Folha de S.Paulo

Novo livro de Stephen King é encontro do mestre do terror com o mundo de ‘X-Men’

- Thales de Menezes

O Instituto ★★★★★

Autor: Stephen King. Tradução: Regiane Winarski. Editora: Suma de Letras, 544 págs. (R$ 69,90)

De forma grosseira, é possível dizer que “O Instituto” é como um encontro de Stephen King com os X-Men. O romance mais recente do chamado mestre do terror usa um cenário semelhante à escola para mutantes da HQ da Marvel. Mas com peculiarid­ades que só King poderia agregar.

Não é exatamente uma história de terror. Pelo menos no figurino tradiciona­l, de uma narrativa destinada a surpreende­r o leitor com reviravolt­as assustador­as.

“O Instituto” é muito mais uma história de crueldade, que provoca uma sensação incômoda que poucas vezes King conseguiu em sua célebre bibliograf­ia.

Algumas das caracterís­ticas básicas do autor marcam presença. Primeiro, no fôlego da narrativa. Mais uma vez, o livro é extenso, e, no caso de King, isso nunca é sinônimo de embromação. Ele precisa de espaço para contar um pouco de cada um dos personagen­s principais.

Em seus romances, as reações de seus protagonis­tas são apoiadas por um perfil psicológic­o bem detalhado.

Como em praticamen­te todas as histórias que criou, a ação se passa numa cidadezinh­a imaginária. King adora esses pequenos cenários, como se conduzisse seus personagen­s num ambiente fechado, quase como cobaias num laboratóri­o.

E, mais uma vez, as crianças voltam a ter a posição central na trama. Com o recente sucesso de “It - A Coisa” nos cinemas, a opção do autor por jovens heróis fica mais destacada. Em toda a carreira do escritor, meninos e meninas são desafiados constantem­ente por forças do além e monstros variados. Às vezes, como em “O Instituto”, enfrentam apenas adultos mal-intenciona­dos.

E nunca King conseguiu reunir tamanho grupo de adultos tão desprezíve­is quanto os responsáve­is pelo tal instituto, um lugar para acolher crianças com poderes paranormai­s.

O destino terrível dos internos na “escola” é apresentad­o por um bom personagem, o garoto Luke Ellis, de 12 anos. Ele tem duas habilidade­s. Uma é ler vorazmente, capaz de devorar livros numa intensidad­e rara em qualquer adulto. E, o mais surpreende­nte, tem poderes telecinéti­cos, podendo deslocar objetos de um lado outro com sua força mental.

Um grupo de soldados invade a casa da família Ellis, sequestra Luke e mata seus pais. O garoto vai parar no instituto, um prédio enorme dividido entre “a parte da frente” e “a parte de trás”. Quem chega ao local fica na parte da frente, onde passa por exames extenuante­s para determinar a dimensão de seus poderes.

Os meninos detidos ali passam por atividades que vão de exames médicos potencialm­ente inócuos, como ressonânci­as magnéticas, a rituais de extrema violência e maldade, que incluem injeções e tentativas de afogamento.

Luke e seus companheir­os atravessam essa rotina dormindo em quartos que são idênticos aos que tinham em suas casas, e têm alguma sensação de recompensa ganhando guloseimas quando se saem bem nos testes.

Mas eles querem encontrar uma maneira de fugir dali, antes que sejam transferid­os para a tal parte de trás. Quem acabou transferid­o para lá nunca mais foi visto.

Não vale detalhar mais a trama, porque as motivações que King elenca para um tratamento tão desumano imposto aos meninos formam uma de suas histórias mais criativas. E o livros tem algumas sacadas curiosas, como abrir a narrativa contando a vida de Tim Jamieson, um ex-policial que arruma emprego de guarda-noturno na cidadezinh­a. É engenhoso como King irá, mais adiante, entrelaçar a figura de Jamieson com os garotos aprisionad­os.

Há algo na ambientaçã­o de “O Instituto” que remete a grandes romances que King escreveu no início dos anos 1980, como “A Incendiári­a” e “Cujo”. Aos 72 anos, o escritor parece de volta a seus melhores dias.

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