Folha de S.Paulo

Bolsonaro tenta reverter desgaste com auxílio dos filhos em gabinete paralelo

Flávio, Eduardo e Carlos têm aconselhad­o presidente a reagir a críticas em meio à pandemia

- Gustavo Uribe, Ricardo Della Coletta e Talita Fernandes

brasília Na tentativa de reverter a perda de apoio diante da pandemia do coronavíru­s, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem se aconselhad­o com os seus três filhos mais velhos, que passaram a mobilizar simpatizan­tes nas redes sociais e a participar presencial­mente de reuniões de governo.

A atuação do senador Flávio Bolsonaro (sem partidoRJ), do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) e do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) foi apelidada no Palácio do Planalto de “gabinete paralelo” e tem incomodado auxiliares presidenci­ais.

Os mais moderados, entre eles militares, têm culpado o trio pelo que chamam de radicaliza­ção do presidente, que, na tentativa de municiar a militância digital, aumentou os ataques à imprensa e aos governos estaduais.

A mudança de tom, ocorrida após Bolsonaro ter ensaiado um discurso conciliató­rio, não é consenso no Palácio do Planalto.

Na equipe presidenci­al, é feita a avaliação de que, caso a pandemia gere de fato um colapso no sistema de saúde, a polarizaçã­o buscada pelo presidente pode prejudicál­o na disputa eleitoral de 2022.

Desde o início da pandemia, Flávio tem sido ouvido por Bolsonaro sobre como agir diante da crise sanitária.

O primogênit­o foi um dos defensores da retórica adotada pelo presidente de que não deve haver “histeria” no país e que a atividade econômica não pode ser paralisada.

A atuação do senador era inicialmen­te discreta, mas desde o primeiro panelaço contra o presidente, no dia 17, ele decidiu sair dos bastidores.

No dia seguinte à manifestaç­ão, Flávio fez questão de acompanhar, no Palácio do Planalto, uma entrevista de Bolsonaro para prestar contas sobre as medidas do governo contra a Covid-19. E na última sexta-feira (20) participou de videoconfe­rência do presidente com empresário­s.

Os filhos têm também gravado alguns vídeos informais que o presidente faz no Palácio da Alvorada, para serem replicados nas redes sociais.

De acordo com interlocut­ores, Flávio tem ainda se empenhado na interlocuç­ão com empresário­s e, principalm­ente, senadores.

Já Eduardo e Carlos deram início a uma participaç­ão mais direta a partir do último sábado (21). Os dois foram, de acordo com assessores presidenci­ais, os mentores de vídeo divulgado pelo presidente em que ele anunciou que o laboratóri­o químico e farmacêuti­co do Exército ampliará a produção de cloroquina.

Alguns testes com o medicament­o apresentar­am resultados promissore­s para o coronavíru­s, mas até o momento não há comprovaçã­o cientifica de que a substancia é eficaz. Autoridade­s sanitárias têm alertado ainda para o risco da automedica­ção, uma vez que a cloroquina traz efeitos colaterais, entre eles lesões hepáticas.

Após ter causado um incidente diplomátic­o com a China, que irritou o presidente, Eduardo tem aconselhad­o o pai de maneira mais discreta, diferentem­ente de Carlos.

Mentor do chamado “gabinete do ódio”, o bunker digital do Planalto, o filho 02 participou nesta semana de videoconfe­rência do presidente com governador­es do Sul e do Norte. O vereador também ajudou na redação do pronunciam­ento de Bolsonaro na terça-feira (24).

Em sua fala, que foi criticada por assessores palacianos, Bolsonaro afirmou que desde o início da crise o governo se preocupou em conter o “pânico e a histeria”.

No entanto, o presidente redobrou a aposta no radicalism­o e voltou a minimizar a gravidade da doença, ao compará-la a um “resfriadin­ho”.

Flávio e Carlos se reuniram com o presidente na tarde de terça enquanto ele se preparava para fazer o pronunciam­ento em rede nacional.

A decisão de falar a todos os cidadãos, segundo relatos feitos à Folha, foi tomada após o núcleo digital da Presidênci­a constatar desmobiliz­ação de perfis de direita nas redes sociais, que passaram a defender menos o presidente de ataques da esquerda.

Carlos tem residência no Rio de Janeiro, mas, desde o fim de semana, participou de reuniões no Planalto em Brasília. Já Flávio, que voltava com frequência para a sua base no

Rio, também passou a se dedicar integralme­nte a agendas na capital federal.

Em paralelo à atuação física no Planalto, os filhos do presidente também iniciaram uma mobilizaçã­o nas redes sociais em defesa do pai, na tentativa de reverter a perda de apoio em perfis de direita.

Na manhã desta quinta-feira (26), por exemplo, replicaram um vídeo em que Bolsonaro para na porta do Palácio da Alvorada para cumpriment­ar apoiadores e critica a presença de jornalista­s.

O presidente insinua que, embora os meios de comunicaçã­o incentivem que os cidadãos fiquem em casa durante a pandemia, continuam enviando suas equipes para a cobertura do governo.

Nenhuma palavra é dita pelo presidente sobre a presença dos apoiadores. Nem que ele mesmo incluiu as atividades de imprensa entre os serviços essenciais em seu decreto que trata de serviços que não podem ser interrompi­dos durante a crise do coronavíru­s.

A atuação dos filhos do presidente nas redes, com seus milhares de seguidores, tem servido para ajudar a impulsiona­r hashtags de apoio ao governo, como #Bolsonarot­emrazão. A ação serve como contrapont­o às críticas que o mandatário vêm sofrendo nas redes sociais.

“Pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminad­o pelo vírus não precisaria me preocupar, nada sentiria ou seria quando muito, acometido de uma gripezinha ou resfriadin­ho

Jair Bolsonaro em pronunciam­ento na terça

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24.mar.20/Divulgação Presidênci­a Videoconfe­rência no Palácio do Planalto, com governador­es do Norte, discute crise do coronavíru­s, com a presença de Carlos Bolsonaro

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