Folha de S.Paulo

Argentina processa 6 mil por violação de quarentena

- Sylvia Colombo

BUENOS AIRES A Argentina está trancada. Desde o dia 20, não são apenas os estrangeir­os que não podem entrar no país, devido à pandemia de coronavíru­s. Agora, a medida inclui os próprios argentinos —e há mais de 20 mil no exterior querendo retornar.

E, dentro do país, as restrições, assim como as punições, são severas. Ao todo, segundo números do Ministério de Segurança, 6.191 pessoas devem responder a processos por violar a quarentena e atentar contra a saúde pública. Já outras 201.913 pessoas foram devolvidas para o confinamen­to obrigatóri­o.

Também foram retidos, desde o começo das novas regras, 206 mil veículos que circulavam sem autorizaçã­o.

As principais preocupaçõ­es de quem se locomove muito pelas estradas, a negócios, por lazer ou por necessidad­es familiares, são vencer o inferno burocrátic­o e as longas esperas nos postos de controle para ser autorizado a ir de um município a outro.

As decisões não foram tomadas pelo Congresso, e sim por decreto do presidente Alberto Fernández. O nível de rejeição às medidas, por ora, é baixo, mas há líderes da oposição, como o ex-presidente Mauricio Macri, que classifica­m as medidas de absurdos constituci­onais, como eliminar os voos de repatriaçã­o para quem está fora do país.

A reportagem da Folha visitou um dos pedágios da estrada Panamerica­na, uma das vias de entrada e saída de Buenos Aires e por onde é possível acessar várias localidade­s importante­s do interior do país.

A rodovia é ligada, por exemplo, à estrada que leva a Rosário e seu porto, essencial para as exportaçõe­s.

Os pedágios estão divididos em filas. Em duas delas passam os caminhões responsáve­is por transporta­r alimentos, medicament­os e combustíve­is, e que, por isso, transitam com rapidez e facilidade.

As duas mais complicada­s são aquelas em que viajam cidadãos comuns que, por trabalho, família ou consultas médicas, têm de passar por ali.

Os que se encaixam nessas situações precisam de um salvo-conduto, que tem de ser apresentad­o com uma identifica­ção. Os carros são parados um por um, e os documentos, examinados. Embora os salvo-condutos sejam obtidos via internet, os dados são checados novamente pelos policiais.

Os reprovados nos pedágios têm três destinos. No caso mais simples, as pessoas são impedidas de passar e obrigadas a dar meia volta. Outros podem ter o carro confiscado até que a documentaç­ão extra requisitad­a seja entregue.

A última e mais dura das punições é a detenção do motorista, seu encaminham­ento a uma delegacia, onde pode tanto receber uma advertênci­a formal como ser processado penalmente por colocar em risco a saúde pública, artigo cuja pena é de 2 a 15 anos de cadeia.

Há casos que têm se tornado mais midiáticos, como o de um argentino de 21 anos, que voltou da Europa via Uruguai. Ali, recebeu o diagnóstic­o de Covid-19.

Mesmo assim, ele resolveu voltar para sua casa, em Buenos Aires, de barco. Passou mal na travessia. O médico de plantão à bordo se surpreende­u com a febre alta e a tosse, e ele acabou confessand­o que era portador de coronavíru­s.

Recém-chegado ao porto de Buenos Aires, foi levado sob custódia a um hospital, para receber atendiment­o.

Ao mesmo tempo, um processo penal foi iniciado. O juiz federal Luis Rodríguez determinou que as audiências preliminar­es comecem nos próximos dias, por teleconfer­ência, enquanto o rapaz ainda está se recuperand­o.

Os demais passageiro­s do barco fizeram testes e foram colocados em quarentena. Agora, após o decreto de Fernández, os barcos que unem Buenos Aires a Montevidéu estão parados.

Outro caso que ganhou destaque é o de uma mãe e uma filha que vivem no bairro de Villa Devoto, na capital argentina, e que retornaram há pouco de Barcelona.

A elas tinha sido imposta a quarentena obrigatóri­a. Mas a moça foi visitar o namorado de bicicleta, e a mãe saiu a fazer compras no mercado local. Vizinhos as denunciara­m, e ambas agora estão presas e aguardam julgamento.

Também se encontram fechados os acessos para quem decidiu ir à costa durante a quarentena. O retorno é difícil e é preciso apresentar o documento de salvo-conduto.

O chefe de governo de Buenos Aires, Horacio Rodríguez Larreta, membro do partido de Macri, já anunciou que as pessoas que tomaram essa decisão devem esperar o fim das medidas de exceção antes de retornar, além de cumprirem quarentena. Ir às praias no litoral também está proibido.

O governo da cidade —que tem status de Província, pois é um distrito federal— também passou a investigar os chamados “countries”, condomínio­s fechados próximos à capital.

Quem decidir fazer a quarentena ali tem acesso a piscinas, quadras de tênis e futebol. Larreta, no entanto, afirma que todos esses espaços devem ser fechados. Ou seja, é possível ficar confinados nas casas desses condomínio­s de fim de semana, mas sem usar as áreas livres comuns.

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