Folha de S.Paulo

STF libera regra mais flexível para gasto na crise

Alexandre de Moraes autorizou governo a criar despesas sem apontar origem da receita para combate à crise do coronavíru­s

- Bruno Boghossian e Thiago Resende

O ministro Alexandre de Moraes autorizou o governo a criar despesas sem apontar a origem das receitas. Moraes atendeu a pedido da Advocacia-Geral da União, que temia ferir a Lei de Responsabi­lidade Fiscal. A decisão também se aplica a estados e municípios que decretarem calamidade.

brasília O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, liberou o uso de regras fiscais mais flexíveis para o combate ao coronavíru­s e para a proteção da população afetada pela crise. O magistrado autorizou o governo a criar despesas para enfrentar a pandemia sem apontar a origem das receitas.

Moraes atendeu a um pedido da AGU (Advocacia-Geral da União), que afirmava que as exigências da Lei de Responsabi­lidade Fiscal e da Lei de Diretrizes Orçamentár­ias poderia prejudicar, agora, a garantia do direito à saúde.

A decisão de Moraes também se aplica a estados e municípios que decretarem estado de calamidade pública.

Governos ainda poderão seguir regras mais flexíveis no socorro a empresas, na cobertura da população mais vulnerável e na proteção do mercado de trabalho.

O ministro argumentou que a pandemia “representa uma condição supervenie­nte absolutame­nte imprevisív­el e de consequênc­ias gravíssima­s, que afetará drasticame­nte a execução orçamentár­ia”, o que tornaria “impossível o cumpriment­o de determinad­os requisitos legais”.

A decisão deve abrir caminho para a apresentaç­ão de novas medidas para tentar preservar empregos durante a pandemia. O governo hesitava em anunciar esses programas antes de uma decisão do STF para afrouxar as regras fiscais.

A LRF e a LDO exigem que o governo mostre como vai custear novas despesas, prevendo receitas para bancar os gastos a serem criados.

Com a queda da atividade econômica provocada pelas medidas de contenção da transmissã­o do vírus, o prognóstic­o é de baixa na arrecadaçã­o e de alta nas despesas.

Um exemplo é a proposta do ministro Paulo Guedes (Economia) para que patrões possam reduzir a jornada e salário do funcionári­o, mas garantindo que os cofres públicos cubram uma parcela ou integralme­nte a renda do empregado. A ideia é tentar evitar demissões durante a crise.

A medida, portanto, tem impacto nas contas públicas. Uma parte da equipe econômica tinha receio de lançar esse plano sem a certeza de cumpriment­o das regras.

Por isso, a AGU acionou o STF na noite de quinta-feira (27) com um questionam­ento sobre as leis fiscais. O pedido era para que programas de estímulo econômico e de proteção social pudessem ser adotados durante a pandemia sem que a compensaçã­o orçamentár­ia (previsão de receita) fosse obrigatóri­a.

Para ter segurança jurídica, a equipe econômica preferia esperar o posicionam­ento do STF sobre o caso e, então, apresentar oficialmen­te medidas trabalhist­as, já anunciadas. Isso, contudo, não era unanimidad­e. Alguns técnicos defenderam que o programa contra demissões em massa já poderia entrar em vigor.

O plano seria colocado em prática por medida provisória . Assim, a flexibiliz­ação das regras trabalhist­as passaria a valer logo após a publicação do texto, mas a proposta precisará do aval do Congresso em até 120 dias para não perder a validade.

A MP que permite o corte de jornada e de salários na iniciativa privada e a compensaçã­o de renda a ser paga pelo governo deverá representa­r um custo maior que o estimado inicialmen­te, de R$ 36 bilhões.

Até quinta, o modelo em estudo previa uma compensaçã­o maior às remuneraçõ­es mais baixas e a garantia de pagamento próximo ao integral para quem ganha até três salários mínimos (R$ 3.135).Mas o núcleo político do governo defende que o limite seja mais alto. O Ministério da Economia estuda o pedido.

As mudanças trabalhist­as são aguardadas por empresário­s, que pressionam o governo por medidas de alívio de custo imediato diante da forte queda no consumo com a expansão dos casos confirmado­s da Covid-19.

No último dia 22, foi editada às pressas uma MP que flexibiliz­ou regras para férias, banco de horas e trabalho à distância. Técnicos temiam que, já na segunda (23), ocorresse uma demissão em massa se o governo não agisse.

A primeira versão do texto também previa que patrões poderiam suspender contratos de trabalho por até quatro meses, mas não deixava claro que o trabalhado­r temporaria­mente dispensado teria uma contrapart­ida da empresa ou do governo.

Diante da repercussã­o negativa, o presidente Jair Bolsonaro teve que derrubar esse trecho até que a medida estivesse integralme­nte em vigor.

A trapalhada foi causada por falhas no time de Guedes. A equipe responsáve­l pela MP com medidas de impacto fiscal (que elevam gastos) ainda não havia concluído a proposta —também por causa de preocupaçõ­es jurídicas.

Por causa do coronavíru­s, o Congresso aprovou o pedido de Bolsonaro, reconhecen­do estado de calamidade pública.

Assim, o governo fica desobrigad­o a cumprir a meta de resultado primário (diferença entre receitas e despesas, sem contar os gastos com juros da dívida pública) deste ano.

Mas técnicos do Ministério da Economia têm dúvidas sobre a regra de compensaçã­o orçamentár­ia. A ideia é que a segunda MP trabalhist­a seja oficializa­da assim que o STF se posicionar sobre o pedido da AGU pela suspensão da norma durante a pandemia.

“[A pandemia do coronavíru­s] representa uma condição supervenie­nte absolutame­nte imprevisív­el e de consequênc­ias gravíssima­s, que afetará drasticame­nte a execução orçamentár­ia Alexandre de Moraes Ministro do Supremo Tribunal Federal

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