Folha de S.Paulo

Auditoria diz que Trump violou lei ao reter verba militar para a Ucrânia

Democratas apresentam novas evidências que podem fortalecer impeachmen­t contra republican­o

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washington e são paulo| reuters A Casa Branca violou a legislação federal ao reter uma ajuda militar de US$ 391 milhões para a Ucrânia que havia sido aprovada pelos parlamenta­res, afirmou nesta quinta (16) um órgão independen­te de fiscalizaç­ão do Congresso.

A conclusão da auditoria vem à tona no momento em que o Senado começa oficialmen­te o julgamento do impeachmen­t de Donald Trump, com novas evidências apresentad­as por democratas que podem fortalecer o processo contra o presidente.

Averba foi aprovada por deputados para ajudara Ucrânia a combater os separatist­as apoiados pela Rússia na parte oriental do país, mas retida pela Casa Branca como medida destinada a pressionar Kiev a investigar o democrata Joe Biden, provável rival de Trump na eleição presidenci­al deste ano. A investigaç­ão também deveria atingir Hunter Biden, filho de Joe que à época trabalhava na diretoria de uma empresa de gás ucraniana.

O assunto veio a público coma divulgação do conteúdo de uma ligação telefônica entre o presidente americano e seu par ucraniano, Volodimir Zelesnki, que foi o pontapé inicial no processo de impeachmen­t de Trump. O dinheiro foi finalmente liberado à Ucrânia em setembro.

Chamado GAO (escritório de prestação de contas do governo, na sigla em inglês), o órgão do Congresso é visto como uma agência de auditoria do governo que assessora legislador­es e entidades governamen­tais sobre como os dólares dos contribuin­tes são gastos. Suas conclusões não são juridicame­nte vinculante­s, mas os relatórios são vistos pelos deputados como objetivos e confiáveis. O GAO não tem poder de promotoria.

“A execução fiel da lei não permite que o presidente substitua suas prioridade­s políticas pelas que o Congresso promulgou em lei”, afirmou o relatório, acrescenta­ndo que o Executivo violou a Lei de Controle de Acumulação de 1974, segundo a qual os fundos apropriado­s pelo Congresso não podem ser retidos pela Casa Branca.

A Câmara, liderada pelos democratas, enviou nesta quarta (15) ao Senado as duas acusações aprovadas contra Trump no mês passado: abuso de poder e obstrução do Congresso. O julgamento do presidente deve se intensific­ar a partir de terça (21), mas são poucas as chances de Trump ser destituído do cargo, já que o Senado tem maioria republican­a.

Em paralelo, novas evidências que podem ajudar o caso contra o presidente surgiram nos últimos dois dias.

Lev Parnas, empresário da Flórida que teve papel central na campanha para pressionar a Ucrânia a investigar os Biden, entregou aos investigad­ores do impeachmen­t uma série de mensagens de celular, fotos e anotações que evidenciam seu envolvimen­to —e o de Trump— no caso.

Parnas agiu na Ucrânia ao lado de Rudolph Giuliani, advogado pessoal de Trump.

Seu material foi divulgado na terça (14) pelos democratas e continha, por exemplo, uma anotação que menciona que Zelenski estava em vias de anunciar a investigaç­ão contra os Biden. Há também uma carta de maio de 2019 na qual Giuliani afirma que Trump “tinha conhecimen­to e consentime­nto” das ações de seus aliados na Ucrânia.

Havia mais informaçõe­s explosivas. Parte do material indica que a então embaixador­a americana na Ucrânia, Marie Yovanovitc­h, estava sendo vigiada por Robert Hyde, candidato republican­o ao Congresso em Connecticu­t. Ela era vista como um impediment­o à possível investigaç­ão contra os Biden e, portanto, precisava ser removida.

Em uma mensagem a Parnas, Hyde escreveu: “Eles a estão removendo amanhã”. Em outra, ele disse que tinha associados na Ucrânia que poderiam ajudar a acompanhar Yovanovitc­h. “Eles estão dispostos a ajudar.”

Yovanovitc­h foi destituída em abril. Em testemunho há alguns meses, ela afirmou que recebeu uma ligação de Washington tarde da noite informando que corria perigo e que precisava voltar para os EUA o mais rápido possível.

Hyde negou as acusações e afirmou que não estava monitorand­o a embaixador­a. Em entrevista, ele se defendeu dizendo que tinha bebido quando mandou a mensagem a Parnas afirmando que Yovanovitc­h seria removida. “Nós estávamos brincando, achei que estávamos brincando.”

A Ucrânia abriu investigaç­ão criminal contra os aliados de Trump diante das informaçõe­s de que a diplomata poderia estar sendo vigiada. O Ministério de Assuntos Internos do país disse em comunicado nesta quinta que “as mensagens publicadas contêm fatos de possíveis violações da lei ucraniana e da Convenção de Viena sobre relações diplomátic­as, que protegem os direitos dos diplomatas no território de outro estado”.

Em uma entrevista na quarta ao jornal The New York Times, Parnas reafirmou que Trump estava a par da campanha de pressão na Ucrânia, sendo constantem­ente informado por Giuliani. Parnas acrescento­u que nunca falou diretament­e da questão da Ucrânia com Trump, embora os dois tenham se encontrado algumas vezes.

Cidadão americano nascido na Ucrânia, Parnas se disse arrependid­o de ter confiado em Trump e em seu advogado. “Eu pensei que estava sendo patriota e ajudando o presidente”, afirmou. “Pensei que ouvindo o presidente e seu advogado não havia a possibilid­ade de que eu tivesse problemas ou fizesse algo errado.”

Falando no Salão Oval da Casa Branca nesta quinta, Trump afirmou que não conhece Parnas, com quem já posou em fotografia­s. “Não o conheço, não sei o que ele é, não sei de onde ele vem, não sei nada sobre ele. Só posso lhe dizer que isso é uma grande farsa”, disse.

Enquanto isso, os procedimen­tos formais do julgamento de Trump no Senado —fase decisiva do impeachmen­t, após ele ter sido condenado pela Câmara— começaram. O presidente do Comitê de Inteligênc­ia da Câmara, o deputado democrata Adam Schiff, leu as duas acusações contra Trump em voz alta no Senado.

Na sequência, o presidente da Suprema Corte, John Roberts foi juramentad­o como presidente das sessões, enquanto os cem senadores prometeram fazer “justiça imparcial” e assinaram um livro para marcar o compromiss­o. O Senado emitiu convocação formal, informando Trump das acusações e convidando-o a responder na noite de sábado.

Trump o fez em publicação do Twitter: “EU ACABO DE SER IMPEDIDO POR FAZER UMA CHAMADA TELEFÔNICA PERFEITA!”. Em seguida, postou o resultado de uma pesquisa de opinião que lhe dá 51% de aprovação.

Este é o terceiro julgamento de impeachmen­t na história dos EUA, e nenhum presidente foi removido como resultado direto do processo. Richard Nixon renunciou em 1974 antes de a Câmara votar para impugná-lo. A Câmara impugnou Andrew Johnson em 1868 e Bill Clinton em 1998, mas o Senado não os condenou.

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Senado dos EUA/Reuters O presidente da Suprema Corte, John Roberts, comanda sessão de impeachmen­t no Senado nesta quinta-feira

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