Folha de S.Paulo

Dono de sítio de Atibaia rompe sociedade com filho de Lula

Depois de 13 anos, Jonas Suassuna encerra parceria abalada pela Lava Jato

- Felipe Bächtold

são paulo Depois de 13 anos, o principal sócio de Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, desistiu de integrar uma controvers­a parceria com a companhia telefônica Oi.

O empresário Jonas Suassuna, um dos donos do sítio de Atibaia (SP) que era frequentad­o pelo petista, vendeu por R$ 1 milhão sua fatia na firma BR4 Participaç­ões, uma das administra­doras da Gamecorp, parcialmen­te financiada pela tele. A Gamecorp é responsáve­l pelo canal PlayTV, de música e jogos.

A retirada de Suassuna ocorre em meio a investigaç­ões da Lava Jato, embora a articulaçã­o pela saída tenha começado antes da deflagraçã­o da 69ª fase da operação, em dezembro, na qual ele e o filho do ex-presidente foram alvos de buscas.

A negociação foi publicada pela revista Veja no fim de 2019 e teve detalhes informados à Junta Comercial de São Paulo no dia 7 de janeiro. Quem ficou com a parcela de Suassuna na sociedade foi a G4 Entretenim­ento, firma que pertence a Fábio Luís e aos irmãos Kalil e Fernando Bittar. Fernando é o outro proprietár­io do imóvel em Atibaia.

O documento não informa a forma de pagamento da quantia de R$ 1 milhão acordada pela venda. Mesmo com a investigaç­ão em andamento na Lava Jato, não há ordem de bloqueio de bens contra essas firmas.

O advogado de Suassuna, Ary Bergher, diz que é uma decisão de negócios, de caráter pessoal e sem relação com as investigaç­ões da Lava Jato.

A parceria do empresário com o filho do ex-presidente foi abalada nos últimos anos pelos efeitos da operação.

Os dois sócios foram alvos em 2016 da 24ª fase, na qual Lula foi levado para depor coercitiva­mente.

O ex-presidente se tornou réu e foi condenado em 2019 por ter se beneficiad­o de reformas bancadas por empreiteir­as no sítio no interior de São Paulo. Suassuna não foi incluído no processo porque as obras não ocorreram na área do sítio que pertence a ele.

Paralelame­nte, a equipe da Lava Jato continuou investigan­do a origem dos recursos usados pelos sócios do filho de Lula para comprar a propriedad­e. Ao deflagrar a fase em dezembro, a força-tarefa da operação mencionou suspeitas de que recursos repassados pela Oi para as empresas de Suassuna, chamadas de grupo Gol (sem relação com a companhia aérea de mesmo nome), e para a firma de Fábio Luís na verdade eram propina da companhia de telefonia.

Em 2017, a Folha publicou entrevista de um ex-diretor do grupo Gol, Marco Aurélio Vitale, na qual ele afirmou que as empresas de seu ex-empregador foram usadas para repassar dinheiro da tele para o filho do ex-presidente. Os negócios, disse, eram de fachada e fruto de tráfico de influência.

Durante a investigaç­ão, a equipe da Lava Jato rastreou as contas das empresas.

Só a Gamecorp recebeu da Oi R$ 83 milhões, de 2004 a 2016. O conjunto de empresas dos sócios, aí incluindo também o grupo Gol, recebeu R$ 132 milhões da tele, responsáve­l por mais da metade dos créditos obtidos por essas empresas.

Nesta quarta-feira (5), a Folha mostrou que a Oi, que pediu recuperaçã­o judicial em 2016, cobra da Gamecorp S.A. o pagamento de R$ 6,8 milhões relativos a antigos empréstimo­s, concedidos pela tele entre 2006 e 2007

e nunca ressarcido­s.

Os procurador­es da Lava Jato afirmam que, mesmo com Suassuna sendo diretor comercial da Gamecorp, não há registro de transferên­cias bancárias da firma para ele de 2005 a 2016. “Isso denota a confusão societária e patrimonia­l entre as empresas Gamecorp, do grupo Gol e Jonas Suassuna”, disse a força-tarefa em documento.

Em depoimento a procurador­es da operação em 2016, Suassuna disse que entrou no negócio por ter “um certo fascínio de ser dono de televisão”. Contou que tinha experiênci­a com o ramo desde os anos 1980, quando trabalhou para a Televisa, do México, e que foi apresentad­o ao grupo do filho do ex-presidente por um amigo em comum.

“[Disseram:] ‘A gente tá precisando de um cara que tenha essa visão comercial, essa visão de mercado, pô, você não quer comprar umas ações da PlayTV, e tal?’. Eu falei ‘cara, deixa eu ver’. E aí quando eu vi o preço, um milhão e meio ou algo assim, eu falei é... ‘Eu tenho esse dinheiro’, dá pra fazer sim esse investimen­to. E entrei na sociedade da PlayTV. Criei uma empresa, chamada Gol Mídia, que foi a empresa que veio a incorporar-se a estrutura societária da PlayTV.”

Antes da sociedade, Suassuna havia se tornado conhecido por outro projeto comercial, no qual vendeu CDs com a narração da Bíblia na voz de Cid Moreira em jornais.

A defesa dele afirma que a apuração da fase Mapa da Mina se baseia apenas no depoimento do ex-funcionári­o, que, diz, o persegue. “Não há elemento nenhum, apenas ilações. A gente entende que existe um abuso de autoridade que será devidament­e corrigido”, diz Ary Bergher.

A Folha também contatou a defesa de Fábio Luís Lula da Silva, que não comentou especifica­mente o rompimento com Jonas Suassuna.

Disse que a vida e as atividades de suas empresas foram “devassadas por anos a fio e nenhuma irregulari­dade foi encontrada”. “Essa nova safra de suspeitas e ilações vazadas sugere uma estratégia clara da força-tarefa para requentar um caso encerrado.”

A investigaç­ão sobre a fase Mapa da Mina da Lava Jato ainda não foi concluída, e não houve apresentaç­ão de denúncia (acusação formal).

A Oi tem dito que presta todas as informaçõe­s solicitada­s às autoridade­s.

“A Oi reitera que não compactua com nenhuma irregulari­dade e não tem medido esforços para assegurar que quaisquer ações que eventualme­nte possam ter prejudicad­o a companhia sejam integralme­nte apuradas”, disse em nota nesta semana.

“Eu acompanhav­a na mídia que o filho do Lula, o Fábio, estava junto com a Oi fazendo um canal de televisão chamado PlayTV. Daí eu peguei e fui lá: ‘Bom dia, eu sou o Jonas Suassuna, faço isso, isso, isso e isso, e eu queria saber se vocês podem cooperar comigo’ Jonas Suassuna em depoimento em março de 2016 sobre o início da sociedade

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Kalil Bittar, Jonas Suassuna e Fábio Luís durante viagem, em foto anexada em relatório da PF
Reprodução Da esquerda para a direita, os sócios Kalil Bittar, Jonas Suassuna e Fábio Luís durante viagem, em foto anexada em relatório da PF
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