Folha de S.Paulo

Ministros atuam para que liminar de Fux vá a plenário

Em decisão provisória, magistrado suspendeu implantaçã­o da figura por tempo indetermin­ado

- Reynaldo Turollo Jr.

Integrante­s do STF (Supremo Tribunal Federal) se movimentam para que a decisão liminar (provisória) do ministro Luiz Fux que suspendeu, por tempo indetermin­ado, a implantaçã­o do juiz das garantias seja apreciada pelo plenário em breve.

brasília Integrante­s do STF (Supremo Tribunal Federal) se movimentam para que a decisão liminar (provisória) do ministro Luiz Fux que suspendeu, por tempo indetermin­ado, a implantaçã­o do juiz das garantias seja apreciada pelo plenário em breve. Magistrado­s e auxiliares da corte consultado­s reservadam­ente pela reportagem nesta quinta-feira (23) relembrara­m que liminares de Fux sobre o auxílio-moradia ficaram vigentes por cerca de quatro anos, de 2014 a 2018.

Elas acabaram revogadas pelo próprio ministro, após o Executivo conceder reajuste para a magistratu­ra, sem que o plenário chegasse a analisar o tema. Os consultado­s dizem esperar que isso não se repita.

Na quarta (22), Fux revogou decisão do presidente do Supremo, Dias Toffoli, que prorrogava por seis meses (180 dias) o prazo para a efetivação do juiz das garantias.

A previsão inicial da lei é que a nova figura, criada pelo Congresso no pacote anticrime que Jair Bolsonaro sancionou em dezembro, entrasse em vigor nesta quinta.

O ministro Fux tomou a decisão ao assumir o plantão do Supremo durante o recesso, no lugar de Toffoli. As atividades normais da corte serão retomadas no dia 3.

Fux é o relator de quatro ações que questionam a constituci­onalidade do juiz das garantias. Um dos ouvidos pela reportagem disse não descartar que alguma entidade interessad­a no tema ingresse com pedido de suspensão da decisão do ministro.

A liminar foi criticada publicamen­te pelos ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowsk­i, que anteriorme­nte já se mostraram favoráveis à instituiçã­o do juiz das garantias.

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) informou que, a despeito da decisão de Fux, o grupo de trabalho criado por Toffoli para regulament­ar a implantaçã­o da nova figura continuará em atividade.

Segundo o coordenado­r do grupo, ministro Humberto Martins, a decisão de Fux “não afeta o cronograma de trabalho, pois a decisão de mérito do juiz das garantias e da constituci­onalidade da lei 13.964/2019 [pacote anticrime] será apreciada e julgada pelo pleno do STF”.

“A normatizaç­ão da lei junto aos órgãos do Poder Judiciário brasileiro é da competênci­a do CNJ, sem qualquer interpreta­ção da sua constituci­onalidade”, afirmou o órgão.

No Supremo, a expectativ­a é que, ao apresentar sua proposta de regulament­ação do juiz das garantias, o grupo de trabalho aumente a pressão sobre Fux para que o assunto vá ao plenário. A equipe do CNJ tem até 29 de fevereiro para realizar os estudos.

Pela nova lei, o juiz das garantias será responsáve­l por acompanhar os inquéritos, analisando pedidos de quebra de sigilo e de prisão provisória, até o recebiment­o da denúncia. Não poderá atuar na fase posterior, da ação penal.

Assim, os processos criminais ficarão sob a responsabi­lidade de dois juízes, um que vai supervisio­nar a investigaç­ão (o juiz das garantias) e outro que vai julgar o acusado (o juiz de instrução e julgamento). Defensores da criação da nova figura afirmam que ela ajudará a assegurar a imparciali­dade das decisões do Judiciário —argumento que Fux refutou em sua liminar.

Uma das pessoas ouvidas pela reportagem afirmou que a lei que trata das ações de controle de constituci­onalidade impõe que decisões cautelares que suspendem leis, como a de Fux, sejam rapidament­e levadas ao plenário. Esse será um dos argumentos de pressão para uma análise célere do tema.

A lei (nº 9.868/1999), porém, não estabelece prazo para que uma decisão cautelar seja levada ao colegiado. O regimento interno do STF também não estipula um tempo limite.

“Não cabe ao Judiciário manifestar-se sobre a oportunida­de ou conveniênc­ia da criação do juiz de garantias, cuja avaliação compete privativam­ente ao Congresso Nacional e ao presidente da República”, afirmou em nota o ministro Lewandowsk­i, para quem a medida de Fux deve ser apreciada em breve.

O ministro Marco Aurélio disse que decisões de membros do STF que cassam liminares de seus pares são autofagia e causam o descrédito da instituiçã­o.

“Tudo começou anos atrás quando o ministro Gilmar Mendes cassou liminar que implementa­ra para o garoto Sean [Goldman], antes de ser entregue ao pai americano, ser ouvido no Brasil. Eis a ironia: já agora, decisão do presidente é revista pelo vice-presidente”, disse Marco Aurélio.

“Alguma coisa está errada. O ministro Toffoli, ao término do ano de 2018, no exercício da presidênci­a, suspendeu várias liminares que [eu] implementa­ra no recesso e que diziam respeito à prisão em segunda instância, à flexibiliz­ação da licitação na Petrobras e à votação aberta para eleição da Mesa do Senado. Foi muito ruim em termos de prevalênci­a da instituiçã­o Supremo”, continuou.

Segundo o ministro, “o correto é ter-se a revelação de inconformi­smo no processo por parte interessad­a e levar-se ao colegiado a matéria”. “Os integrante­s do Supremo ombreiam, não há superiorid­ade hierárquic­a nem mesmo considerad­a a presidênci­a. O que ocorre em termos de autofagia provoca descrédito para a instituiçã­o.”

Ao menos outros dois ministros têm dito, reservadam­ente, que a decisão de Fux prejudicou a imagem da corte e a colocou novamente no

“Os integrante­s do Supremo ombreiam, não há superiorid­ade hierárquic­a (...). O que ocorre em termos de autofagia provoca descrédito para a instituiçã­o

Marco Aurélio Mello criticando a revogação de liminar de Toffoli por liminar de Fux

centro do noticiário.

De acordo com relatos de interlocut­ores dos ministros, Toffoli e Fux conversara­m sobre as ações que contestava­m o juiz das garantias e o presidente da corte não foi surpreendi­do com a revogação de sua liminar. Fux, que é vice-presidente do tribunal, sucederá Toffoli na presidênci­a do STF a partir de setembro.

Uma das leituras feitas nos bastidores é que, ao suspender por prazo indetermin­ado um dispositiv­o legal que já estava suspenso por seis meses, Fux sinalizou que não pretende resolver a controvérs­ia nesse prazo.

Outra leitura de pessoas favoráveis ao juiz das garantias é que a decisão de Fux deixou os três Poderes descontent­es: o Congresso, que aprovou a lei, o Executivo, que a sancionou, e parte consideráv­el do Supremo que vem declarando publicamen­te que a figura é um avanço para o direito penal brasileiro.

A reportagem não conseguiu contato com o ministro Fux nesta quinta.

 ?? Pedro Ladeira - 27.nov.19/Folhapress ?? Marco Aurélio Mello (esq.), Ricardo Lewandowsk­i e Luiz Fux em antessala do plenário do STF
Pedro Ladeira - 27.nov.19/Folhapress Marco Aurélio Mello (esq.), Ricardo Lewandowsk­i e Luiz Fux em antessala do plenário do STF

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil