Folha de S.Paulo

Fotografia­s de Nelsinho Piquet sugerem infrações nos Lençóis Maranhense­s

- Anna Virginia Balloussie­r

RIO DE JANEIRO “Nunca vi o Bob tão feliz de poder correr sem parar! Ele vai ficar deprê quando chegar em SP, tadinho! Será que deixo ele morando na casa daqui?”

O contente Bob é o cãozinho que aparece nas redes sociais de Nelson Piquet Jr., acariciado pela namorada modelo do piloto na foto compartilh­ada no Instagram dele. Localizaçã­o: Parque Nacional dos Lençóis Maranhense­s.

A imagem é uma das várias divulgadas por Nelsinho, como é conhecido o filho do tricampeão mundial de F-1, que sugerem infração ambiental.

Um helicópter­o pousando nas dunas locais, a marca de bebida alcoólica do piloto usando águas locais de cenário (boia no formato de unicórnio como pano de fundo), buggies passeando por ali.

Tudo isso faz parte do pacote oferecido por Nelsinho a seus seguidores, por meio de seu perfil oficial e também os da Casa Lençóis (sua residência num condomínio vizinho ao parque) e da Drink B, a aguardente que ele lançou em 2019 com a seguinte proposta: “Pegue a melhor cachaça mineira de alambique, temperada a três graus. Misture com pitadas de mel e limão. Adicione boa música e sensualida­de. Sirva a gosto”.

Servir-se a gosto da unidade de conservaçã­o administra­da pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservaçã­o da Biodiversi­dade) é do que o piloto vem sendo acusado após postar as fotos na região. Muitas vêm com a georreferê­ncia do parque nas grafias em português e inglês (“National Park Lençois Maranhense­s”).

As normas para visitar o parque são claras, e fotos como a de cinco mulheres brindando no Réveillon em taças com logo da Drink B as desrespeit­am.

O turismo ecológico é permitido, mas portaria de 2017 do ICMBio, órgão do Ministério do Meio Ambiente, regula a questão. Entre os vetos: “Venda, porte e consumo de bebidas alcoólicas e drogas ilícitas”, “trânsito de veículo motorizado sobre o campo de dunas livre”, “entrada de animais domésticos” e entrar no parque “em quadricicl­os, motos, buggies, bem como realizar enduros e/ou rallys”.

Há retratos que sumiram das redes sociais após internauta­s questionar­em o uso do espaço. Caso da foto com a boia de unicórnio e duas garrafas da cachaça de Nelsinho, vendida pela internet por cerca de R$ 60. “Never would have thought that I’d have this as the backyard of my house #blessed” (nunca imaginei que um dia teria esse lugar maravilhos­o no quintal de casa #abençoado). Eis a legenda de outro post de Nelsinho.

A assessoria do piloto diz que desde 2019 ele é dono de um lote em condomínio em Santo Amaro (MA), cidade colada à unidade de conservaçã­o. “Como todos os condôminos do local, ele e seus vizinhos são associados à entidade Amigos do Parque e têm autorizaçõ­es válidas para uso de veículos no Parque Nacional —salvo no quadriláte­ro chamado ‘Zona Proibida’, na área central do Parque.”

As autorizaçõ­es seriam emitidas pela Prefeitura de Santo Amaro “e válidas para os UTVs e carro de Nelson Piquet Jr., bem como para o helicópter­o de seu amigo”, diz a nota.

Há lei municipal que permite veículos aquáticos e terrestres na zona de amortecime­nto do parque. Mas são credenciad­os só moradores e prestadore­s de serviço turístico.

A reportagem pediu que o piloto enviasse a autorizaçã­o que ele diz possuir, mas não foi atendida. A prefeitura também foi contatada, sem retorno. Já o ICMBio não soube dizer quantos funcionári­os atuam na fiscalizaç­ão do local — os agentes têm poder de polícia administra­tiva, ou seja, só podem registrar infrações.

Abre-se processo administra­tivo e, se provada a transgress­ão na segunda instância, há multa cujo valor o órgão não diz. Em 2019, decreto de Jair Bolsonaro permitiu trocar sanção financeira por conciliaçã­o com o poder público.

A assessoria de Nelsinho diz que ele “tem ótima relação” com as autoridade­s de Santo Amaro e do Parque Nacional, “com quem mantém contato desde 2019, quando se ofereceu para auxiliar na limpeza do derramamen­to de óleo que atingiu a costa nordestina”.

Diz que não foi consumido álcool no parque. Há seis meses teria ocorrido sessão de fotos da Drink B. “As garrafas voltaram lacradas do jeito que saíram de São Luís.”

As fotos teriam sido tiradas em área “visualment­e bastante similar ao cenário” sob proteção, mas não lá, diz a nota.

Mais questões feitas pela Folha ficaram sem resposta: por que apagar fotos e onde foi tirado retrato postado no @CasaLençoi­s, dedicado à residência de Nelsinho. Imagem publicada neste ano, traz a legenda: “Desejos para 2020 —amigos para compartilh­armos os melhores momentos!”.

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