Fala de Guedes ecoa seu chefe
Prefeitura analisa compensações a Silvio Santos, caso projeto seja sancionado
A sistemática erosão das políticas de inclusão pelo presente governo, combinada com a ausência de discussão mais ampla sobre a redução da regressividade tributária, deixa claro que se a festa do crescimento chegar, doméstica não entra.
são paulo Após ter sido aprovado em segunda votação pela Câmara Municipal na quinta-feira (13), o projeto de lei que cria o Parque Municipal Bixiga segue para sanção ou veto do prefeito Bruno Covas (PSDB). Ele tem 15 dias úteis para tomar a decisão.
Caso ele seja sancionado pelo tucano, novas alternativas se abrirão para resolver o imbróglio entre grupos interessados na construção do parque, liderados pelo diretor do Teatro Oficina Uzyna Uzona, o dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, e o Grupo Silvio Santos, proprietário do terreno, que pretendia construir três prédios de até 100 metros de altura na região.
A disputa pelo terreno se arrasta há 40 anos e não se encerra com a aprovação na Câmara ou a eventual sanção de Covas. No entanto, a participação da prefeitura possibilita a busca de soluções que antes não se apresentavam.
A proposta que começa a ser estudada pela prefeitura é a da transferência de potencial construtivo, que foi utilizada para solucionar o impasse do parque Augusta.
Nesse caso, a prefeitura ofereceria ao Grupo Silvio Santos títulos de potencial construtivo, certificados que liberam a construção acima do permitido em determinadas áreas e que as empresas podem vender no mercado imobiliário. Em troca, ficaria com o terreno.
O instrumento, chamado Transferência do Direito de Construir, é previsto no Plano Diretor. Outra solução seria oferecer terrenos públicos para o Grupo Silvio Santos.
Na segunda (17), o dramaturgo Zé Celso, 82, e outros defensores da construção do parque deverão se encontrar com Covas na prefeitura para discutir o destino do projeto.
Zé Celso diz à Folha que não se trata mais apenas de uma batalha dele contra Silvio Santos, mas de uma luta em defesa da natureza. “Estamos muito entusiasmados. Vimos durante a semana uma demonstração do mundo em extinção [com as chuvas em São Paulo]. O parque será uma aproximação da natureza”, afirma.
“Foram 40 anos de luta muito inspiradores. Nunca deixei de me referira esse inimigo em minhas obras. Sei o que é o capitalismo de renda, o capitalismo especulativo, o videocapitalismo”, completa.
O dramaturgo se empolga ao falar de um projeto de parque com muitas árvores, com a redescoberta de um córrego na área, coma construção de uma arena ao ar livre com arquibancada verde “tal como em Machu Picchu”, no Peru.
O projeto defendido por Zé
Celso foi construído a partir de uma colaboração entre Marília Gallmeister, Carila Matzenbacher e Marcelo X, que trabalham para o grupo do dramaturgo, e Newton Massafumi e Tânia Parma, estudiosos dos córregos da cidade.
Se no chão o córrego seria o protagonista, pelo alto as ruas do entorno do lote —localizado entre as ruas Jaceguai, Abolição, Japurá e Santo Amaro— seriam ligadas por passarelas.
A proposta é defendida também por representantes da Igreja Nossa Senhora Achiropita, do museu Memória do Bixiga, e outras 256 entidades.
Autor do projeto de lei aprovado na Câmara, o vereador Gilberto Natalini (PV) diz que o próximo passo agora é negociar. “Queremos conversar para propor uma troca. No caso do parque Augusta, as empresas até tiveram vantagem”, afirma.
A Folha mostrou que as empreiteiras Cyrela e Setin conseguiriam até R$ 95 milhões de lucro ao doar o terreno do parque Augusta para o poder público e ficar com os créditos de potencial construtivo.
“Uma terceira via seria um arroubo de generosidade do Silvio Santos, que poderia doar o espaço para a cidade.”
Natalini ressalta que o projeto é autorizativo, ou seja, caso sancionado, apenas permite a construção do parque por parte da prefeitura, sem a obrigação de executá-lo. “Mas, se Covas vetar, mata o projeto na raiz”. Secretários próximos a Covas acreditam que a tendência é de sanção do projeto.
Em ano eleitoral, desatar mais um nó na região central da cidade e conseguir lançar a pedra fundamental de mais um parque poderia ser vantajoso politicamente para Covas, que buscará a reeleição.
O projeto do Grupo Silvio Santos chegou a ser aprovado pelos três órgãos de patrimônio, Conpresp (municipal), Condephaat (estadual) e Iphan (federal).
Segundo especialistas contratados pelo teatro, a obra prejudicaria o local, que é tombado desde 2010 pelo patrimônio histórico em grau municipal, estadual e federal. Defensores do parque afirmam que, com a construção dos condomínios, o Teatro Oficina teria luz natural por apenas duas horas por dia.
O projeto previa mil apartamentos com mil vagas de garagem e alguns andares de subsolo, que poderiam atingir não só o rio que corre sob terreno, mas o lençol freático que está a quatro metros da superfície.
No entanto, nunca foi levado adiante devido ao impasse.
Procurado pela Folha ,o Grupo Silvio Santos não se manifestou sobre a aprovação do projeto na Câmara ou a evolução das tratativas.