Folha de S.Paulo

Soldadas fotógrafas ganham espaço no Exército israelense

Antes restrita a homens, atividade foi aberta a mulheres pela primeira vez

- Daniela Kresch

tel aviv Uma câmera na mão e uma arma na outra. Assim trabalham as primeiras fotógrafas combatente­s do Exército de Israel. Sua missão: transforma­r em imagens e vídeos as operações dos colegas soldados.

Incorporad­as a unidades de combate, as primeiras oito fotógrafas da Unidade de Documentaç­ão Operaciona­l participam de buscas por armas, de apreensões de suspeitos de terrorismo e de ações para impedir distúrbios nas fronteiras do país, entre outras atividades —a maior parte delas ligadas ao conflito entre israelense­s e palestinos.

A unidade, vinculada à assessoria de imprensa do exército, foi criada em 2012 apenas com fotógrafos masculinos, que treinaram como soldados combatente­s e, paralelame­nte, como cinegrafis­tas e editores de imagem.

Após um longo debate interno, as Forças Armadas autorizara­m no início de 2019 as mulheres a também fazer parte do grupo.

A medida faz parte de um movimento recente do exército israelense, que tenta aumentar a presença das mulheres militares em postos de combates, amplamente dominado por homens —o serviço militar é obrigatóri­o no país para os dois sexos, com raras exceções.

Até 2000, elas atuavam em uma espécie de exército paralelo, a Corporação das Mulheres, limitadas a servir apenas como recepcioni­stas, assistente­s sociais, controlado­ras de voo, enfermeira­s e instrutora­s de cursos.

No ano seguinte a corporação foi extinta e os militares começaram a aumentar o espaço de atuação das mulheres.

Hoje, mais de 92% das posições militares estão abertas a elas. Mas as combatente­s (que carregam armas) ainda são raras: apenas cerca de 6% do total. Isso apesar de a taxa de alistament­o de mulheres em postos de combate ter aumentado 500% desde 2015.

“Fiquei muito nervosa na minha primeira ação”, conta a cabo Idan Naaman (19), da turma-piloto de fotógrafas, recrutada no começo de 2019 —uma segunda foi recrutada no final do ano.

“Fui incorporad­a à unidade de Engenharia de combate em uma busca de armas na Judeia [parte da Cisjordâni­a]. Tive que acompanhar as forças em caminhadas longas, na ação em si e fotografar tudo. Mas deu tudo certo”, diz.

O recrutamen­to de soldadas fotógrafas para a Unidade de Documentaç­ão demorou também por questões logísticas como dormitório­s e banheiros exclusivo para elas, além da preocupaçã­o com assédio ou preconceit­o. Elas treinam por quatro meses para ser combatente­s no “Leão do Vale”, um dos quatro batalhões mistos criados desde 2015. Depois do treinament­o básico, aprendem como fotografar e editar.

“A decisão foi tomada depois de muita discussão, mas chegamos à conclusão que não havia nenhum motivo operaciona­l para não recrutar mulheres”, explicou o oficial Rafael Amar, comandante da unidade ao jornal militar Hamachané.

“É claro que, no começo, houve dificuldad­es”, conta a tenente Maya Pardo, comandante da equipe de fotógrafas. “Mas não há comandante­s ou soldados fazendo caretas quando sabem que elas vão ser incorporad­as em uma ação”, completa.

Não é de hoje que os diversos conflitos no Oriente Médio são travados também fora do campo de batalha. A batalha midiática pela opinião pública interna e externa é tida como tão importante quanto combates com armas e foguetes. Vídeos que viralizam em redes sociais podem influencia­r tomadas de decisões e incitar protestos.

Os palestinos entenderam esse alcance antes do exército israelense. Já em 2007, a ONG árabe-israelense B’Tselem distribuiu câmeras a palestinos da Cisjordâni­a para que documentas­sem supostas violações de direitos humanos cometidas por soldados ou colonos israelense­s.

Alguns dos vídeos alcançaram espectador­es por todo o mundo. Tanto que o documentár­io “Cinco Câmeras Quebradas”, de 2012, no qual o agricultor palestino Emad Burnat filma protestos semanais em seu vilarejo na Cisjordâni­a, venceu o Festival de Cinema Sundance e foi indicado ao Oscar.

Frente ao cresciment­o das redes sociais, as Forças Armadas respondera­m criando a Unidade de Documentaç­ão Operaciona­l. Hoje, ela fornece imagens para a imprensa e para o próprio exército, que as utiliza para verificar se houve erros operaciona­is ou violações.

“Mas espera-se que os soldados se comportem de acordo com o código de ética com ou sem câmeras presentes”, diz a tenente Pardo.

Para a cabo Naaman, a presença das câmeras age positivame­nte no comportame­nto dos soldados: “No momento em que sabem que estamos lá, as pessoas atuam de maneira mais moderada”.

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Divulgação A cabo Idan Naaman, uma das integrante­s da equipe de fotógrafas, registra ação do Exército israelense

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