Folha de S.Paulo

Evangélico­s enxergam espaços para ampliar representa­ção no Congresso

- Anna Virginia Balloussie­r

rio de janeiro Força ela já tem. A bancada evangélica começa 2020 como um dos aliados mais prestigiad­os pelo presidente Jair Bolsonaro.

Quanto a seu tamanho, bom, existe até a brincadeir­a interna que empresta o mote dos protestos de 2013: amanhã vai ser maior.

Os integrante­s da frente destacam que a dimensão dela pode até parecer agigantada, mas na verdade ela está aquém da proporção de evangélico­s no país. Ou seja, ainda há margem para cresciment­o. E ela não é irrisória.

Evangélico­s são 31% da população, segundo a mais recente pesquisa Datafolha, de dezembro. O último levantamen­to do bloco congressis­ta computou 107 dos 513 (21%) dos deputados federais —o número flutua, pois depende, por exemplo, de suplentes que entram e saem dos cargos ao longo da legislatur­a. No Senado, são 15 dos 81 (18,5%) ocupantes.

Para fechar essa conta, não se leva em conta necessaria­mente o número total de signatário­s da bancada, já que muitos deputados incluem seu nome na base da camaradage­m —a formalizaç­ão de uma frente parlamenta­r depende de um mínimo de 171 assinatura­s.

A atual aliança evangélica contou com 195 endossos, nem todos de evangélico­s. Eros Biondini (Pros-MG), por exemplo, apoiou e é um carismátic­o católico. O núcleo duro do bloco, com parlamenta­res realmente atuantes, que costumam frequentar os cultos e as reuniões da bancada, é ainda menor do que os 107 integrante­s contabiliz­ados.

O anglicano Kim Kataguiri (DEM-SP) é uma amostra disso. Seu nome está lá, mas ele diz que não frequenta encontros da turma —só foi em um, para a eleição do líder deles, Silas Câmara (Republican­os-AM).

Isso quer dizer que, na prática, a quina da bancada que provoca barulho de fato é ainda menor do que 21% da Câmara. Daí a expectativ­a interna de expandir ainda mais na eleição de 2022, em dimensão mas também em engajament­o.

“Não tenho dúvida de que vai crescer. Em algum tempo não distante, setores evangélico­s entendiam que participar da política era pecado, o que nos distanciou absurdamen­te da política. Mas isso está mudando”, diz João Campos (Republican­os-GO), que presidiu a frente duas vezes (2010-12 e 2015-16).

O partido de Campos é tido como costela partidária da Igreja Universal do Poder de Deus. Seu líder, o bispo Edir Macedo, defendeu em “Plano de Poder” (2008) a necessidad­e de evangélico­s se empenharem mais na vida política.

“Maquiavel definiu [a política] como ‘a arte de governar e estabelece­r o poder’ (‘O Príncipe’). Sendo assim, do ponto de vista de Deus, com quem você acha que Ele desejaria que estivesse esse poder e domínio? Nas mãos de Seu povo ou não?”, escreveu.

E pelas mãos dos evangélico­s veio “a possibilid­ade de glorificar a Deus no palácio presidenci­al”, disse no 18 de dezembro o chanceler Ernesto Araújo, católico como o presidente. Ele lembrava de um culto da véspera realizado no Planalto, com Bolsonaro e a primeira-dama Michelle orando ao lado de Cristiane e Renato Cardoso, filha e genro de Edir Macedo.

Ministro e presidente foram no dia seguinte à primeira conferênci­a nacional da bancada evangélica, em Brasília.

Sergio Moro (Justiça) também discursou no dia, assim como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

“Pela primeira vez terminamos o ano despreocup­ados”, afirmou o presidente do bloco. Para Silas Câmara, é verdade que a agenda conservado­ra não caminhou muito no primeiro ano de mandato de Bolsonaro.

Mas tudo bem, porque agora ao menos ela não estaria sob ameaça constante, como nos anos petistas. “Nem ouso falar sobre pauta de costumes. Sabe por quê? Não precisa.”

Há uma década, a moral dos evangélico­s com os principais líderes políticos do país era bem mais baixa. Não há um histórico preciso da gênese do bloco. Em 1994, contudo, uma reportagem da Folha já relatava o apetite por mais espaço.

Na época, evangélico­s eleitos eram 4% da Câmara (21 deputados). Só há uma remanescen­te daqueles tempos: Benedita da Silva (PT-RJ), trincheira esquerdist­a no grupo.

De lá pra cá, os temas de interesse não variaram tanto assim (aborto, direitos LGBT+, drogas), tampouco a adesão à máxima “cristão vota em cristão”.

O que variou, e muito, é a proximidad­e com o Planalto. “A cada pleito, igrejas funcionam como comitês de campanha, lançam candidatos oficiais, enquanto pastores atuam como cabos eleitorais ou se candidatam, e dirigentes denominaci­onais efetuam alianças e barganham apoio com candidatos a cargos majoritári­os”, diz o professor de sociologia da USP Ricardo Mariano.

“Além disso, comandam partidos e bancadas parlamenta­res. Isso torna o ativismo político evangélico, especialme­nte o conservado­r, um dado incontorná­vel da democracia brasileira.”

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Mateus Bonomi - 18.dez.2019/Folhapress Deputados e líderes evangélico­s no lançamento da pedra fundamenta­l do Museu da Bíblia

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