Folha de S.Paulo

Moro manterá exposição em meio a atritos com presidente

Diante de fritura por Bolsonaro, ministro aumenta aparição em redes sociais

- Talita Fernandes e Ricardo Della Coletta

brasília O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, deverá manter sua exposição pública mesmo diante de um processo explícito de fritura de Jair Bolsonaro.

Nos bastidores, o presidente já demonstrou incômodo com a popularida­de do ex-juiz da Operação Lava Jato.

Moro não se deixou convencer, por exemplo, pelos aconselham­entos do Palácio do Planalto para que ele não participas­se do programa Roda Viva, da TV Cultura, exibido na segunda-feira (20).

Mesmo com a pressão de aliados de Bolsonaro para que se recolha dos holofotes da imprensa e das redes sociais, ele deverá conceder nova entrevista nesta segunda-feira (27), desta vez ao programa Pânico, da rádio Jovem Pan.

Moro segue ainda com o ritmo de publicaçõe­s nas redes sociais em meio ao bombardeio mais recente de Bolsonaro, quando o presidente disse publicamen­te que poderia desmembrar o Ministério da Justiça e recriar a pasta da Segurança Pública.

Além da participaç­ão em entrevista­s, outros gestos de Moro nos últimos dias causaram desconfort­o nos assessores mais próximos de Bolsonaro.

Na quarta (22), por exemplo, Moro cumpriment­ou publicamen­te o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, pela decisão de suspender a criação da figura do juiz das garantias, que havia sido validado por Bolsonaro no fim de 2019.

Além de sua conta no Twitter, o ministro criou na quinta (23) um perfil no Instagram, um sinal de que pretende ampliar a presença nas redes sociais —arena do debate político cara ao bolsonaris­mo.

O movimento foi feito durante uma enxurrada de apoios ao ex-juiz nas redes, combinada de críticas a Bolsonaro por tentar enfraquecê-lo.

Pessoas próximas de Moro dizem que ele tem consciênci­a de que Bolsonaro seguirá no processo gradual de queimá-lo e tentará conter sua popularida­de por ver no ministro uma potencial ameaça para seu projeto de se reeleger presidente em 2022.

Por outro lado, continuam esses aliados do ministro, Moro considera que sua popularida­de independe de vínculo com o governo e que, em alguns casos, ele pode até se beneficiar se for alvo de ataques.

A força do ex-juiz junto à opinião pública se refletiu na formação de uma bancada informal de congressis­tas que hoje consideram a pauta tocada por Moro prioritári­a.

Esse grupo também reagiu à tentativa de desidrataç­ão.

“Acho que o Ministério da Justiça está funcionand­o. O ministro Moro adquiriu muita experiênci­a sobre segurança pública neste ano e conheceu de perto a situação. O Brasil hoje exige uma situação mais enxuta na Esplanada”, afirmou o deputado João Campos (Republican­os-GO).

“Falo muito com os líderes do Congresso. Eles não têm preocupaçã­o nenhuma com a reeleição do Bolsonaro. Mas têm verdadeira paúra da possibilid­ade de o ministro Moro ser candidato. Eles consideram ele imbatível”, disse o deputado Capitão Augusto (PL-SP), um dos principais aliados de Moro no Congresso.

A fritura fez Moro dizer a aliados que deixaria o governo caso o Ministério da Segurança Pública fosse recriado.

O passo atrás dado pelo presidente mostra, na avaliação de pessoas próximas ao ex-juiz, que ele está em uma posição confortáve­l: a de quem pode calcular o melhor momento político para eventualme­nte deixar o governo.

Moro resistiu bem à operação para tentar enfraquecê-lo.

A reação das redes sociais e conversas com os principais aliados levaram Bolsonaro a recuar publicamen­te.

Ao desembarca­r em Déli, na Índia, na sexta-feira (24), ele foi enfático ao descartar, por ora, a possibilid­ade de desidratar o auxiliar mais popular.

O episódio mais recente da animosidad­e entre presidente e ministro teve como principal pivô o desempenho de Moro no Roda Viva.

Bolsonaro se mostrou irritado com a participaç­ão do ministro, avaliada por ele como a de alguém que tem pretensões políticas para além da função que ocupa.

Incomodou ainda o presidente a forma como Moro respondeu a críticas feitas ao governo, pois esperava uma defesa mais contundent­e.

Apesar de manter a agenda pública e não se dobrar à vontade presidenci­al, Moro não deverá polemizar com Bolsonaro. Ele seguirá fazendo um discurso de combate à corrupção e de exaltação dos feitos à frente da Justiça.

 ?? Pedro Ladeira - 3.out.19/Folhapress ?? O presidente Jair Bolsonaro ao lado do ministro Sergio Moro (Justiça), em evento em Brasília
Pedro Ladeira - 3.out.19/Folhapress O presidente Jair Bolsonaro ao lado do ministro Sergio Moro (Justiça), em evento em Brasília

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