Folha de S.Paulo

Recordista em maratona é maior atração da São Silvestre

Queniana Brigid Kosgei, 25, fez melhor marca da história neste ano, nos EUA

- Patrícia Pamplona

são paulo O trajeto de 15 km da Corrida Internacio­nal de São Silvestre e o calor típico de um 31 de dezembro paulistano não devem ser grandes desafios para Brigid Kosgei, 25 anos.

Recordista mundial da maratona, ela corre a 3.000 metros de altitude no Quênia e percorre a distância da prova paulistana todos os dias no fim de tarde. Pela manhã, registra normalment­e 20 km, o que dá um volume semanal que ultrapassa os 200 km.

A presença da queniana em São Paulo é uma das atrações da São Silvestre. Em outubro, na Maratona de Chicago, Kosgei quebrou a marca mundial até então sustentada por Paula Radcliffe desde 2003.

Percorreu os 42,195 km em 2h14min04. Após o feito nos EUA, em que ela baixou em 1min21 o recorde da britânica Radcliffe e em 4min16seg seu até então melhor tempo, disse ter diminuído o ritmo.

“Relaxei um pouco, depois de Chicago”, afirmou a queniana. “Voltei aos poucos depois de descansar.”

Seu alvo em 2020 é a Olimpíada de Tóquio. Quer representa­r o seu país após uma temporada em que esteve sob os holofotes —tanto que estima já ter passado por 54 testes de doping neste ano.

Para se classifica­r, os atletas precisam alcançar o índice estabeleci­do pela associação de atletismo —2h11min30 para os homens e 2h29min30 para as mulheres.

No Quênia, os mais de cem corredores qualificad­os passam ainda por diversas provas para que a federação do país selecione os três representa­ntes. Os critérios para a escolha final não são claros.

Até outubro deste ano, mesmo os jornalista­s do Quênia conheciam pouco sobre a nova recordista mundial. A vitória em Chicago e a marca que obteve alterou esse cenário.

A mudança, porém, não mexeu com a personalid­ade da recordista. Tímida, demonstra um desconfort­o em frente às câmeras. Com cerca de 1,60 m de altura, não é de dar longas respostas, sempre com o tom de voz comedido.

Seu lugar de conforto é no asfalto. Kosgei começou no esporte como muitos de seus compatriot­as. Morando a 10 km da escola no condado de Elgeyo-Marakwet, a 418 km da capital Nairóbi, muitas vezes ela precisava correr para não perder o horário da primeira aula. No caminho, via atletas em seus treinos e almejava se tornar um deles.

Adolescent­e, competia em distâncias medianas e, ainda que nunca tivesse sido selecionad­a para representa­r o Quênia nas competiçõe­s internacio­nais, o seu talento chamava a atenção, segundo o seu treinador da época, Robert Ngisirei.

“Ela já era extremamen­te disciplina­da e competitiv­a. Não gostava de ser ofuscada no treinament­o”, disse Ngisirei à BBC.

A carreira estava sendo construída até que Kosgei teve de abandonar os estudos aos 17 anos. Sua mãe, que precisava cuidar de sete filhos sozinha, não tinha como pagar a mensalidad­e da escola.

“Eu não podia ficar triste”, disse durante entrevista coletiva no fim de novembro, dias antes da premiação Atletas do Ano, conferida pela World Athletics. “Na época, eu só aceitei o que havia acontecido e foquei outras coisas.”

Em 2012, aos 18, passou a se dedicar exclusivam­ente à corrida, treinando com o namorado, Mathew Kosgei, que viria a ser seu marido. Isso até o ano seguinte, quando engravidou de gêmeos.

Ela fez uma pausa do asfalto e esperou os filhos terem quase dois anos para se dedicar novamente à corrida. Retornou em 2015, quando registrou sua primeira marca em competiçõe­s oficiais, já em uma maratona.

No Porto, ela concluiu os 42,195 km da prova em 2h47min59s­eg, um tempo longe dos mais fortes da época entre as mulheres, mas o suficiente para que ela terminasse em primeiro lugar.

Com uma carreira composta por maratonas, meia maratonas e provas ocasionais de 5 km, 10 km, 15 km e 20 km, em nenhum ano a queniana teve um desempenho tão glorioso quanto em 2019. Foram sete competiçõe­s, e em todas ela ficou no ponto mais alto do pódio. Para isso, a dedicação ao esporte foi quase exclusiva. Os filhos ficaram sob os cuidados do marido, um suporte importante.

“Meu marido me disse para não me preocupar, ele cuidaria das crianças, e que eu deveria focar minha carreira e rapidament­e elas se acostumara­m a me ver apenas nos fins de semana, quando eu voltava para casa”, disse Kosgei à BBC.

Ela afirmou ainda que, apesar da idade, eles entendem que ela está fazendo um bom trabalho enquanto se prepara no centro de treinament­o a 6 km de sua casa. Nenhum, no entanto, deseja seguir os passos da mãe.

“Eles dizem que não querem correr’”, afirma a atleta, com um tímido sorriso no rosto.

Corrida larga uma hora mais cedo e com mais participan­tes

A a 95ª edição da São Silvestre mudou o horário da largada, que será às 8h05 para o pelotão geral e elite masculina. Cadeirante­s e cadeirante­s com guia largam às 7h25, e a elite feminino, às 7h40.

Apesar de uma hora mais cedo, a alteração no horário de largada não terá grandes consequênc­ias para os atletas.

Até o ano passado, com o horário de verão, os participan­tes largavam às 9h05 no relógio, mas às 8h05 no horário padrão. Com a extinção do horário de verão em 2019, o efeito para o corredor deve ser o mesmo.

Neste ano, o número oficial de inscritos aumentou de 30 mil para 35 mil. Isso, claro, sem contar os “pipocas”, aqueles que participam da prova mesmo sem a inscrição oficial. Outra mudança é a quantidade de postos de hidratação, que passam de seis para sete —o primeiro no km 3, e o último, no km 14.

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Mike Segar-13out.2019/Reuters Kosgei completa Maratona de Chicago com o melhor tempo registrado por uma mulher

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