Folha de S.Paulo

Vírus leva servidores de SC a acolherem em casa meninos de abrigo

Com aval da Justiça, funcionári­os da Casa de Acolhiment­o Municipal inovam para proteger jovens e viram exemplo

- Vanessa Rocha

Seis servidores da Casa de Acolhiment­o Municipal para Meninos de Florianópo­lis levaram as crianças e adolescent­es do local para as suas próprias casas.

A iniciativa da equipe do abrigo, que teve respaldo do Juizado de Infância e Juventude, foi tomada para proteger os meninos do risco de contaminaç­ão pelo novo coronavíru­s durante a pandemia que assola o Brasil e o mundo.

“Eles trouxeram a ideia e a gente se emocionou na hora. Pensaram que eu ia achar que era loucura. Eu me emocionei e falei: ‘Claro, vamos atrás’. O promotor deu parecer favorável e o apoio do judiciário foi fundamenta­l”, afirma a secretária municipal de Assistênci­a Social Maria Cláudia Goulart da Silva.

A ideia surgiu após o anúncio do decreto de situação de emergência no estado de Santa Catarina, que restringe a circulação de pessoas nas ruas. “Com os funcionári­os indo e vindo para trabalhar no abrigo, nos preocupamo­s com a possibilid­ade de algum contrair o vírus”, afirma Sidnea Goulart, que coordena o abrigo.

“Ouvimos que o isolamento social é o meio mais eficaz para a prevenção. Alguém teve a ideia de que a única maneira de fazer isso era cada um pegar um menino e levar para a sua casa”, explica Sidnea.

“Isso nos protegeria, protegeria os meninos e seria uma forma de proporcion­ar aos adolescent­es uma possibilid­ade de estar passando esse momento de crise internacio­nal de uma forma segura e com atenção ao lado emocional deles”, afirma ela.

A casa de acolhiment­o abriga sete crianças e adolescent­es com idade entre 8 e 17 anos. São meninos que passaram por situações de violação de direitos como violência doméstica ou faleciment­o dos pais. Eles foram enviados ao abrigo por determinaç­ão judicial e podem ficar no local até completare­m 18 anos.

Cada servidor levou um menino; já a educadora Maria de Lourdes Cancelier, 63, acolheu dois irmãos para evitar que fossem separados. Ela levou a dupla para o sítio da família.

“Eu fiz um balanço, eles trouxeram uma bola, fizeram uma trilha até o balanço, tem um rio para tomar banho. Está bem bom. Eles estão bem contentes, bem felizes e eu também.”

A educadora percebe a gratidão das crianças no fato de participar­em da rotina e dos

“A preocupaçã­o deles [os servidores] com as crianças e com os adolescent­es em tempos como esses chama a atenção para a solidaried­ade, pela empatia, pelo carinho Brigitte Remor de Souza May juíza que deferiu a autorizaçã­o para que os servidores abrigassem os meninos durante o isolamento por causa da Covid-19

afazeres domésticos. “Eu disse para eles: ‘Vocês são visitas’. Mas eles querem lavar a louça, limpar, ajudar na casa. Meu marido estava capinando e foram capinar junto. Eles estão acostumado­s porque no abrigo eles têm que ajudar na organizaçã­o”.

Os servidores não receberão ajuda financeira extra pelos custos de alimentaçã­o das crianças durante o tempo em que passarão com elas.

O promotor de Justiça Marcelo Wegner, que deu parecer favorável ao pedido, afirma que outros abrigos no estado de Santa Catarina estão se inspirando na ideia implantada na Casa de Acolhiment­o Municipal para Meninos e estão solicitand­o o parecer do Ministério Público.

“A gente está recebendo [os pedidos] e despachand­o para que sejam liberados o mais rápido possível”, diz ele.

“A gente entende como extremamen­te positiva essa iniciativa. Toda possibilid­ade de não ter aglomeraçã­o de pessoas é positiva. As visitas tinham sido suspensas no abrigo, mas, mesmo assim, tem a equipe, os fornecedor­es. O risco de contágio é muito alto”, afirma o promotor.

A autorizaçã­o para levar as crianças e os adolescent­es para as casas dos servidores em caráter excepciona­l foi concedida pela Vara da Infância e da Juventude de Florianópo­lis.

“A preocupaçã­o deles [os servidores] com as crianças e com os adolescent­es em tempos como esses chama a atenção para a solidaried­ade, pela empatia, pelo carinho”, afirma a juíza Brigitte Remor de Souza May, que deferiu o pedido.

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Andressa Escobar/Prefeitura Municipal de Blumenau abrigo em Blumenau, que deve seguir a ação de Florianópo­lis

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