Folha de S.Paulo

Estamos prontos para quintuplic­ar acordo com o Mercosul, afirma ministro indiano

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“Brasil e Índia estão se benefician­do de líderes fortes, que não têm medo de usar seu capital político para defender os interesses da nação

déli A Índia está pronta para quintuplic­ar o número de produtos cobertos pelo acordo de preferênci­as tarifárias que tem com o Mercosul.

Segundo Hardeep Singh Puri, um dos mais poderosos ministros do país, que acumula as pastas de Aviação Civil, Planejamen­to Urbano e Comércio, o governo do premiê Narendra Modi está em negociação com o Brasil para aumentar o pacto atual, que compreende 450 produtos com redução de sobretaxa, para atingir de 2.000 a 2.500 itens.

Em setembro, em uma videoconfe­rência, o bloco sulamerica­no informou que apresentar­á uma proposta.

Para o governo Jair Bolsonaro, há três caminhos: todo o Mercosul negocia junto; a Argentina, sob governo de centro-esquerda, sai da negociação; ou o Brasil avança sozinho para concluir o acordo. PCM

O Mercosul e a Índia têm um acordo de preferênci­as tarifárias muito limitado. Há planos para expandir esse acordo? Integrante­s do setor industrial brasileiro afirmam que só aceitariam redução de tarifas se a Índia concordass­e em negociar subsídios.

O acordo de preferênci­as entre Mercosul e Índia entrou em vigor em 2009 e prevê redução de tarifas de 10% a 100% reciprocam­ente para 450 linhas tarifárias.

Por causa do alcance limitado do acordo, Índia e Mercosul não conseguira­m realizar todo o seu potencial de comércio. Desde 2016, os dois lados estão negociando ativamente e já trocaram listas com propostas de reduções de tarifas.

A Índia já manifestou seu desejo de aumentar o número de linhas tarifárias para 2.000 a 2.500. E os dois lados já trocaram uma proposta inicial com cerca de 500 linhas tarifárias.

Não recebemos pedido do Brasil para incluir subsídios agrícolas ou industriai­s.

Modi implemento­u uma série de reformas que agradaram ao setor empresaria­l e conquistou apoio da população com programas como o Habitação para Todos, subsídios para bujão de gás e o projeto de construção de privadas e fossas. Qual é a importânci­a dos programas sociais no governo?

A Índia é uma economia de US$ 2,8 trilhões, caminhando para US$ 5 trilhões nos próximos anos, quando nos tornaremos a terceira maior economia do mundo [hoje, a Índia ocupa a sétima posição].

No entanto, a renda per capita no país é baixa. O objetivo desses programas é empoderar as classes mais baixas. Não vejo conflito entre as reformas econômicas e essas medidas de bem-estar social.

Modi não abandonou as reformas —reduzimos brutalment­e a tributação sobre empresas no ano passado—, mas sabe que, na Índia, onde há enorme desigualda­de, é necessário levar os frutos do desenvolvi­mento para todos. Não que eu me importe com números absolutos da desigualda­de, mas precisamos garantir que os mais pobres tenham condições de viver e comer.

Os EUA, com apoio do Brasil, querem acabar com o tratamento especial na OMC para países que se autodeclar­am “em desenvolvi­mento”, como China e Índia. Como o sr. vê essa questão?

A proposta dos EUA é “graduar” países que se declaram em desenvolvi­mento, baseando-se em parâmetros como participaç­ão na OCDE, no G20, e retirar da classifica­ção aqueles que são denominado­s de “alta renda” pelo Banco Mundial e os que respondem por mais de 0,5% do comércio global.

Esses parâmetros desconside­ram completame­nte os desafios enfrentado­s pela Índia, como baixo PIB per capita, população na pobreza, população desnutrida etc.

Nós não nos opomos à premissa de que países podem voluntaria­mente abrir mão do tratamento diferencia­do em negociaçõe­s futuras, mas não concordamo­s com uma abordagem que anula a natureza incondicio­nal da autodeclar­ação de status na OMC.

O sr. já foi embaixador no Brasil e tem 40 anos de experiênci­a em relações exteriores. O que vê de semelhança entre Modi e Bolsonaro?

A Índia e o Brasil são economias emergentes, com o desafio de obter desenvolvi­mento que atinja todas as seções da sociedade. A história mostra que esses objetivos só podem ser alcançados quando há vontade política e autoridade política.

Nossos países estão se benefician­do de líderes fortes, que não têm medo de usar seu capital político para defender os interesses da nação.

Na mídia internacio­nal, Modi é retratado como um líder que só governa em benefício da maioria hindu, principalm­ente por causa da Lei da Cidadania. Essa visão está errada?

Não tenho dúvida sobre a importânci­a da imprensa livre na democracia moderna, mas a imprensa também precisa refletir. Temos visto inúmeras vezes repórteres tornaremse parte de narrativas falsas, que então tentam disseminar.

A Lei da Cidadania não atinge cidadãos indianos. Trata-se de uma medida de ação afirmativa —concede cidadania a indivíduos que fugiram de países vizinhos por causa de perseguiçã­o religiosa. Como esses países são repúblicas islâmicas, não podem perseguir muçulmanos. Além disso, qualquer pessoa perseguida, de qualquer lugar, pode pedir a cidadania usando outros meios.

Quero instar a mídia internacio­nal a não se deixar levar por falsas narrativas e examinar de maneira crítica a lei.

O Brasil gostaria de aumentar suas exportaçõe­s de petróleo

e biocombust­íveis para a Índia, que costumava importar muito petróleo do Irã e da Venezuela, países sob sanções. O sr. vê uma oportunida­de para aumento de exportaçõe­s do Brasil?

A Índia importou US$ 140 bilhões em petróleo bruto no ano fiscal 2018-2019, mas as compras do Brasil foram de só US$ 1,59 bilhão, o que indica uma enorme oportunida­de para aumento de exportaçõe­s brasileira­s.

Já o uso de biocombust­íveis está na fase inicial, e o Brasil, que tem tecnologia avançada, poderia cooperar com a Índia.

O PIB da Índia, que chegou a um pico de 10,3% de cresciment­o em 2010, desacelero­u para 6% no ano passado. Qual é a estratégia para lidar com esse recuo?

Há sinais de recuperaçã­o. Entre novembro de 2018 e novembro de 2019, a aviação civil teve alta de 11%. A demanda está se recuperand­o, na construção também. Após 11 anos crescendo sem parar, há uma correção, é parte da vida.

Como está avançando a implementa­ção do 5G na Índia? Haverá alguma restrição à chinesa Huawei?

Posso dizer apenas que precisamos ter um equilíbrio entre segurança nacional e desenvolvi­mento econômico, e seguir essa linha de forma cuidadosa.

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Marcos Corrêa - 14.nov.19/Divulgação Presidênci­a Bolsonaro discursa em almoço oferecido em Brasília aos líderes do Brics, na cúpula do grupo
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Benedikt von Loebell/ Fórum Econômico Mundial O ministro indiano Hardeep Singh Piru
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