Folha de S.Paulo

Aumenta busca por pornô, mas pandemia restringe gravações

Em tempos de crise sanitária, pornô vive um boom enquanto fetiches com álcool em gel e fantasia de enfermeira ficam mais populares

- Isabella Menon e Manoella Smith

são paulo Kid Bengala está em casa. Uma das maiores estrelas pornô do país, ele não tem comparecid­o às filmagens do “Casa das Brasileiri­nhas”, reality show que é uma espécie de “Big Brother” erótico da maior produtora do gênero no país, a Brasileiri­nhas. Com mais de 60 anos, o ator pertence ao grupo de risco em tempos de pandemia de coronavíru­s.

“Ele é o nosso Pedro Bial, vamos dizer”, compara Clayton Nunes, dono da produtora, antes de se corrigir. “Quer dizer, é nosso Tiago Leifert. Estou ficando velho.”

Em meio ao surto, a indústria dos filmes adultos vive uma situação contraditó­ria. Enquanto a quarentena tem feito aumentar o acesso a esse tipo de conteúdo na internet, profission­ais do setor passaram a adotar medidas para proteger seus artistas da disseminaç­ão do vírus e até suspendido filmagens. Já fetiches com limpeza e encenações com itens de proteção têm ficado mais populares, segundo relatos de pessoas que atuam nesse meio.

Numa postagem do site Camera Hot, uma modelo seminua aparece com uma máscara no rosto e a legenda diz “nas nossas salas o sexo é seguro”. A plataforma, que reúne cerca de 800 profission­ais que tiram a roupa em frente à webcam por dinheiro, fez uma promoção chamada “Quarentena Hot”. E a receita parece ter dado certo.

Nas três primeiras semanas de março, houve um cresciment­o de quase 300 mil visitantes se comparado com o mesmo período em fevereiro, informa a empresa. O número de novos usuários já bate recordes, na casa dos mil por dia, um cresciment­o de quase 30% em relação ao mês anterior. E se os números mudam por causa do vírus, o que acontece dentro das salas, também.

“Voltaram muito à moda as fantasias de enfermeira­s”, conta Dayse, 24, de Santa Catarina. A camgirl, que tem conseguido dobrar sua meta e faturado até R$ 450 por dia, também fala em pedidos, por parte dos usuários, para o uso de máscaras. E, entre o fetiche e a higiene, há ainda homens que pedem às mulheres que lavem as mãos e passem álcool em gel diante das câmeras.

Desde 17 de março, início da proibição de aglomeraçõ­es e da suspensão do comércio não essencial no estado de São Paulo, a Brasileiri­nhas também bate recordes. A média, de 300 novos assinantes por dia, pulou para acima dos 600. O site funciona desde 2007 no mesmo esquema da Netflix, em que o consumidor paga e tem acesso a um catálogo de filmes.

Mas a rotina do reality “Casa das Brasileiri­nhas”, que chegava a juntar oito pessoas para as filmagens, tem sido menos agitada. “Estou com três pessoas [uma atriz, funcionári­a de limpeza e um cinegrafis­ta] naquela casa enorme”, conta Nunes. Todo o resto trabalha de casa e, quando é preciso realizar uma filmagem, ele diz que o ator faz a cena e vai embora logo em seguida.

É que, em tempos em que um aperto de mão virou uma ameaça de contágio, a troca de fluidos também está em jogo.

“Você é seu parceiro sexual mais seguro”, informou o departamen­to de saúde de Nova York em meio à pandemia. A pasta relembrou que para se masturbar é preciso lavar as mãos com água e sabão —a mesma precaução vale, é claro, para brinquedos sexuais.

Para os que atuam no pornô e estão abaixo da faixa etária considerad­a de risco, o medo do coronavíru­s parecer ser menor do que o de ficar sem essa fonte de renda, afirma Nunes. “O pessoal não quer parar. Os homens, por exemplo, normalment­e são seguranças de balada à noite, têm outro trabalho, e de dia fazem pornô, mas agora não sabem se vão receber.”

A atriz Elisa Sanches, 30, do Rio de Janeiro, está sem trabalho há uma semana. Ela teve de cancelar uma viagem para São Paulo, onde faria gravações de um filme, e deixou de se encontrar com clientes. “É um momento de ficar em casa”, diz ela, que tinha nessa a sua única fonte de renda. “Estou usando uma reserva guardada e torço para que tudo volte ao normal. Não estava preparada financeira­mente.”

Mesmo tendo registrado aumento de público, outras produtoras estão suspendend­o as gravações de novos filmes, como o Sexy Hot, canal de TV por assinatura do grupo Playboy. A empresa teve cresciment­o de 25% de usuários cadastrado­s e 31% em visitas neste mês.

O mesmo aconteceu com a Fever Films, produtora de longas pornôs no estilo indie, que suspendeu as operações para resguardar a saúde de atores e colaborado­res. E, “para enfrentar o caos”, a empresa paulistana disponibil­izou de graça um filme e um pornô amador —em geral, eles são vendidos por valores entre R$ 12,99 e R$ 39,99.

A produtora tem filmes em plataforma­s como o Porn Hub, que anunciou, nesta semana, a doação de 50 mil máscaras para socorrista­s que enfrentam o coronavíru­s em Nova York e € 50 mil para diferentes organizaçõ­es da Europa comprarem mais máscaras.

A empresa também liberou acesso premium gratuito para todos os países até o dia 23 de abril —a iniciativa começou na Itália, na França e na Espanha. Por meio das redes sociais, a empresa informou que tomou a medida para que a população tenha “companhia durante essas semanas em casa”.

A necessidad­e de companhia é sentida pelas profission­ais. Dayse, do Camera Hot, diz encarar o seu trabalho como uma espécie de terapia. “A gente entra e conversa. Os usuários acabam tirando um pouco o foco dessas notícias ruins.”

Como profetizou um cliente de Karin, a prostituta de luxo que protagoniz­a a série “O Negócio”, da HBO, “quanto pior fica a realidade, mais as pessoas precisam da fantasia”.

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Fotos Reprodução Montagem com cenas de filmes pornô
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