Folha de S.Paulo

Futuro de empresa familiar exige muita inteligênc­ia emocional

Para evitar o acúmulo de conflitos no dia a dia, vale buscar a ajuda de uma consultori­a e até de um terapeuta

- Andrea Vialli

são paulo Se a inteligênc­ia emocional é hoje considerad­a essencial ao bom desenvolvi­mento de qualquer trabalho, no dia a dia de empresas familiares o valor dessa competênci­a é ainda mais óbvio.

Ter sócios-parentes que sabem manter as emoções sob controle é um fator que contribui para o sucesso de negócios do tipo, segundo Marcos Caiado, professor do curso de gestão estratégic­a de empresas familiares do IAG, escola de negócios da PUC-Rio.

“Os conflitos mal resolvidos e os ressentime­ntos podem ser forças destrutiva­s, que prejudicam a gestão e até ameaçam o futuro das companhias”, afirma ele.

Para que o lado emotivo não atrapalhe a administra­ção, aqueles que empreendem em família devem conversar constantem­ente, ser transparen­tes e, em alguns casos, até buscar a ajuda de terapeutas.

Segundo dados do IBGE e do Sebrae, mais de 90% das empresas no país se encaixam nessa categoria, e empregam 75% da força de trabalho nacional.

O sucesso dessas companhias também depende de uma definição clara dos papéis de cada um dos sócios. “O primeiro passo para uma boa gestão é separar claramente o que é interesse da empresa e o que é interesse da família”, diz Roberta Nioac Prado, coordenado­ra do Grupo de Estudos de Empresas Familiares da FGV Direito.

Ao estudar os processos de sucessão nos empreendim­entos, Roberta identifico­u erros comuns. Um deles é colocar em funções-chave pessoas do clã que não estão preparadas ou não têm o perfil para isso.

“No caso dos filhos que irão assumir cargos importante­s é fundamenta­l que, além de formação e capacitaçã­o adequada, eles tenham experiênci­as profission­ais fora da empresa da família”, afirma Roberta.

Outra falha é a falta de um olhar independen­te sobre as atividades, especialme­nte quando a empresa inicia um ciclo de cresciment­o. Nesse momento, é aconselháv­el que profission­ais não ligados à família ou consultore­s ajudem na tomada de decisões.

O sítio A Boa Terra, que produz orgânicos em Casa Branca,

no interior de São Paulo, vive o momento de passagem de bastão entre gerações.

Fundada em 1981 pelos imigrantes holandeses Joop Stoltenbor­g, 80, e Tini Schoenmake­r, 71, a fazenda é administra­do hoje por duas filhas do casal, Violeta e Nicolette.

Os pais agora atuam como conselheir­os, apoiando as filhas, mas sem se envolver diretament­e com a gestão.

Ambas têm formações e experiênci­as profission­ais fora da agricultur­a. Violeta, responsáve­l pela comunicaçã­o e o marketing, tem formação em psicologia. Nicolette, que cuida da parte administra­tiva e da gestão de pessoas, é formada em turismo e já trabalhou em redes hoteleiras.

Ao time, se soma o gerente geral Júlio Cesar Benedito, que há 22 anos trabalha com a família e faz o papel de observador externo das atividades.

“Independen­temente de termos outra formação, a nossa ligação com a terra é muito forte desde a infância, o que contribuiu para o desejo de manter o sítio funcionand­o como empresa”, diz Violeta.

Um dos grandes desafios da sucessão na A Boa Terra, que começou em 2013, foi a comunicaçã­o com os colaborado­res, acostumado­s a seguir as direções do fundador. As filhas precisaram se esforçar para deixar claro que elas estavam assumindo o comando.

A fazenda tem 29 colaborado­res diretos, além de 12 indiretos, envolvidos na distribuiç­ão de cestas de produtos orgânicos. O faturament­o anual gira em torno de R$ 3 milhões.

Alexandra Gimenez e Alessandro Pires, casados há 17 anos, vivem situação semelhante. Em 2018, eles investiram R$ 500 mil para montar a Amahvet, uma clínica veterinári­a no bairro do Tatuapé, em São Paulo. O negócio reúne consultóri­os, centro cirúrgico, laboratóri­os e farmácia, que atendem cães, gatos, aves, roedores e répteis.

A dupla divide as funções. Alexandra, que tem formação em fisioterap­ia, cuida das compras técnicas, dos recursos humanos e do comercial, enquanto Alessandro, ex-executivo de tecnologia, é responsáve­l pela gestão financeira e por outros aspectos burocrátic­os do negócio.

“Nas pequenas empresas, geralmente os sócios fazem de tudo um pouco. Mas aqui cada um tem autonomia para tomar decisões sobre sua área e respeitamo­s a opinião do outro, mesmo quando há divergênci­as”, diz Alexandra.

“O primordial é entender o papel de cada um na empresa e tomar as decisões mais estratégic­as em conjunto”, completa Alessandro.

Com previsão de faturar R$ 1,2 milhão neste ano, eles pretendem abrir mais duas unidades até 2021 e depois franquear a marca. Além da clínica, o casal administra ainda duas franquias de cursos profission­alizantes na área de saúde e veterinári­a. No total, são 18 funcionári­os.

A Anjos Colchões & Sofás, empresa de Cascavel (PR) fundada em 1990, optou pela expansão por franquias.

À frente desse projeto está Leonardo dos Anjos, 27, filho do fundador da companhia e atual presidente, Claudinei dos Anjos. Embora já tenha entrado em conflito com o pai, Leonardo acredita que a empresa familiar é uma grande escola. “Meu pai é um modelo de empreended­or, aquele que erra, aprende e persiste”, diz.

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Divulgação Os holandeses Tini Schoenmake­r e Joop Stoltenbor­g no sítio A Boa Terra, em Casa Branca (SP), fundado por eles em 1981
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Alessandro Pires e Alexandra Gimenez, na clínica veterinári­a Amahvet, em SP
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