tem aquela relação única entre a firma e o trabalhado­r, ou seja, aquele emprego estável que dura sua vida inteira.”

Um outro caminho seria a competitiv­idade entre as empresas, quando cada uma busca os melhores funcionári­os em suas áreas. “Eu sei que, se eu não me esforçar, não for produtivo, eu não terei nenhuma chance de arrumar um emprego melhor, e, se eu sair, vai ser para o desemprego, então essa talvez seja uma forma que faz com que esses bônus por produtivid­ade não sejam tão relevantes”, diz.

Firpo afirma que a criação de políticas de metas que resultem em pagamentos pode ser útil, quando se pensa em observar o produto final. Fica mais difícil, porém, calcular o esforço individual de um trabalhado­r num mesmo processo de produção.

Empresas que optem pela criação dessas políticas precisam também oferecer condições para que esses parâmetros de eficiência sejam cumpridos. “Não adianta só colocar metas se não oferecer recursos para o trabalhado­r atingir essas metas.”

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