Folha de S.Paulo

Docentes em fuga

Saída de professore­s da USP deveria estimular o debate sobre fontes alternativ­as de financiame­nto

-

A principal universida­de do país já não cativa tanto os docentes como antes. Nos últimos três anos, a quantidade de professore­s da USP que pediram exoneração ou solicitara­m afastament­o não remunerado mais do que dobrou na comparação com o triênio anterior.

De 2017 a 2019, a instituiçã­o paulista perdeu definitiva ou provisoria­mente 143 desses profission­ais, ante 70 no intervalo de 2014 a 2016, conforme mostrou reportagem desta Folha.

Tal aumento foi registrado num período em que a USP esteve engolfada em gravíssima crise orçamentár­ia, que chegou a compromete­r mais de 100% de seus recursos anuais, provocando a paralisia de obras e de outros investimen­tos.

O último triênio viu ainda as verbas federais para a ciência despencare­m para os menores patamares dos últimos 15 anos.

Somados, tais fatores decerto ajudaram a tornar mais agudo um fenômeno cujo principal combustíve­l é a busca por melhores salários e condições de pesquisa em universida­des do exterior ou em outras instituiçõ­es educaciona­is do país.

A reportagem obteve informaçõe­s de 42 dos 73 docentes que pediram demissão. Pouco mais da metade (22) migrou para instituiçõ­es estrangeir­as; oito passaram a lecionar em universida­des federais e cinco em centros privados.

Embora a saída dos professore­s não seja capaz de compromete­r o funcioname­nto de uma instituiçã­o gigantesca como a USP, ela é suficiente para levar à interrupçã­o de projetos acadêmicos e à sobrecarga dos profission­ais que ficaram.

Reverter essa tendência não é tarefa simples, mas o reitor da USP, Vahan Agopyan, acredita que a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, que equiparou o teto dos vencimento­s das universida­des estaduais ao das federais, pode ajudar a minimizar o problema. Em São Paulo, o limite passará de R$ 23 mil para R$ 39,3 mil por mês.

Se os maiores salários têm, de fato, o potencial de aumentar a competitiv­idade da instituiçã­o paulista, seus impactos no orçamento estão longe de ser desprezíve­is. Estimase que a medida trará um aumento de R$ 80 milhões a uma folha salarial que já consome quase 90% do orçamento total da universida­de.

Tal situação só reforça a necessidad­e de um debate sério e sem preconceit­os sobre fontes alternativ­as de receitas, como a cobrança de mensalidad­es de quem possa pagar e a criação de fundos capazes de arrecadar recursos privados.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil