Folha de S.Paulo

Argentinos convivem com mais de dez tipos de dólar

Governo taxa de forma diferente moeda para exportação, pagamento de Netflix e compra no cartão de crédito, entre outros

- Sylvia Colombo

buenos aires O movimento das casas de câmbio da calle Sarmiento, no centro de Buenos Aires, tem sido fraco nestes dias, embora seja janeiro —uma época em que muitos buscam dólares para ir viajar.

“Está sendo atípico, mas esperar o quê? Se a pessoa tem de pagar uma taxa de 30% (imposta pelo governo) para comprar dólares, prefere fazêlo de outro modo, se houver, ou deixar as férias para outro momento”, diz o dono de uma delas à Folha, sem querer se identifica­r.

Pouco antes de deixar o governo, o então presidente, Mauricio Macri, impôs limite de compra para os argentinos de até US$ 200 (R$ 836) por mês, para evitar que o valor do peso despencass­e ainda mais. Isso segue vigente. A fuga de divisas estancou-se um pouco, mas também têm entrado menos dólares no mercado.

“Eu sou de classe média e estava juntando para sair de férias em julho para Miami com minha filha. Acada mês, comprava um pouco de dólares. Tive de dizer a ela que o sonho ficou pro ano que vem, isso se em 2021 a situação não piorar”, diz Alvaro Ochoa, 39.

“Ainda que agente consiga comprar as passagens de avião, não vamos poder usar cartão de crédito lá fora. Para tudo, vamos gastar 30% só em imposto”, completa.

A cobrança adicional é uma referência a uma das primeiras medidas econômicas de Alberto Fernández, novo presidente da Argentina.

Em uma tentativa de impedir uma nova rodada de desvaloriz­ação do peso argentino, o governo impôs novas alíquotas sobre compras com cartão no exterior e exportaçõe­s agropecuár­ias. Com essas ações, os argentinos, acostumado­s a lidar com duas cotações de dólar, agora precisam lidar com mais de dez.

Os dois mais conhecidos são o oficial (a 63 pesos, pelo Banco Nación) e o blue (clandestin­o, de 72 pesos a 78 pesos).

Para o cidadão comum que compra amoeda par afazer uma poupança, o dólar a 63 pesos não existe numa casa de câmbio comum, pois ele precisa adicionar mais 30% de imposto —o que o eleva a 82 pesos e foi apelidado de dólar solidário, com um toque de ironia (solidário com quem?).

O blue é um dos principais instrument­os para quem quer ter reserva em dólar, reflexo da baixa confiança dos argentinos no sistema bancário.

“Eu prefiro comprar o dólar clandestin­o aguardar empesos, ainda que investidos, no banco”, afirma Hermínia Salvatierr­a, 52.

Mas surgiram também os dólares cartão de crédito, como o que a família Ochoa precisará pagar se usar o cartão na viagem, o dólar-Netflix e assim por diante. No agronegóci­o, existe dólar-soja, dólar-milho e dólar-carne, reflexo das alíquotas distintas que produtores pagam na exportação.

Para o economista Aldo Abram, o exportador de soja vai receber 60% do que de fato vende uno exterior .“E comisso terá de pagar ainda seus gastos de produção e os outros impostos. É um desestímul­oà produção para exportação ”, diz em referência ao dólar soja.

Já para o economista Orlando Ferreres, a soma dos 30% aos impostos à exportação será usada para a redistribu­ição que o governo pretende fazer aos setores menos competitiv­os. “Se isso vai funcionar ou não, há que esperar, pois há um limite de paciência para aquele que está aportando mais.”

 ??  ?? Dólar oficial para a importação 63 pesos 72 a 78 pesos 80 pesos Dólar blue ou ilegal, que se compra com "arbolitos" (vendedores clandestin­os) ou em "cuevas" (lugares clandestin­os), varia de O dólar-bolsa se obtém com a triangulaç­ão entre ações e bônus; está em Para exportação, o dólar varia de acordo com o produto exportado, já que as taxas cobradas são diferentes. O dólar-soja custa 44 pesos; o dólar-carne, 57 pesos. O dólar-milho vale 55 pesos, e dólar-indústria, 55 pesos
Dólar oficial para a importação 63 pesos 72 a 78 pesos 80 pesos Dólar blue ou ilegal, que se compra com "arbolitos" (vendedores clandestin­os) ou em "cuevas" (lugares clandestin­os), varia de O dólar-bolsa se obtém com a triangulaç­ão entre ações e bônus; está em Para exportação, o dólar varia de acordo com o produto exportado, já que as taxas cobradas são diferentes. O dólar-soja custa 44 pesos; o dólar-carne, 57 pesos. O dólar-milho vale 55 pesos, e dólar-indústria, 55 pesos
 ??  ?? O dólar para pagar serviços como Netflix e Airbnb obteve um "perdão" do governo e agora vale 68 pesos, com uma taxa de apenas 8%
O dólar para pagar serviços como Netflix e Airbnb obteve um "perdão" do governo e agora vale 68 pesos, com uma taxa de apenas 8%
 ??  ?? Dólar "contado com liquidação", ou seja, para enviar dólares ao exterior, vale
Dólar "contado com liquidação", ou seja, para enviar dólares ao exterior, vale
 ??  ?? O dólar para usado como economia, para viajar ou fazer compras pela internet paga 30% de tributos; está cotado em
O dólar para usado como economia, para viajar ou fazer compras pela internet paga 30% de tributos; está cotado em

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