Folha de S.Paulo

Chefe da Secretaria­Geral vira conselheir­o político de Bolsonaro

Cotado para o Supremo Tribunal Federal, Jorge Oliveira tornou-se peça-chave nas principais decisões de governo

- Talita Fernandes e Gustavo Uribe

brasília O presidente Jair Bolsonaro disse “aqui está minha família”, enquanto abraçava o amigo Jorge Oliveira e a mãe dele, Marília. O gesto foi feito na presença de sua equipe ministeria­l, durante cerimônia de posse do policial militar da reserva no comando da Secretaria-Geral, em junho.

No salão nobre do Palácio do Planalto, o afago público foi compreendi­do pela maior parte dos assessores presidenci­ais. A mensagem era clara: a confiança que Bolsonaro deposita no amigo extrapola a relação puramente profission­al.

Nos oito meses à frente do cargo, o major, como é chamado por Bolsonaro, tornou-se o principal conselheir­o político e peça-chave nas principais decisões de governo. Ele também se converteu em um canal de acesso de integrante­s do Judiciário e do Legislativ­o ao Executivo, o que deve ser ampliado com as mudanças recentes feitas pelo presidente na equipe ministeria­l.

Bolsonaro trocou o político Onyx Lorenzoni pelo general Walter Souza Braga Netto na Casa Civil. Com isso, as quatro pastas com status de ministério que ficam no Planalto têm militares em seu comando —três deles são generais.

Jorge é visto como um ministro que atua no estilo “soft power”, conciliado­r e aberto a diálogo. Com isso, ele conseguiu costurar acordos e viabilizar entendimen­tos —uma habilidade adquirida durante a sua atuação como assessor parlamenta­r na Câmara que lhe rendeu na bancada bolsonaris­ta e na equipe econômica a alcunha de “ministro informal da Casa Civil”.

O apelido, que é refutado com veemência por Jorge, foi criado após o enfraqueci­mento de Onyx, que foi transferid­o na quinta-feira (13) para o Ministério da Cidadania.

Jorge chegou a ser convidado para assumir a Casa Civil, mas recusou o convite. Com a ausência de ministros com experiênci­a congressua­l no Planalto, assessores presidenci­ais avaliam que, inevitavel­mente, sobrará para ele também parte da função de articulaçã­o com o Congresso.

Pela amizade antiga com Bolsonaro (desde 2003), o ministro é consultado por aliados do presidente sobre a opinião do mandatário a respeito de temas diversos, desde medidas do governo a declaraçõe­s polêmicas.

O chefe da Secretaria-Geral é um dos poucos com poder de influência sobre o presidente e com acesso à sua vida pessoal. Quando é chamado para despachos administra­tivos, frequenta aos finais de semana o Palácio da Alvorada, em encontros que acabam se estendo em almoços.

Ele tem ainda o apoio dos filhos mais velhos do presidente, tanto pela sua fidelidade como pela sua discrição.

A amizade de longa data lhe rendeu o convite para ser padrinho de casamento do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) em maio do ano passado, no Rio de Janeiro.

Além do gabinete ministeria­l, no quarto andar do Palácio do Planalto, Jorge tem à sua disposição uma sala no terceiro andar, próxima à do presidente, destinada à sua atividade como chefe da SAJ

(Subchefia de Assuntos Jurídicos). O ministro agiu estrategic­amente em diversas decisões do presidente. Foi ele quem alertou Bolsonaro, por exemplo, das implicaçõe­s jurídicas caso não sancionass­e o fundo eleitoral de R$ 2 bilhões, que havia sido aprovado pelo Poder Legislativ­o.

Segundo assessores presidenci­ais, diante da disposição de Bolsonaro de vetar a iniciativa por pressão das redes sociais, ele o convenceu de que a melhor saída seria atender o desejo dos congressis­tas para evitar a interpreta­ção jurídica de que estaria descumprin­do a legislação.

O major, formado em direito, frequenta a residência de Bolsonaro desde que o presidente era deputado. Seu pai, o capitão do Exército Jorge Francisco, morto em 2018, trabalhou no gabinete do congressis­ta por mais de 20 anos.

Inicialmen­te, o ministro chegou ao governo como chefe da SAJ da Casa Civil, cargo responsáve­l pela análise jurídica de todos os atos assinados pelo presidente, como decretos, medidas provisória­s e projetos de lei.

Ao ser escolhido para integrar uma das pastas com mais contato com Bolsonaro, Jorge ganhou a indisposiç­ão natural do ex-chefe da

Casa Civil, ao qual a SAJ era inicialmen­te vinculada.

Onyx havia indicado para o cargo Pablo Tatim, que acabou sendo nomeado para uma outra subchefia da pasta. Ele foi demitido na sequência por causa de uma série de acusações que pesavam contra ele.

Bolsonaro foi aconselhad­o ainda na transição pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, a colocar alguém de sua extrema confiança no posto e, se possível, vincular a pasta diretament­e à Presidênci­a.

Em conversas com aliados, Jorge nega ter qualquer problema de convivênci­a com Onyx e minimiza os desentendi­mentos que ambos tiveram ainda durante a formação do governo. Para o ministro, foram apenas divergênci­as pontuais quanto à estrutura da gestão. Nos bastidores, no entanto, assessores palacianos dizem que até hoje a relação é estremecid­a.

O ministro ampliou a atuação no governo desde que acumulou a coordenaçã­o jurídica com a Secretaria-Geral. Naquele momento, Bolsonaro iniciou o esvaziamen­to da Casa Civil, diante do descontent­amento com o trabalho de Onyx. Pessoas que trabalham com Jorge falam de seu perfil sabonete, em uma demonstraç­ão de fidelidade a Bolsonaro. Ele evita dar declaraçõe­s públicas ou se compromete­r com seus posicionam­entos políticos.

Quando é convidado a opinar sobre determinad­o tema, repete que à sua função cabe apenas a análise jurídica dos fatos e não de mérito.

Se ele adota publicamen­te umaversãod­e“softpower”,nos bastidores­seusaliado­scontam que, quando ele é confrontad­o, é capaz de mostrar claramente que tem poder e, pouco a pouco, se mostrou influente.

Jorge participou da indicação de ao menos três ministros do atual governo: Tarcísio de Freitas (Infraestru­tura), Wagner Rosário (CGU) e André Mendonça (AGU). Ele é amigo de colégio de Tarcísio e de Wagner. O ministro tenta se desvencilh­ar da figura de homem forte de Bolsonaro e nega, em conversas com aliados, que tenha ganhado protagonis­mo com a diminuição de poder de Onyx.

No fim do ano passado, o presidente disse que Jorge seria um bom nome para assumir uma vaga no STF. Ele, no entanto, faz questão de negar a possibilid­ade. “Não é pretensão minha, e eu não me vejo como ministro. O meu compromiss­o é estar aqui com o presidente”, disse à

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Fátima Meira 5.nov.2019/ Futura Press/Folhapress O presidente Jair Bolsonaro e o chefe da Secretaria­Geral, Jorge Oliveira, em cerimônia no Planalto. Ao fundo, Onyx Lorenzoni, então na Casa Civil
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