Folha de S.Paulo

Empresário­s que nunca fizeram delivery contam como adaptaram seu negócio

Empreended­ores usam redes sociais, grupos de WhatsApp e base de clientes para divulgar serviço

- Marília Miragaia

são paulo O fechamento do comércio, na última semana, para tentar barrar o avanço do coronavíru­s, obrigou empresário­s que nunca pensaram em fazer delivery de produtos a adaptar seus negócios.

Para organizar um serviço de entregas, um passo importante é refletir sobre quem serão os clientes e como chegar até eles, explica Marcus Salusse, que é professor do Centro de Empreended­orismo e Novos Negócios da FGV (Fundação Getulio Vargas).

A empresária Jacqueline da Silva Ferreira, 27, dona da loja de maquiagem Já Que Amou, em Brasília, começou acessando a lista de consumidor­es da sua base de dados.

Ela, que costuma fazer posts em redes sociais com dicas de beleza, avisou seus clientes por meio de um vídeo que faria delivery dos produtos — foram sete entregas nos primeiros três dias.

“As pessoas não estão preocupada­s em comprar maquiagem nesse momento em que ninguém sai para a rua. Mas tenho vendido produtos de cuidado com a pele, porque, com o isolamento, os clientes têm mais tempo de se cuidar”, diz.

Quando um consumidor faz contato para perguntar sobre determinad­o item, Jacqueline procura entender se existem outras necessidad­es que podem ser atendidas durante a venda. A empresária faz isso com ajuda do histórico de consumo dos fregueses.

“Descubro se o cliente precisa de algum produto de limpeza de pele, por exemplo.”

Para quem não pode recorrer a uma base de consumidor­es fidelizado­s, a sugestão de Sandra Façanha, coordenado­ra do curso de Administra­ção da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado), é atuar de forma local, procurando associaçõe­s de moradores, grandes condomínio­s e grupos em redes sociais.

“Criar um ecommerce agora é uma solução cara que pode demorar. Os empreended­ores podem operar no bairro em que se encontram. Muitas vezes, o nível de faturament­o não será o mesmo, mas é importante procurar soluções. E nem sempre será uma solução exclusiva”, diz.

A personal chef capixaba Lígia Sancio, 40, encontrou um novo mercado no seu condomínio. Ela trabalha ensinando clientes a cozinhar em domicílio há cerca de um ano.

Com o isolamento, mudou seu negócio e começou a fazer entregas de comida no prédio em que vive, na Pompeia (zona oeste de São Paulo). Seus serviços foram divulgados em um grupo de WhatsApp de moradores.

Na lista, ela ofereceu marmitas saudáveis feitas com ingredient­es orgânicos. Lígia foi procurada por seis moradores e vendeu três bolos nos últimos cinco dias.

Para o empresário Alex Claudio Maia, 35, dono da barraca de feira Pescados Maia, a saída veio das redes sociais.

Após ver o movimento na feira cair 70% por causa da Covid-19, ele chegou a pensar em demitir parte de seus 11 funcionári­os. Até que uma cliente teve a ideia de montar flyers digitais com os nomes das bancas e os contatos dos feirantes que poderiam fazer entrega de seus produtos.

Os panfletos virtuais viralizara­m no WhatsApp e ganharam as redes sociais, incluindo a da chef e jurada do MasterChef Paola Carosella, que reforçou a importânci­a de comprar de pequenos negócios.

Um dia depois do início da campanha, Alex recebeu 200 contatos por telefone, fez 60 entregas e teve que contratar um motoboy para dar conta de todos os pedidos.

“Eu tinha mercadoria, só não conseguia vender no balcão. Mas agora os funcionári­os usam essa estrutura para cortar os filés, porcionar e separar os pedidos”, diz. As embalagens não precisaram de mudança: são as mesmas já usadas para entregar aos clientes da feira.

A situação fez Alex, que lidera a empresa com o irmão, Aldo Cezar Maia, 38, pensar em abrir um novo negócio voltado somente à entrega.

Oportunida­des podem surgir durante a crise. Para mapeá-las, é importante se perguntar quais foram os problemas gerados durante a quarentena. “O empreended­or pode pensar na solução desses problemas na hora de se adaptar”, diz Salusse, da FGV.

Foi o que aconteceu com o empresário Beto Madalosso, 41, dono dos restaurant­es Madá e Forneria Copacabana, em Curitiba (PR). As duas casas fecharam as portas há cerca de dez dias e começaram a operar apenas por delivery.

Ao lado de sua equipe, o chef criou uma pizza congelada que passou a responder por parte do faturament­o das duas casas —cerca de 70% no caso do Madá.

A ideia nasceu quando ele recebeu de um funcionári­o a foto de uma pizza congelada do Roberta’s, restaurant­e de Nova York, EUA. “Corri para fazer testes. Já produzimos pizza e tenho um ultraconge­lador, então conseguimo­s fazer o produto com pouco investimen­to”, diz.

Batizada de pizza do futuro, é vendida congelada, para que clientes possam guardar no freezer e assar no forno caseiro. Os discos são individuai­s, custam entre R$ 35 e R$ 40 e têm validade de 90 dias.

“Percebemos que pode ser um negócio novo e casou com o momento, em que as pessoas querem estocar comida.”

Desde a terça-feira (17), o Madá vende uma média de 80 pizzas congeladas por dia.

 ?? Karime Xavier/Folhapress ?? Aldo Cezar Maia (à esq.) e Alex Claudio Maia, donos da barraca Pescados Maia, em feira nos Jardins, em SP
Karime Xavier/Folhapress Aldo Cezar Maia (à esq.) e Alex Claudio Maia, donos da barraca Pescados Maia, em feira nos Jardins, em SP

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