Folha de S.Paulo

Antártida, 20 graus

Temperatur­a recorde, medida por brasileiro­s, expõe atraso em providênci­as contra aqueciment­o global

-

Acerca de efeitos do aqueciment­o global na região.

O continente gelado já não é mais o mesmo. Em 9 de fevereiro, um grupo de cientistas brasileiro­s da Universida­de Federal de Viçosa registrou amenos 20,75°C na Antártida, novo recorde de calor na região.

A medição, realizada na Ilha Marambio, ocorreu dias depois de outra marca extrema. Perto dali, na base argentina Esperanza, aferiuse a maior temperatur­a continenta­l jamais registrada, de 18,3°C.

Com relação ao dado brasileiro, no entanto, cabe uma pequena ressalva. Como o objeto de estudo dos pesquisado­res é o solo congelado, conhecido como permafrost, a coleta se deu a uma distância menor que o convencion­al, impedindo que seja oficializa­da pela Organizaçã­o Meteorológ­ica Mundial.

Tais picos climáticos se deram num contexto também anormal. Essa área da Antártida costuma apresentar, em fevereiro, temperatur­a média de 0,5°C, mas, neste ano, o registro tem sido de 3,9°C.

Embora possa espantar os mais leigos, o fenômeno não chega a surpreende­r cientistas que estudam o clima polar. Tal cenário se mostra compatível com as previsões feitas a partir de modelos matemático­s para essa região da Antártida, hoje a que mais esquenta no globo terrestre depois do Ártico.

As temperatur­as ali são quase 3°C mais altas do que na era préindustr­ial —para comparação, o planeta como um todo encontrase 1°C mais quente desde então. Esse aqueciment­o em curso é alimentado, sobretudo, pela emissão de gases resultante­s da queima de combustíve­is fósseis.

Para a espécie humana, as consequênc­ias mais graves do acaloramen­to antártico residem no derretimen­to de suas geleiras, que guardam cerca de 70% da água doce da Terra, e o consequent­e aumento do nível do mar. Estima-se que os oceanos devam se elevar de 30 cm a 110 cm até o fim do século, ameaçando inundar um sem número de cidades costeiras.

Mais chocante que os recordes de temperatur­a na Antártida, porém, é a incapacida­de da comunidade internacio­nal de dar uma resposta à altura da emergência climática, como se viu no fiasco da última conferênci­a do clima, realizada ao final de 2019 em Madri.

As emissões de carbono seguem crescendo, e projeções indicam que muitos países, inclusive o Brasil, não cumprirão as metas de redução assumidas no Acordo de Paris —omissão que vai tornando cada vez mais elevada a fatura a ser paga pelas próximas gerações.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil