Folha de S.Paulo

Trabalhado­r enfrenta labirinto em postos do INSS por atendiment­o

Burocracia e falta de informação nas agências da Previdênci­a atrapalham beneficiár­ios mesmo na era do atendiment­o digital

- Camilla Feltrin

são paulo | agora Diferente do que acontecia no extinto INPS (Instituto Nacional de Previdênci­a Social do Brasil), a fila de pessoas à procura de atendiment­o no INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) não dobra esquinas.

Mas as agências ainda têm muitos segurados que sofrem para conseguir orientaçõe­s adequadas para solucionar seus problemas. A reportagem foi a cinco postos do INSS ao longo da semana e encontrou segurados que demoram até mesmo anos para entender o que devem fazer para, por exemplo, obter documentos expedidos pelo órgão.

Infartado e recém saído do hospital, onde passou por procedimen­to de cateterism­o e ganhou um stent no coração, o mecânico Paulo Sérgio Venturelli, 48 anos, teve que ir pessoalmen­te três vezes a uma agência do INSS até conseguir agendar uma perícia médica.

“Liguei no 135 e não deu certo, então tive que vir aqui. Das outras vezes me falaram que era problema no sistema, que não estava funcionand­o”, disse, enquanto aguardava na agência de Itaquera (zona leste da capital paulista).

O atendiment­o telefônico via 135 é gratuito apenas para ligações feitas de telefones fixos. Quem liga de celular tem que pagar o custo de uma chamada local, e isso acaba restringin­do o acesso da população mais carente.

A plataforma Meu INSS (meu.inss.gov.br) oferece uma série de serviços que podem ser feitos de forma remota. O site, no entanto, pode ser um obstáculo para quem não tem familiarid­ade com a internet.

A dona de casa Rosemeire Gabarron, 63, tenta há dois meses tirar uma carta de concessão de benefício em nome do pai, morto em 2015, e está peregrinan­do por agências. O documento, conta, é exigência para a família sacar o que restou na conta dele.

“Os atendentes informam que tenho que fazer o procedimen­to pelo site. Quando tento, não dá porque o número do benefício tem algarismos a menos que o solicitado. Não sei mais o que fazer”, afirma.

Mesmo quem sabe usar a internet ou o aplicativo do INSS não escapa do labirinto de atendiment­o dentro das agências, acumulando idas e vindas ao órgão.

O professor Josué Teixeira, 58, tenta uma correção de sua CTC (Certidão de Tempo de Contribuiç­ão) desde 2017 na agência da rua Xavier de Toledo (região central de SP).

“Já perdi as contas de quantas vezes vim aqui. Da última, disseram que não seria possível o documento pois o único funcionári­o que sabia fazer isso estava de férias”, diz.

A última ida dele à agência deu certo. “Fiz o pedido e vou acompanhar a conclusão pelo Meu INSS.”

A fila oficial do INSS tem quase 2 milhões de pedidos de benefícios, dos quais 1,3 milhão aguardam há mais de 45 dias por uma resposta.

Entre elas está Angélica da Rocha Pinheiro, 35. A autônoma foi diagnostic­ada com embolia pulmonar, trombose na perna esquerda, apneia gravíssima e obesidade mórbida e tenta, há oito meses, receber o BPC (Benefício de Prestação Continuada). Ela foi chamada pela primeira vez a comparecer na agência de São Bernardo (ABC) na terça-feira (14).

“Minha mãe tem me ajudado nas burocracia­s, mas pelo jeito vou ter que voltar aqui mais vezes porque me pediram até a nota fiscal da inalação que faço”, diz ela, que anda carregando um carrinho com cilindro de oxigênio para respirar.

O motorista Bernardo de Azevedo Barbosa, 61, pediu a aposentado­ria em fevereiro de 2019. “Não imaginei que pudesse demorar tanto”, diz ele, que pretende se dedicar a um serviço “mais leve” do que dirigir ônibus quando for, de fato, um aposentado.

Diante da demora, especialis­tas em direito previdenci­ário têm apostado em mandados de segurança. “A partir de seis meses de espera já é o caso de entrar com um mandado de segurança para conclusão do processo”, diz a advogada Adriane Bramante.

O INSS informou que, desde junho de 2019, 90 dos 96 serviços passaram a ser requeridos de forma digital e que benefícios e serviços devem ser solicitado­s pela internet, pelo aplicativo e pelo 135. Desde então, afirma, as agências atuam majoritari­amente na recepção de documentos complement­ares dos segurados, em realização de perícias médicas e na prestação de informaçõe­s.

 ?? Martha Salomão e Rivaldo Gomes/ Folhapress ?? O motorista Bernardo de Azevedo Barbosa, 61 (acima), que pediu a aposentado­ria em fevereiro de 2019, e a autônoma Angélica Rocha Pinheiro, 35, que há oito meses tenta o BPC
Martha Salomão e Rivaldo Gomes/ Folhapress O motorista Bernardo de Azevedo Barbosa, 61 (acima), que pediu a aposentado­ria em fevereiro de 2019, e a autônoma Angélica Rocha Pinheiro, 35, que há oito meses tenta o BPC
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