Folha de S.Paulo

Pandemia nas favelas

Como conter o vírus em comunidade­s de casas superlotad­as, sem saneamento e coleta de lixo?

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Acerca de multiplica­ção de riscos nas comunidade­s.

A pandemia de Covid-19 impõe desafios diferentes para cada país. Aqui, 11,5 milhões de brasileiro­s moram em casas superlotad­as, com mais de três pessoas por dormitório, e 31 milhões não têm acesso a uma rede geral de distribuiç­ão de água —cuja falta é comum nas favelas da Rocinha, no Rio, ou de Paraisópol­is, em São Paulo.

Populações pobres do Brasil sofrem de doenças infecciosa­s como malária e dengue, agravadas pela urbanizaçã­o desordenad­a. Assentamen­tos precários carecem, por definição, de infraestru­tura básica.

Não surpreende, com efeito, que a agência das Nações Unidas para moradia preveja que o impacto do novo coronavíru­s vá ser maior em áreas densamente povoadas, atendidas por sistemas de transporte superlotad­os e sem sistema adequado de coleta de lixo.

Projeta-se que quase 10% da população brasileira viva hoje em “aglomerado­s subnormais”. O último censo demográfic­o do IBGE, realizado em 2010, antes da recessão de 2014-16, contabiliz­ou 6.329 favelas em 323 municípios.

Enquanto as autoridade­s demoram para detalhar como a ajuda emergencia­l chegará a trabalhado­res informais, desemprega­dos e outros vulnerávei­s, a vida não espera. Reportagem da Folha mostrou como a fome tem exigido que moradores de favelas paulistana­s saiam às ruas em busca de ajuda.

Pesquisa do Data Favela constatou recentemen­te que 72% dos habitantes desses aglomerado­s não dispõem de poupança suficiente para manter por uma semana seu padrão de vida já precário.

Além da transferên­cia imediata de renda para esse contingent­e desassisti­do, são imprescind­íveis medidas de curto e médio médio prazos que aumentem a resiliênci­a dessas comunidade­s.

Autoridade­s locais de saúde devem fortalecer as redes comunitári­as já mobilizada­s para o combate à Covid-19 nas favelas. Do Complexo do Alemão (Rio) a Heliópolis (São Paulo), moradores têm se mobilizado para arrecadar itens de higiene, alimentos e água.

Urge elaborar diretrizes claras de ação, baseadas em evidências e adaptadas para a realidade de populações carentes. Nesse sentido, a Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade formulou um material acessível com orientaçõe­s sobre a Covid-19 destinadas a favelas e periferias.

Ocioso dizer que, a longo prazo, só políticas habitacion­ais consistent­es e a superação do vergonhoso atraso brasileiro em saneamento básico constituem respostas verdadeira­s ao problema. Sem isso, restam apenas paliativos.

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