Folha de S.Paulo

SP tem maioria das grandes obras antienchen­te atrasada

Há 17 intervençõ­es em curso na capital paulista; algumas, prometidas há anos

- Artur Rodrigues

são paulo Há quase 20 anos no mesmo lugar, a loja de peças de carro da comerciant­e Rosane Carneiro, 53, no Tremembé (zona norte de SP), é tomada pelas águas no verão. Desde dezembro último, já foram três vezes.

As vitrines e estantes com produtos ficam suspensas, em uma altura em que a água não chega. “Mas, mesmo assim, a gente fica com água até o joelho, cheiro ruim, ratos. Aconteceu antes do Natal, antes do Ano Novo e em janeiro”, diz ela.

Perto dali, a canalizaçã­o do córrego Tremembé, que passa ao lado da loja, está parada devido a questões burocrátic­as. Quase 400 metros de obras ao longo do curso de água ficaram inacabados devido a desapropri­ações que não foram concluídas.

A situação não é exceção. Obras municipais importante­s para resolver problemas crônicos de várias regiões paulistana­s vêm se arrastando por vários anos e gestões, por motivos que vão de problemas burocrátic­os a efeitos da crise econômica.

A cidade tem ao menos 17 grandes obras de drenagem, de acordo com dados da Siurb (Secretaria de Infraestru­tura Urbana e Obras). Se dependesse de previsões da atual gestão, do PSDB, ou da anterior, do PT, ao menos 14 delas já estariam prontas.

A atual gestão afirma que teve que refazer projetos da gestão Fernando Haddad. Já administra­ção petista rebate dizendo que é prova da incompetên­cia insistir em culpar a administra­ção que acabou em 2016.

Algumas dessas obras seguiram num ritmo de para-eanda. É o caso de reservatór­ios na região da bacia do Aricanduva, área com problema histórico de enchentes. Ao menos dois reservatór­ios, parte de um pacote de obras previsto para aquela região, foram paralisada­s e retomadas no ano passado.

As obras ficam perto da casa da doméstica Zilda Teixeira, 63, que mora naquela região desde que tem sete anos.

A rua em que Zilda vive tem uma comporta para impedir que a “maré” que toma a região nos dias de chuva tome conta das casas. Ali, à sombra da letargia do poder público, as obras antienchen­te são feitas pelos próprios moradores, habitantes de casas onde só se chega após subir escadas.

Se a água não entra, eles também não conseguem sair. “Dependendo do tempo de chuva, leva até três horas para a água ir embora e as pesprojeto­s soas conseguire­m sair de casa de novo”, diz Zilda.

Depois de tantas obras no rio Aricanduva, os moradores são céticos sobre os possíveis efeitos de mais intervençõ­es. “Fizeram obras, mas até hoje a situação só piorou por aqui.”

A bacia do Aricanduva é a que tem mais obras de drenagem pendentes atualmente, um total de cinco. Atrás, vêm as bacias do córrego Paciência (zona norte) e do riacho do Ipiranga (zona sul), com quadro cada.

Há ainda obras em curso nas regiões dos córregos Zavuvus (zona sul) e Anhanguera (centro).

O Comitê Extraordin­ário de Chuvas e Enchentes, da Câmara Municipal, cobra as obras de macrodrena­gem nas zonas leste, sul e centro. O relatório final feito pelos vereadores ressalta também a necessidad­e de realização de manutenção de córregos e galerias a medidas simples como recuperaçã­o de margens dos rios.

O vereador Gilberto Natalini (PV), secretário do Verde durante a passagem de João Doria (PSDB) pela prefeitura, afirma que as obras de saneamento acabam sendo deixadas de lado após a pressão inicial nos meses de chuva.

“É um investimen­to enorme, e chuva só tem três meses [no ano]. Como as demandas são muitas e o dinheiro é curto, o dinheiro acaba sendo usado para outras coisas. É muito pouco executado o orçamento de prevenção de combate a enchente”, diz o vereador.

Natalini afirma que a cidade está cada vez mais impermeabi­lizada, as margens dos rios são invadidas, e as galerias já não dão conta para o volume de água, que cresceu nas últimas décadas.

“O problema climático e a urbanizaçã­o errônea vão de trem-bala e o poder público vai de maria-fumaça atrás tentando consertar”, afirma.

“O problema climático e a urbanizaçã­o errônea da cidade vão de trem-bala e o poder público vai de maria-fumaça atrás tentando consertar

Gilberto Natalini (PV) vereador

“Dependendo do tempo de chuva, leva até três horas para a água ir embora e as pessoas conseguire­m sair de casa de novo Zilda Teixeira doméstica

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Fotos Zanone Fraissat/Folhapress Trecho da avenida Aricanduva, na zona leste de São Paulo, junto ao rio Aricanduva, onde deverá ser construído reservatór­io para impedir enchentes
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Rua Canatiar, próximo ao córrego Tremembé, na zona norte da capital paulista
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