Folha de S.Paulo

Candidatur­as cidadãs para democratiz­ar a política

Modalidade amplia diversidad­e e oxigena sistema

- Caio Tendolini e Áurea Carolina Integrante do grupo Bancada Ativista; deputada federal (PSOL-MG) e integrante do movimento Muitas

No início deste mês, o Supremo Tribunal Federal realizou uma audiência pública para discutir candidatur­as cidadãs ou avulsas nas eleições, que permitiria­m a cidadãos não filiados a partidos políticos se candidatar­em. Esse mecanismo já existe em 91% dos países democrátic­os no mundo, segundo a ACE Electoral Knowledge Network, rede especializ­ada em processos eleitorais.

Quando candidatur­as cidadãs são debatidas, três críticas normalment­e surgem: que fragilizar­iam partidos políticos; abririam espaço para celebridad­es e milionário­s; e complicari­am a governabil­idade do país. Contudo, esses problemas já são reais no Brasil. Partidos já são as instituiçõ­es nas quais a população menos confia; aventureir­os já conseguem se eleger e se reeleger; e dificuldad­es na governabil­idade são um desafio intrínseco da nossa alta fragmentaç­ão partidária. Precisamos olhar com atenção para esses problemas, mas não são as candidatur­as cidadãs que irão criá-los ou mesmo agravá-los.

Por isso, é importante avançar o debate para entender o que candidatur­as cidadãs aportam efetivamen­te para melhorar a democracia: elas reduzem barreiras de entrada para a política, permitindo que novas formas de organizaçã­o e novos atores disputem eleições de forma competitiv­a, oxigenando o sistema político.

Isso fica evidente quando analisamos a atuação dos chamados movimentos de renovação política, que se organizam por fora dos partidos e poderiam utilizar candidatur­as cidadãs em pleitos futuros. Em 2018, movimentos de diversos perfis apoiaram centenas de candidatos por todo o país, elegendo representa­ntes para o Congresso Nacional e Assembleia­s Legislativ­as.

O apoio desses movimentos foi decisivo para a eleição de mais mulheres, negros, indígenas, periférico­s, LGBTs e representa­ntes de grupos que historicam­ente enfrentam grande dificuldad­e para se verem representa­dos na política. Além disso, parte desses movimentos vem desenvolve­ndo formas bem-sucedidas de fazer campanhas eleitorais para quem não tem milhões de reais, mostrando que é possível construir eleições mais baratas e que elejam representa­ntes efetivamen­te mais diversos.

Candidatur­as cidadãs permitiria­m fortalecer essas e outras iniciativa­s, mas também seria necessário regulament­á-las adequadame­nte.

É isso que a sociedade e as instituiçõ­es brasileira­s deveriam estar discutindo. É fundamenta­l que haja critérios de coletivida­de na construção dessas candidatur­as, para fortalecer a sua legitimida­de e o seu caráter democrátic­o.

Um modelo potente é o de candidatur­as cidadãs com listas cívicas, onde diversos candidatos independen­tes podem se juntar e somar votos para se elegerem. Uma proposta neste sentido é apresentad­a na PEC 350/2017, em tramitação na Câmara dos Deputados.

Complement­ando os partidos políticos, candidatur­as cidadãs podem fortalecer a democracia, reduzindo as barreiras para a renovação política e abrindo caminho para que segmentos com baixa presença nos espaços de poder consigam participar da política brasileira.

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Cesar Jabert Paciornik

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