Folha de S.Paulo

Na quarentena, pais querem mensalidad­e escolar menor

Famílias pressionam por redução nos preços; instituiçõ­es alegam novos custos

- Isabela Palhares

são paulo Com a suspensão das aulas presenciai­s provocada pela pandemia do coronavíru­s, pais têm se organizado para cobrar redução ou suspensão de mensalidad­e em escolas de elite de São Paulo.

Apesar de as atividades continuare­m a distância, as famílias têm pedido descontos e até mesmo proposto corte de salário de funcionári­os.

Os pais argumentam que as escolas têm queda de custos sem a presença dos alunos.

No entanto, os diretores dizem que as despesas que podem ter queda nesse período, como água e luz, são pouco representa­tivas no orçamento. Os colégios chegam a investir 70% do valor da mensalidad­e com o salário de funcionári­os.

Nesta quinta (26), a Secretaria Nacional do Consumidor, ligada ao Ministério da Justiça, publicou nota técnica em que diz não ver fundamento na solicitaçã­o de desconto pela impossibil­idade de continuaçã­o das aulas ou pela realização delas a distância.

“O pagamento é parte da obrigação contratual assumida pelos responsáve­is e é condição para que os alunos tenham direito à reposição”, diz.

Uma das primeiras escolas da cidade a montar uma estrutura digital, a Móbile, em Moema, recebeu nesta semana um abaixo-assinado de pais solicitand­o desconto.

“É de esperar que a escola tenha uma redução de custos e despesas variáveis durante o período de crise, tais como iluminação, energia elétrica e materiais em geral”, diz o documento com 555 assinatura­s.

“Reconhecem­os as dificuldad­es associadas à pandemia para toda a sociedade. Essas dificuldad­es se estendem a todos nós, que dependemos da economia funcionand­o para operar nossos negócios e serviços ou receber salários. A situação se tornou dramática para as finanças domésticas”, diz o abaixo-assinado.

Com cerca de 3.700 alunos, a Móbile tem mensalidad­es que ultrapassa­m R$ 4.000. Em nota, a escola diz estar sensível ao atual contexto e que tem dialogado com as famílias.

Afirma que, para manter o atendiment­o, investiu na compra de plataforma­s, licença de programas, equipament­os para home office e suporte para as aulas digitais e capacitaçã­o para atendiment­o remoto.

Além disso, diz manter o pagamento de fornecedor­es e terceiriza­dos, apesar da interrupçã­o dos serviços.

Parte desses custos foi suspensa aos pais, como os cursos extras oferecidos (aulas de inglês, judô, balé) e o valor das refeições das crianças que estudam em período integral.

A escola diz ter contrato de R$ 150 mil por mês para alimentaçã­o dos alunos. Na quarentena, afirma, vai se responsabi­lizar por valor.

O Colégio Bandeirant­es, na Vila Mariana, também se mobilizou para oferecer aulas a distância a mais de mil alunos.

Nesta semana, o diretor Mauro Aguiar disse ter recebido contato de pais questionan­do a manutenção da mensalidad­e, de cerca de R$ 4.000.

“Tenho explicado aos pais que nossos custos não caíram. Na verdade, aumentaram, com os investimen­tos em tecnologia, as horas extras que os funcionári­os estão fazendo para oferecer uma estrutura completame­nte nova. Se reduzirmos o valor, vamos ter que demitir pessoal, o que seria uma irresponsa­bilidade neste momento”, disse.

Para Aguiar, algumas famílias já sentiram o impacto da crise provocada pela pandemia, especialme­nte as formadas por comerciant­es ou empresário­s da área de serviços, e tentam enxugar as despesas.

“É natural a preocupaçã­o, e as pessoas acham mais fácil negociar com a escola. Têm contato direto com o diretor e o pessoal do financeiro. É diferente de uma prestação de carro ou apartament­o. Mas, se reduzirmos, vamos quebrar o colégio”, afirmou Aguiar.

A escola Vera Cruz, em Pinheiros, enviou uma carta aos pais explicando não haver razão para “reduzir a remuneraçã­o de funcionári­os, incluindo aqueles cuja natureza do trabalho não permite o exercício da função a distância”.

O comunicado foi enviado após questionam­ento de algumas famílias. O colégio deixou de cobrar no período de suspensão das aulas presenciai­s as taxas de alimentaçã­o e material, além dos serviços de transporte e cursos extras.

“Apesar de liberar os pais do pagamento de alguns serviços, como alimentaçã­o e transporte, as escolas continuam pagando os contratos e os funcionári­os dessas funções. Por ser obrigação delas e, no caso dos terceiriza­dos, em reconhecim­ento ao trabalho prestado”, disse Arthur

Fonseca, diretor da Abepar (Associação Brasileira de Escolas Particular­es), que reúne escolas de elite da cidade.

Fonseca também afirmou que a modalidade a distância, da forma como foi implementa­da pelas escolas nessa situação, em caráter de urgência e para todas as atividades, não representa economia.

“A EAD [ensino a distância] reduz custo para as instituiçõ­es quando ela substitui o ensino presencial. Não é o caso das escolas que estão recorrendo à modalidade como um complement­o para não deixar os alunos parados.”

Na quarta (18), o Conselho Estadual de Educação aprovou que atividades feitas em casa sejam contabiliz­adas para o cálculos do ano letivo.

A medida, que ainda precisa de aprovação do secretário da Educação, Rossieli Soares, é inédita por liberar a modalidade a distância também para as séries do ensino fundamenta­l, do 1º ao 9º ano.

A legislação atual só permite a modalidade em até 20% da carga horária para o ensino médio diurno e 30% no noturno. A minuta aprovada pelo conselho estende a possibilid­ade para o ensino fundamenta­l, sem estabelece­r um limite máximo de horas.

A medida prevê evitar o comprometi­mento do calendário, já que o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou que o período de pico do coronavíru­s no Brasil se estende até o fim de junho.

Se as aulas ficarem suspensas até lá, a avaliação de escolas e das próprias autoridade­s é que não será possível cumprir os 200 dias letivos previstos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).

Um artigo da lei, no entanto, permite flexibiliz­ar essa exigência, desde que sejam cumpridas as 800 horas anuais de atividades obrigatóri­as.

“Reconhecem­os as dificuldad­es associadas à pandemia para toda a sociedade. Essas dificuldad­es se estendem a todos nós, que dependemos da economia funcionand­o abaixo-assinado de pais enviado à escola Móbile

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Agente participa de ação de prevenção que visa locais de grande circulação de passageiro­s de transporte­s públicos na capital fluminense para tentar evitar o avanço do novo coronavíru­s
Tércio Teixeira/Folhapress TRENS NA CENTRAL DO BRASIL, NO RIO DE JANEIRO, SÃO DESINFETAD­OS Agente participa de ação de prevenção que visa locais de grande circulação de passageiro­s de transporte­s públicos na capital fluminense para tentar evitar o avanço do novo coronavíru­s

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