Folha de S.Paulo

Mais salário, menos educação

Aumentar os recursos do Fundeb é irresponsa­bilidade fiscal contra a União

- Marcos Mendes Pesquisado­r associado do Insper, é autor de “Por que É Difícil Fazer Reformas Econômicas no Brasil?”

Ganha força no Congresso PEC que renova o Fundeb (fundo de financiame­nto da educação básica). É importante garantir financiame­nto estável para a educação. Porém as mudanças que acompanham a renovação contêm erros de diagnóstic­o.

O principal erro é o aumento de recursos colocados no fundo. Pretende-se melhorar a educação aumentando o gasto público, quando o nosso problema é ineficiênc­ia na aplicação dos volumosos recursos já alocados no setor.

O Brasil aplica 6% do PIB em educação, mais do que 83% dos países. O governo federal aumentou o gasto em educação básica ao ritmo de 7% ao ano acima da inflação, na última década. E os resultados nos testes de avaliação parecem o eletrocard­iograma de um morto.

Gastamos mais que Indonésia, México ou Colômbia e próximo aos valores de Chile e Turquia, porém com resultados muito piores que os desses países nos exames internacio­nais.

Vamos gastar mais em um sistema educaciona­l antes de torná-lo capaz de transforma­r dinheiro em resultados?

Afinal, há outras políticas públicas também clamando por recursos, como a saúde, que precisará atender 43 milhões de idosos a mais em 2060, enquanto haverá 11 milhões a menos de pessoas em idade escolar.

Seria importante que o Fundeb estimulass­e a busca por mais qualidade, premiando as redes que apresentas­sem melhorias nas avaliações dos alunos. Porém, a proposta ainda é muito tímida nesse tipo de estímulo.

Mais grave é o fato de que o aumento previsto virá de aporte da União que, no mínimo, custará R$ 20 bilhões por ano. Mas não se aponta de onde sairá o dinheiro.

Acena-se com o uso da receita do salário-educação. Mas ela não é suficiente (são R$ 9 bilhões por ano) e já custeia outros programas, como merenda escolar e livro didático. Se a verba for para o Fundeb, ou acabam esses programas ou terá que vir dinheiro de outro lugar para financiá-los.

Os problemas não param por aí. Em 2008 foi aprovada uma lei estipuland­o que o piso salarial dos professore­s da rede pública seria corrigido, anualmente, pelo mesmo índice de aumento do gasto por aluno do Fundeb. Isso fez o piso disparar, crescendo 204% entre 2009 e 2020, ante aumento de 82% do IPCA. As prefeitura­s não conseguem arcar com esse custo.

É fácil entender por que o gasto mínimo por aluno sobe acima da inflação. Ele é calculado pela divisão do valor total alocado ao Fundeb pelo número de alunos. O valor alocado ao Fundeb é uma cesta de tributos e transferên­cias, que cresce acima da inflação ao longo dos anos. E o denominado­r dessa fração (o número de alunos) está caindo devido à queda na taxa de fecundidad­e.

Logo, há inequívoca tendência de cresciment­o real do gasto mínimo por aluno, empurrando para cima o piso do magistério.

A lei do piso determina, ainda, que, em caso de o professor se aposentar pelo INSS recebendo menos que o piso, o município tem que completar a remuneraçã­o. Mais de 3.500 prefeitura­s têm que pagar essa complement­ação.

O STF piorou as coisas, ao determinar que o reajuste do piso deve incidir sobre toda a escala de remuneraçã­o, e não só sobre o piso, que deixou de ser um “salário mínimo” para se tornar um indexador da carreira.

Se o Fundeb crescer 50%, a despesa de pessoal subirá mais do que 50%! Tudo o que for colocado no fundo vai virar folha de pagamento: um ciclo vicioso no qual sempre faltará dinheiro.

É incrível que os defensores da educação pública apoiem uma agenda insustentá­vel, que representa­rá mais folha de pagamento, mais aposentado­rias e menos dinheiro para a gestão escolar, merenda e material didático.

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