Folha de S.Paulo

O fim da velhice

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

são paulo Em tempos de politicame­nte correto, em que o etarismo desponta como a próxima bola da vez, é arriscado sugerir que a velhice seja algo deplorável. David Sinclair, porém, não apenas não enaltece a “melhor idade” como ainda a classifica como uma moléstia que precisa ser extirpada. O que separa Sinclair de um genocida ordinário é que ele não pretende eliminar os velhos, mas sim os processos biológicos que dão causa à senescênci­a.

Sinclair, como o leitor já deve ter intuído, é um cientista. Na verdade, é um dos mais reputados especialis­tas em envelhecim­ento, comandando laboratóri­os de genética em Harvard e na Austrália. Seu mais recente livro, “Lifespan”, é uma daquelas obras em que o otimismo é tão denso que dá para tocá-lo.

Para o autor, estamos muito perto de fabricar uma pílula que nos permitirá viver bem além dos cem anos e com muita saúde, isto é, sem as moléstias que hoje vêm com a idade, como cânceres e demências. Quem não quiser esperar já pode recorrer a mudanças de hábitos, que incluem passar fome e frio, e ao uso “off-label” de alguns medicament­os que já estão no mercado.

O que diferencia Sinclair de um charlatão ordinário é que suas recomendaç­ões estão baseadas em alguma ciência e que seu otimismo, embora acima da média, é partilhado pela maioria dos pesquisado­res da área. O ponto fulcral é que a senescênci­a é mais o resultado de um acaso estatístic­o do que de uma fatalidade biológica. Em tese, dá para controlar e até reverter o processo com poucas intervençõ­es relativame­nte simples. Em modelos animais, já há resultados palpáveis.

Na primeira metade de “Lifespan”, Sinclair explica a ciência por trás do envelhecim­ento, com destaque para o papel das sirtuínas descoberta­s em seu laboratóri­o, e, na segunda parte, faz consideraç­ões éticas e sociais sobre o que significar­á o rápido e iminente aumento de longevidad­e. Quem viver verá — literalmen­te.

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