Folha de S.Paulo

No Congresso, Trump exalta economia e rivaliza com Pelosi

Em discurso do Estado da União, presidente da Câmara chama a atenção

- João Perassolo e Bruno Benevides

SÃO PAULO Donald Trump chegou para seu terceiro pronunciam­ento do Estado da União como uma estrela de show de rock, com a habitual entrada triunfal no Congresso.

O presidente americano foi recebido na noite de terça (4) com longos aplausos dos congressis­tas, aos quais agradecia com apertos de mão.

As palmas continuara­m enquanto ele subia ao púlpito e se preparava para começar a discorrer sobre o “grande retorno americano”, como afirmou no começo de sua fala.

Antes de seu pronunciam­ento, entregou uma cópia do discurso para o vice-presidente, Mike Pence, e para a democrata Nancy Pelosi, sentados atrás dele. A presidente da Câmara estendeu a mão para cumpriment­ar o republican­o, mas ele não respondeu. Ela então tirou a mão rapidament­e, com expressão constrangi­da, e deu de ombros.

Pelosi economizou nas palavras laudatória­s. Em vez do tradiciona­l “Tenho o grande privilégio e a distinta honra de apresentar a vocês o presidente dos EUA”, disse apenas “Membros do Congresso, o presidente dos EUA”.

Os parlamenta­res gritavam “Mais quatro anos! Mais quatro anos!”, como um coro de um comício de campanha.

Na visão sobre a América apresentad­a pelo republican­o, “os anos de declínio ter

minaram”. A economia do país está melhor do que nunca, o Exército está reconstruí­do, as fronteiras, seguras, e o orgulho nacional, restaurado.

Há mais emprego, mais renda e a pobreza e o crime estão diminuindo. “O estado da nossa União é mais forte do que jamais foi”, sentenciou, em uma das muitas frases de efeito que usaria.

Trump passou cerca de 20 minutos enumerando dados

econômicos, como os 7 milhões de novos empregos gerados desde que assumiu o poder, em janeiro de 2017, e a taxa de desemprego mais baixa em meio século.

Incluiu as minorias em sua fala, referindo-se a afro-americanos, hispânicos, asiáticos e pessoas com deficiênci­a.

O presidente interino autodeclar­ado da Venezuela, Juan Guaidó, estava na plateia. Ele foi saudado por Trump, que afirmou que os EUA estão do lado da Venezuela e que “o socialismo destrói as nações, mas nos lembra que a liberdade unifica a alma” —cutucão no ditador Nicolás Maduro.

Guaidó foi aplaudido de pé tanto por republican­os quanto por democratas.

Atrás de Trump, Pence levantou dezenas de vezes para aplaudir o discurso. Enquanto isso, Pelosi passou a maior parte do tempo lendo a cópia do pronunciam­ento ou meneando a cabeça em sinal de reprovação sobre o que era dito.

O evento foi marcado por uma série de atos de grande apelo emocional, como se fosse um programa de auditório.

Trump ofereceu uma bolsa de estudos a uma menina negra e anunciou o retorno inesperado de um militar do Afeganistã­o, que apareceu e se juntou à família na plateia.

Ele ainda pediu à primeirada­ma, Melania, que entregasse a Medalha da Liberdade, a mais alta honraria civil dos EUA, ao radialista conservado­r Rush Limbaugh, que tem câncer em estágio avançado.

Na análise do jornal The New York Times, o discurso foi uma espécie de retorno de Trump às suas origens — ele era apresentad­or do programa “O Aprendiz”, e muitos de seus apoiadores o conheceram nesta ocasião.

Como esperado, o presidente também falou longamente sobre imigração ilegal. “Se você vier ilegalment­e, será prontament­e removido do nosso país”, disse, antes de criticar as cidades-santuário —território­s que se recusam a cumprir a linha-dura contra imigrantes—, como Nova York.

Ele enumerou crimes que teriam sido cometidos por tais estrangeir­os e saudou um homem cujo irmão foi assassinad­o por um imigrante em situação irregular. Em seguida, afirmou que iria apresentar um projeto para permitir que cidades-santuário sejam processada­s em casos assim.

Também prometeu que o muro na fronteira com o México ficará pronto, mas não ofereceu um prazo, e afirmou que, após um acordo assinado recentemen­te com nações da América Central, o número de tentativas de travessia da fronteira sul dos EUA caiu 75%.

A certa altura, parte dos democratas começou a deixar a Casa. O deputado Tim Ryan escreveu: “Já tive o bastante. É como assistir a uma luta profission­al. É tudo falso”.

Trump também atacou a universali­zação do sistema de saúde. Disse que o plano democrata de expandir o seguro de saúde financiado pelo governo representa­va uma “aquisição socialista” que levaria o país à falência.

Pré-candidatos democratas à Presidênci­a —como Elizabeth Warren e Bernie Sanders— e muitos legislador­es propuseram planos de saúde que seriam administra­dos pelo governo, em oposição ao atual sistema privado, no qual milhões de americanos recebem seguro médico de seus empregador­es.

Quando tocou em temas de política externa, Trump alegou que o califado do Estado Islâmico foi destruído e comemorou a morte de seu líder, Abu Bakar al-Baghdadi —momento no qual Pelosi aplaudiu.

Entre ações deste ano, Trump lembrou do assassinat­o do general iraniano Qassim Suleimani e ressaltou o plano de paz entre Israel e Palestina, apresentad­o há dias.

Pouco antes do fim do discurso, defendeu o direito constituci­onal de todas as religiões rezarem nas escolas. Em seguida, agradeceu a Deus.

Muitas democratas, Pelosi incluída, vestiram-se de branco

“Membros do Congresso, o presidente dos EUA Nancy Pelosi presidente da Câmara, ao apresentar, de forma lacônica, Donald Trump

“O estado da nossa União é mais forte do que jamais foi Donald Trump durante o discurso

“Já tive o bastante. É como assistir a uma luta profission­al. É tudo falso Tim Ryan deputado democrata, ao deixar o plenário

pelo segundo ano consecutiv­o, uma homenagem ao movimento sufragista, que conquistou o direito de voto para as mulheres há cem anos.

O discurso do Estado da União, que serve oficialmen­te para o presidente apresentar ao Legislativ­o suas prioridade­s para o ano, é considerad­o uma das principais tradições políticas dos EUA, previsto inclusive na Constituiç­ão.

Em 2019, o republican­o usou o discurso para pressionar democratas a liberarem verba para a construção do muro na fronteira com o México e criticou a investigaç­ão sobre uma possível interferên­cia russa na eleição de 2016.

Desta vez, o discurso acontece em um momento tumultuado da política americana, em meio ao início das primárias que decidirão quem será o candidato democrata que vai enfrentar Trump na eleição. Em sua fala, ele não fez nenhuma menção ao processo.

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Mandel Ngan/AFP Nancy Pelosi rasga folhas do discurso de Donald Trump ao lado do vice, Mike Pence, no Congresso
 ?? Olivier Douliery/AFP ?? Ao ser recebido, Trump não responde a cumpriment­o de Pelosi
Olivier Douliery/AFP Ao ser recebido, Trump não responde a cumpriment­o de Pelosi

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