Hospital de NY tem 13 mortes em um dia de surto apocalíptico
Unidade da rede pública no Queens não está dando conta de receber tantos pacientes infectados por coronavírus
nova york | the new york times Ao longo de algumas horas na terça (24), Ashley Bray, no Elmhurst Hospital Center, fez compressões torácicas sobre uma mulher de mais de 80 anos, um homem na casa dos 60 e um rapaz de 38 que lembrava o médico de seu noivo.
Todos haviam recebido o diagnóstico de coronavírus e sofrido paradas cardíacas. Todos acabaram morrendo.
Elmhurst, hospital público com 545 leitos no Queens, em Nova York, passou a transferir pacientes com outros problemas médicos para outros hospitais, visando dedicar-se inteiramente ao coronavírus.
Médicos e enfermeiros estão lutando para trabalhar com apenas algumas dezenas de respiradores. As chamadas pelo alto-falante de “Equipe 700”, código usado para indicar que um paciente está à beira da morte, são ouvidas várias vezes em cada turno de trabalho. Alguns pacientes já morreram na sala de emergências enquanto ainda aguardavam um leito.
Um caminhão refrigerado estacionado diante do hospital recebe os corpos. O sistema de hospitais públicos de Nova York informou que 13 pessoas morreram no hospital Elmhurst nas últimas 24 horas.
“É apocalíptico”, disse Bray, 27, residente de medicina geral. Hospitais de toda a cidade, que virou o epicentro da pandemia de coronavírus nos EUA, estão começando a enfrentar o tipo de aumento assustador de casos de Covid-19 que sobrecarregou completamente os hospitais da China, Itália e outros países.
Na noite de quarta-feira (25), Nova York contava 20.011 casos da doença e 280 mortes.
Mais de 2.800 pacientes com Covid-19 foram hospitalizados na cidade. Na quarta, o governador Andrew Cuomo ofereceu um pequeno raio de esperança de que as medidas de distanciamento social estejam começando a desacelerar o aumento das internações.
Mesmo assim, os hospitais se preparam para receber um influxo enorme de doentes.
Nesta semana, as estimativas de hospitalização na cidade apresentaram queda marcante: o número de casos está dobrando a cada quatro dias, em vez dos dois dias vistos antes. “É quase bom demais para ser verdade”, disse o Cuomo.
Trabalhando com autoridades estaduais e federais, os hospitais ampliaram diversas vezes as partes de suas instalações equipadas para receber pacientes que permaneceram em casa até a piora da febre e a dificuldade em respirar os terem obrigado a buscar salas de emergência.
Mitchell Katz, diretor da Health and Hospitals Corp., que administra os hospitais públicos de Nova York, disse que há planos em andamento para transformar muitas áreas do hospital Elmhurst em UTIs. Mas os hospitais da cidade podem estar prestes a perder suas possibilidades de busca por novos espaços.
Todas as mais de 1.800 vagas em UTIs de Nova York estão previstas para estar ocupadas até esta sexta (27), segundo briefing da Agência Federal de Gestão de Emergências (Fema) ao qual a reportagem teve acesso.
Cuomo disse na quarta-feira que não havia visto o briefing. Afirmou que esperava que os hospitais pudessem criar novas vagas rapidamente, aproveitando o aumento no estoque de respiradores.
O governo federal está enviando a Nova York um naviohospital com mil leitos, mas sua chegada só está prevista para meados de abril.
Autoridades começaram a construir quatro hospitais de 250 leitos no Centro de Convenções Jacob K. Javits, em Manhattan, que podem ficar prontos em uma semana.
O presidente Donald Trump disse no Twitter na quarta que os trabalhos estão adiantados, mas não foi possível obter confirmação independente disso. Também é discutida a possibilidade de converter hotéis e outras áreas em instalações médicas temporárias.
Os necrotérios de pelo menos dois hospitais da cidade já estão cheios, e as autoridades preveem que os dos outros hospitais atinjam o máximo da capacidade até o final da semana, segundo o briefing. A prefeitura teria pedido à Fema 85 caminhões refrigerados, com funcionários, para usar como necrotérios.
Uma porta-voz do instituto médico legal de Nova York afirmou que o briefing está incorreto. “Temos uma capacidade importante nos nossos cinco necrotérios na cidade, e ela pode ser ampliada”, disse.
Médicos e enfermeiros relataram que estão sobrecarregados. Funcionários de vários hospitais, incluindo o Centro Médico Jacobi, no Bronx, disseram que profissionais como obstetras e radiologistas foram convocados para trabalhar nas salas de emergência.
Uma ou duas mortes por coronavírus, ou mais, têm ocorrido numa ala do Centro Médico Montefiore, também no Bronx, segundo a enfermeira Judy Sheridan-Gonzalez.
Nem sempre há macas suficientes. A enfermeira disse que, no domingo, um paciente ficou 36 horas sem maca ou leito. A médica Rikki Lane, que trabalha há mais de 20 anos no hospital Elmhurst, disse que o hospital recebeu “a primeira onda deste tsunami”.
Ela comparou o cenário com um estacionamento superlotado em que os médicos precisam transferir pacientes de uma vaga a outra para conseguir acessar outros pacientes bloqueados por macas.
Ela contou que atendeu um homem com cerca de 30 anos cuja respiração deteriorou rapidamente, exigindo que fosse entubado. “Ele estava angustiado e em pânico, eu podia ver o terror em seus olhos”, contou. “Ele estava sozinho.” Tradução de Clara Allain