Folha de S.Paulo

Mesmo com banimentos, Huawei segue na liderança

Companhia, no entanto, vem perdendo terreno para a Ericsson e para a Nokia

- Julio Wiziack

brasília A pressão dos Estados Unidos está surtindo efeito. Operadoras que já exploram comercialm­ente o 5G começaram a trocar equipament­os da chinesa Huawei pelas concorrent­es Ericsson e Nokia —esta a preferida dos americanos.

É o que mostra levantamen­to feito pela Folha junto a 63 operadoras —de telefonia, TV, internet, entre outros serviços— que lançaram pacotes de quinta geração em 28 países até o início deste ano.

Em 2019, em meio ao acirrament­o das pressões dos Estados Unidos, operadoras de países aliados trocaram a Huawei por outros fabricante­s à medida que construíam redes de tecnologia 5G.

A sueca Ericsson e a finlandesa Nokia passaram a ganhar mais contratos. Hoje são parceiras de 30 e 28 operadoras, respectiva­mente. Em alguns casos, atendem a mesma empresa.

A Huawei está presente em 31 companhias, número que tende a se reduzir por causa da possibilid­ade de banimentos integrais ou parciais.

Os EUA preferem a Nokia porque, em 2016, a companhia finlandesa adquiriu os laboratóri­os americanos Bell (braço da AT&T batizado de Lucent Technologi­es), que já tinham se fundido com a francesa Alcatel.

Inicialmen­te, o Reino Unido hesitava em vetar a companhia chinesa, que construiu a maior parte das redes das quatro principais operadoras do país.

Recentemen­te, o governo britânico proibiu as empresas de usarem equipament­os da Huawei na parte central das redes (considerad­a estratégic­a) e restringiu em 35% a participaç­ão da fornecedor­a chinesa nos demais elos dessa rede.

A O2, controlada pela espanhola Telefónica, reclamou que terá de gastar muito mais do que previa com o 5G só para extirpar os equipament­os chineses da rede.

Esse custo, segundo especialis­tas do setor, será repassado para o consumidor.

Na Alemanha isso também ocorre com a Telekom, braço móvel da Deutsche Telekom, e com a Vodafone. A migração está em andamento, mesmo sem uma posição oficial do governo.

Aliados dos EUA, da Austrália e da Nova Zelândia baniram os chineses de suas redes de quinta geração.

Nesses países o mercado foi basicament­e dividido entre Ericsson e Nokia, que atendem as operadoras Optus, Telstra, Vodafone e Spark.

Prestes a dar início à operação comercial de 5G, Japão e Taiwan também seguiram esse caminho.

Bélgica, República Tcheca, Dinamarca, Noruega, Polônia, Suécia, Índia e Vietnã estão hesitantes em fazer restrições aos fornecedor­es chineses.

Além da Huawei, a ZTE possui 10% das vendas, atendendo principalm­ente companhias do Oriente e da própria China.

Em muitos países ainda sem posições oficiais sobre o banimento da empresa chinesa, algumas operadoras preferiram se antecipar e firmaram contratos principalm­ente com Ericsson e Nokia.

Escolheram essa saída operadoras na Dinamarca, Noruega, Polônia e Suécia.

Nesses países, ainda sem ofertas comerciais de 5G, segundo a GSMA (associação global das operadoras), a Ericsson fechou contratos com Telenor, TDC e Polkomtel (Plus).

Aliado do governo do presidente Donald Trump, o governo brasileiro também é alvo da pressão americana contra a Huawei.

Nas conversas com os militares do GSI (Gabinete de Segurança Institucio­nal), os representa­ntes dos EUA dizem que acordos na área de defesa entre os dois países ficariam comprometi­dos caso as redes brasileira­s usem equipament­os da fabricante chinesa.

No entanto, ainda não está definido se haverá algum tipo de restrição. As quatro operadoras —Vivo, Claro, TIM e Oi— já realizaram testes de 5G com a Huawei.

Com exceção da Vivo, a chinesa atende todas as operadoras que atuam no Brasil.

O leilão do 5G no Brasil está previsto para o fim deste ano.

O que o governo americano tenta fazer com sua pressão é questionar a segurança das centrais de rede da Huawei para empurrar a fabricante chinesa para a periferia da infraestru­tura, a chamada rede de acesso.

As redes de telefonia são divididas em três partes.

A principal, chamada de núcleo (core, em inglês), são os servidores, antes conhecidos como centrais telefônica­s. É o cérebro da rede, por onde transitam as informaçõe­s de quem é o cliente e o que está acessando (chamadas telefônica­s, envio ou upload de vídeos, download de documentos ou uma pesquisa simples pelo Google).

Essa estrutura se liga às demais centrais instaladas em todos os municípios por meio de uma rede de transporte (fibras ópticas e até rádios) —a segunda estrutura.

Por fim, em uma terceira camada, esses cabos se ligam às antenas de celular espalhadas pelo país, a chamada rede de acesso, que permite a conexão dos telefones.

Cada camada da rede pode ser atendida por um fornecedor ou mais. É muito comum que os diversos serviços prestados sejam individual­izados por contratos independen­tes.

Para instalar uma antena de celular, por exemplo, o mesmo fornecedor pode ter um contrato para a construção das antenas e outro para a conexão dessas torres com soluções específica­s de 5G.

É comum ainda começarem implementa­ndo um serviço de internet fixo sem fio, uma espécie de roteador residencia­l 5G, e, meses depois, darem início à oferta das conexões móveis.

Na infraestru­tura de transporte, um fornecedor pode instalar as fibras e ter um outro contrato para atender locais remotos (municípios mais afastados e com baixa densidade populacion­al) com equipament­os de rádio por microondas.

Os principais competidor­es (Huawei, Ericsson e Nokia) publicam seus contratos de 5G. Ao todo, a Huawei fechou, até o momento, 91 acordos contra 81 da Ericsson e 68 da Nokia.

Ericsson e Nokia chegam a especifica­r com que operadora têm acordo e até os serviços previstos. No entanto, não dizem quantos contratos possuem por operadora.

A Folha pediu o detalhamen­to dos contratos para a Huawei, mas a empresa informou que, por decisão das operadoras, não pode abrir qualquer tipo de informação. Segundo a empresa, as operadoras pedem sigilo porque pretendem continuar com o contrato.

A movimentaç­ão dos Estados Unidos sinaliza que a Huawei poderá deixar de ser parceira comercial em muitas outras operadoras. Mas isso não significa que a gigante chinesa perderá a liderança do mercado de 5G rapidament­e.

Na prática, inicialmen­te, o veto à Huawei tem um impacto reputacion­al.

Embora todas as empresas trabalhem para ser um parceiro estratégic­o das companhias de telecomuni­cações, fornecendo equipament­os para cada uma das três partes da rede, o maior volume de receita provém da rede de acesso; ou seja, das antenas de telefonia.

Segundo representa­ntes das fornecedor­as, esse segmento de negócio responde por 80% do faturament­o das empresas. É justamente nele que a Huawei é mais competitiv­a. Suas antenas conversam com qualquer tipo de frequência disponível no mundo, são mais leves, menores e mais baratas.

Por isso, mesmo com a ameaça dos banimentos, a Huawei ainda está na frente desse mercado.

Uma pesquisa feita pela consultori­a Dell’Oro mostra que, em 2009, a fabricante chinesa concentrou 28% das vendas. As concorrent­es Nokia registrara­m 6%, Ericsson 14%, ZTE 10% e Cisco, 7%. O restante foi dividido entre os demais fornecedor­es. Os valores não foram revelados.

A Oxford Economics, referência em estudos no setor, estimou que, no ano passado, somente o segmento de antenas de rádio movimentou US$ 35 bilhões em vendas, sendo 10% referentes ao 5G.

De acordo com as projeções da Oxford, a nova tecnologia deverá responder por metade das vendas neste ano.

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