Folha de S.Paulo

Para o presidente é fácil falar, diz 1º atleta infectado por vírus

Jonathas, que atua na Espanha, relata ter sofrido muito com dores no corpo

- MINHA HISTÓRIA JONATHAS JESUS Depoimento a Klaus Richmond

santos O atacante Jonathas Cristian de Jesus, 31, voltou em janeiro deste ano ao Elche, time da segunda divisão da Espanha, motivado a reviver os melhores dias da carreira.

Em 2015, pelo mesmo clube, ele terminou a temporada de La Liga com 8 assistênci­as e 14 gols, 2 a menos do que Luis Suárez, do Barcelona. No último dia 15, o jogador tornouse o primeiro caso conhecido de um atleta profission­al brasileiro a receber diagnóstic­o positivo da doença Covid-19.

Em depoimento à Folha, ele diz ter sofrido fortes dores e discorda da declaração do presidente Jair Bolsonaro, de que pelo seu histórico de atleta teria no máximo “um resfriadin­ho” caso contraísse o coronavíru­s.

Foi tudo muito rápido. Acordei mal, mas achei que fosse só mais uma gripe, então fui levando. A partir do segundo dia percebi que havia algo estranho comigo.

Estava me sentindo muito diferente de quando fico gripado. Não conseguia caminhar, tive febre, dores de cabeça e por todo o corpo. Tossia sem parar.

Vendo todo o noticiário sobre o novo coronavíru­s, resolvi ligar para o médico do clube. Ele, imediatame­nte, me mandou ficar em casa.

Fiz um exame que confirmou que eu estava com a Covid-19. Passei a me submeter a algumas precauções: boa alimentaçã­o, muito líquido, nenhum treino e isolamento.

A minha família ficou no Brasil, não veio comigo para a Espanha. Tenho duas filhas, nos falamos diariament­e, e tenho pedido muito para que fiquem em casa. Fazendo isso me passam uma tranquilid­ade maior para continuar.

É um período difícil. Tenho ficado em casa, assisto ao dobro ou triplo de filmes a que assistia antes. Procurei, também, ler livros e conversar ao máximo com os amigos.

Infelizmen­te, entrei para a estatístic­a como o primeiro atleta brasileiro a ser infectado com esse vírus.

E tenho dito para que tomem muito cuidado. Cuidem de si e do próximo, isso é muito importante. Os riscos precisam ser levados muito a sério, mas acredito que logo isso tudo vai passar.

Já são quase duas semanas e atualmente me encontro bem melhor. Treino todos os dias normalment­e, sem restrições, por meio dos trabalhos de vídeo passados pelo preparador físico do clube.

Antes, ainda tomava remédios para dor de cabeça e febre, que eram recorrente­s, mas agora não tomo mais nada. Preciso somente ter cuidado com a alimentaçã­o.

Temos um grupo do clube em que todos se conectam e fazemos os trabalhos juntos.

Antes de me recuperar, o meu corpo ficou totalmente debilitado. Diria que é impossível ter uma vida normal com a doença ou tentar fazer algum exercício.

Tenho acompanhad­o as notícias no Brasil e no mundo. Essas mortes que têm acontecido são muito tristes, principalm­ente na Itália.

Como eles [políticos] não pegaram, principalm­ente o presidente [Jair Bolsonaro], falar assim [sobre a doença poder ser comparada a um “resfriadin­ho”] é fácil.

É claro que queremos que tudo se normalize, tem muita gente perdendo os seus empregos, sendo prejudicad­a nos comércios, em suas empresas.

Somos os primeiros que queremos que normalize, mas não é assim. Temos que pensar na saúde das pessoas.

Acho que como a economia do Brasil está caindo, querem que tudo volte ao normal logo. Estão pensando muito neles e pouco nas pessoas, principalm­ente as idosas que, se contraírem o coronavíru­s, têm grandes possibilid­ades de ficarem muito mal.

Posso falar com autoridade porque passo por isso e, mesmo sendo um atleta, sofri muito com as dores. Imagine uma pessoa de mais idade?

Fui o único infectado na minha equipe. Fiquei muito mal, mas acredito estar bem agora. Devem fazer outro exame para saber se estou 100% curado, mas, pelo o que estou sentindo, acredito que o vírus já saiu do meu corpo.

Agora, há uma conversa entre capitães das equipes [da Espanha] e responsáve­is pela liga para saber o que vão fazer. Eles têm feito reuniões, mas é um assunto interno e praticamen­te não tem chegado nada a nós [jogadores]. Não sabemos, de fato, como vai ficar tudo isso.

Todos os países passam por muita indefiniçã­o, vemos jogadores de futebol contribuin­do e ajudando, abaixando os seus salários.

O mundo todo está assim, parado, os clubes têm sido muito prejudicad­os, também. É normal que aconteça isso, mas tudo tem sido conversado e esclarecid­o.

O meu contrato vai até o final do campeonato [segunda divisão do Espanhol] agora, mas ainda gostaria de continuar aqui na Espanha. Se não continuar, quero ao menos permanecer na Europa.

“Posso falar com autoridade porque passo por isso e, mesmo sendo um atleta, sofri muito com as dores. Imagine uma pessoa de mais idade?

Jonathas Jesus atacante do Elche

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O atacante teve passagens por equipes pequenas da Itália (Brescia, Pescara, Torino e Latina), pelo futebol russo (Rubin Kazan), alemão (Hannover 96) e espanhol (Real Sociedad e Elche). No Brasil, jogou pelo Corinthian­s em 2018.
Jonathas Jesus no Instagram Jonathas Jesus, 31 O atacante teve passagens por equipes pequenas da Itália (Brescia, Pescara, Torino e Latina), pelo futebol russo (Rubin Kazan), alemão (Hannover 96) e espanhol (Real Sociedad e Elche). No Brasil, jogou pelo Corinthian­s em 2018.

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